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XP cria faculdade para driblar falta de mão de obra e abastecer seus quadros de tecnologia
Contratar profissionais de tecnologia se tornou um tormento tão presente na vida das empresas que o grupo XP, célebre por ter promovido por meio digital a popularização do mercado de capitais brasileiro, lança esta semana a sua faculdade. Com cinco cursos voltados para essa área e totalmente online, a Faculdade XP inova em pelo menos um aspecto: isenção de mensalidade para todos os seus alunos.
Não se trata de filantropia e menos ainda de demonstração de desinteresse da casa fundada e liderada por Guilherme Benchimol. Face a uma escassez de mão de obra qualificada para sustentar o crescimento do próprio negócio, a XP terá na sua unidade de educação um celeiro de craques em tecnologia, moldados desde o nascedouro conforme a sua cultura de trabalho. Com isso, busca ter a chance de atrair esses profissionais para si antes que sejam capturados pelo mercado.
“A gente se inspirou em movimento que nos Estados Unidos estão chamando de employer university (universidade do empregador)”, conta o presidente da XP Educação, Paulo de Tarso. “É o desenvolvimento de mão de obra que a empresa ainda vai contratar”, explica ele.
Nesta segunda-feira será lançado o edital para a abertura das 400 vagas que vão formar as primeiras turmas de Sistemas de Informação, Ciência de Dados, Análise de Desenvolvimento de Sistemas, Banco de Dados e Defesa Cibernética.
O ensino praticado ali será à distância para que desde a largada os estudantes se habituem a um dos traços da instituição financeira, adepta do trabalho onde quer que seus profissionais prefiram estar.
Talentos digitais
Mas é também uma maneira de ter acesso a “talentos digitais”, como prefere Paulo de Tarso, uma categoria que adotou o trabalho remoto como um princípio.
Para o presidente da consultoria Excelia, Leonardo Toscano, não só essa característica como toda a proposta da Faculdade XP parece tentar corrigir assimetrias do mercado brasileiro que agravam ainda mais o déficit de mão de obra qualificada em tecnologia.
“Nós não conseguimos em condições normais e satisfatórias contratar profissionais no exterior. Tem a questão da língua, da burocracia… mas os melhores desenvolvedores brasileiros já trabalham no exterior”, pondera Toscano, especializado em negócios no ramo de Educação.
Para o consultor, desenvolver esses profissionais dentro de casa e ter a chance de capturar para si os melhores dentre eles na frente tem tanto valor que por si justifica a isenção de mensalidade e o investimento inicial de R$ 100 milhões anunciado pela XP Educação. A cada ano, o déficit de nerds aumenta em mais de 150 mil vagas, lembra Toscano.
1 milhão de vagas em aberto até 2030
A XP sabe bem disso, e não só por sentir na própria pele a dificuldade de encher seus quadros. Para montar o negócio, partiu de estudos da consultoria McKinsey, conforme os quais até 2030 haverá um milhão de vagas em aberto à procura de profissionais de tecnologia.
“Para cada aluno que se forma na área de tecnologia ou em correlatas, como engenharia ou matemática, a gente forma 11 administradores e advogados. Nos Estados Unidos, é um para cinco. Na Índia, um para três”, compara Paulo de Tarso.
Por isso, a Faculdade XP não terá qualquer espécie de trava que impeça os alunos de saírem para outras empresas, ou mesmo de abandonarem o curso no meio. Em nenhuma hipótese os estudantes terão de ressarcir a empresa pelo ensino gratuito recebido. A ideia é envolver esses profissionais e cativá-los enquanto os forma.
“A gente quer ter uma conexão dos alunos com os profissionais da XP, quer conectar as vagas na XP com alunos da XP, que eles façam estágio na XP”, afirma o presidente da XP Educação.
Segundo ele, a filosofia da casa estará presente desde o processo seletivo para a sua faculdade.
“Vamos fazer um processo seletivo muito mais próximo do que uma empresa quando contrata alguém do que por teste de conhecimento, com nota”, conta Paulo de Tarso.
Processo seletivo
O processo terá quatro etapas, as três primeiras envolvendo a proposição de desafios e investigação do perfil de alunos desejado, e somente a última com avaliação de conhecimentos por nota, em um vestibular próprio. Se o aluno preferir, nessa última etapa poderá usar a sua pontuação no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Todo esse esforço de captação de talentos, porém, pode esbarrar em uma barreira cultural, ressalta Toscano. Para que seja bem-sucedida na atração dos talentos que formar na sua faculdade, a XP, ressalta o consultor, talvez tenha de rever seu clima de trabalho.
“A XP é muito mais admirada pelos investidores e pelos concorrentes que por seus profissionais. O modelo XP de gestão das pessoas é o da Faria Lima”, assinala Toscano, em referência ao estilo agressivo que permeia a reputação dos profissionais que habitam as empresas situadas em torno da avenida que abriga algumas das mais conhecidas empresas do mercado financeiro, em São Paulo.
Como um canal de formação e atração de talentos, a faculdade XP faz todo sentido, na visão do consultor.
“Eles estão crescendo muito e estão buscando formas de fortalecer os alicerces da XP”, avalia Toscano que, contudo, acredita que a novidade não chegará a abalar a concorrência no setor, mesmo com a isenção de mensalidade. “Eu não acho que esse negócio ganhará escala. Pode ter êxito, mas não vai ser um player relevante”, prevê.
Cursos de MBA e por assinatura
Como boa capitalista, porém, a XP cuidou para que o negócio não seja um centro de custos para o grupo, mesmo que esse se beneficie do recrutamento dos profissionais ali formados. Além desse propósito, a Faculdade XP também servirá para conferir prestígio ao pacote de ensino que a XP Educação vai oferecer.
O dinheiro que sustentará o negócio como um todo virá dos cursos de pós-graduação e de uma plataforma de cursos de curta duração, a “Multi+”. Também nesta semana será publicado um edital para a criação de mais de 20 programas de MBA, e a plataforma será lançada com mais de 40 cursos, que poderão ser feitos mediante o pagamento de uma assinatura mensal de R$ 65. Até o fim deste ano, a XP espera ter 10 mil alunos matriculados em cada.
“Teremos este ano e o próximo de muito crescimento. Em 2024 esperamos atingir o break even (equilíbrio) de caixa e até 2025 a gente terá uma quebra de receita em três blocos: um terço de assinaturas, um terço de programas de pós-graduação e um terço de novos produtos que ainda serão lançados”, projeta Paulo de Tarso. “A gente espera que a nossa receita de 2025 seja pelo menos 10 vezes maior que a de 2022.”
Por Marcelo Mota — São Paulo
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