Se a pandemia de Covid-19 complicou a vida financeira de muita gente, a situação de inquilinos que têm seus contratos reajustados pelo IGP-M, medido pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), está ainda pior. Essas pessoas estão precisando conversar com os proprietários para tentar um evitar um reajuste de até 21,73%, valor acumulado do índice nos 12 meses encerrados em outubro. Há sinais de que o cenário pode piorar.
Nesta sexta-feira (19), o índice avançou 0,76% na segunda prévia de novembro, informou a FGV. O resultado mostra aceleração ante igual leitura de outubro, quando o indicador havia registrado contração de 0,03%.
O reajuste dos contratos de aluguel pelo índice da FGV sempre foi o mais comum no Brasil. O problema é que ele se descolou muito da inflação oficial do país, o que faz com que inquilinos, proprietários e plataformas de moradia online se mobilizem para substituir o indexador dos contratos.
Quanto descolou
Para quem olha de fora, IGP-M e IPCA parecem, atualmente, tratar de economias diferentes. Em setembro, o índice medido pela FGV registrou deflação de 0,64%, enquanto o indicador oficial da inflação no Brasil ficou em 1,16%. Em outubro, a diferença entre os índices foi de 0,61 ponto percentual: inflação de 0,64% no IGP-M e de 1,25% no IPCA. No acumulado de 12 meses terminados em outubro, a diferença é ainda maior: o IGP-M subiu 21,73%, enquanto o IPCA está em 10,67%. Na segunda prévia de novembro, o índice da FGV avançou 0,76%.
Fontes: IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e FGV (Fundação Getúlio Vargas)
Antes de entender por que o IGP-M se distanciou da inflação oficial do Brasil, é preciso saber a diferença entre seu cálculo e o do IPCA. Enquanto o IGP-M calcula a variação de preço em todas as etapas de um produto –da fabricação à venda –, o IPCA registra apenas os preços finais. Essa diferença de metodologia parece muito simples, mas muda muita coisa.
Por passar por toda a cadeia produtiva, o IGP-M é muito mais sensível à variação do dólar e do preço das matérias-primas, duas coisas que ficaram muito mais caras durante a pandemia de Covid-19. O IPCA também é impactado por isto, mas como as empresas podem não repassar o aumento de custo no preço final do produto, a variação é menor.
Em setembro, o IGP-M caiu enquanto o IPCA subiu. Isso aconteceu porque o minério de ferro caiu 21,74%, o que causou forte impacto no custo de produção das empresas. Segundo André Braz, coordenador dos Índices de Preços da FGV, o índice teria registrado alta de 1,21% sem a variação da commodity. O exemplo dá uma noção do peso das matérias-primas no indicador.
Haverá mudanças no IGP-M?
A resposta é: não. E a explicação de André Braz é simples: “o IGP-M não foi desenvolvido para ser o indexador de aluguéis”. O economista explica que o índice foi adotado para o reajuste de aluguéis porque andava muito próximo do IPCA antes do Plano Real e feito por uma instituição que não tem relação com o governo.
As grandes variações que o IGP-M traz atualmente são ruins também para os proprietários. Uma pesquisa do QuintoAndar mostra que os donos de imóveis que não aceitam a troca de índice de reajuste podem ter renda até 70% reduzida e quando há negociação, a chance de cancelamento antecipado do contrato é 87% menos que média histórica.
Para os inquilinos, o benefício é mais palpável: trocar o IGP-M pelo IPCA poderia gerar economia de R$ 1,2 bilhão por mês aos inquilinos brasileiros. A pesquisa do QuintoAndar ainda mostra que caso todos os contratos ativos hoje tivessem sido reajustados pelo IGP-M, o gasto mensal total dos inquilinos teria aumentado 20% mais do que já subiu.