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Tributação e Família: onde esses temas se encontram?
O estadista norte-americano Benjamin Franklin é mundialmente conhecido por suas experiências com eletricidade e por ser um dos ‘Founding Fathers‘ dos Estados Unidos da América. Porém, suas falas e escritas também ganharam grande importância.
Em uma troca de correspondências com o cientista francês Jean-Baptiste Le Roy, em 1789, ele proferiu a seguinte frase: “Nossa nova Constituição está agora estabelecida, tudo parece prometer que ela será durável, mas, neste mundo, nada é certo, exceto a morte e os tributos”. Esta frase se tornou um ditado na América e vem sendo repetida ao redor do mundo desde então.
Realmente, nada neste mundo pode ser dito como certo, exceto a morte e os tributos. Sobre os tributos, inclusive, é importante frisar que eles nos acompanham ao longo de nossas vidas, caminhando junto aos eventos e relacionamentos profissionais e pessoais que estabelecemos no decorrer do tempo.
E não seria diferente com a família. Ao pensar em constituir ou não uma família, seja mediante um simples namoro ou até a formalização de um casamento, união estável ou concebendo filhos, diversos são os impactos não somente no âmbito do Direito de Família, mas igualmente no mundo do Direito Tributário.
O artigo deste mês pretende tratar exatamente desse tema: questões relevantes envolvendo família e tributação, especialmente em relação às obrigações declaratórias e ao Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (“ITCMD”) em algumas situações que, por vezes, as pessoas desconhecem e não se atentam aos possíveis impactos tributários.
Conta Conjunta
É muito comum que as famílias possuam contas conjuntas, seja no Brasil ou no exterior. Ocorre que, muitas vezes, não há clareza sobre como reportar os recursos detidos em contas com cotitularidade às autoridades administrativas, por exemplo Receita Federal do Brasil (“RFB”) e Banco Central do Brasil (“BACEN”). Assim, são válidas algumas considerações conceituais preliminares antes de se definir a forma de reporte na Declaração de Imposto de Renda da Pessoa Física (“DIRPF”) e/ou na Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior (“DCBE”), se for o caso.
DIRPF
Para fins da DIRPF, a RFB informa, no “Perguntas e Respostas 2023”, que o contribuinte casado pode apresentar a declaração em conjunto com o cônjuge ou, ainda, cada um deles pode elaborar a sua respectiva declaração em separado. Entretanto, dentre outros critérios, é imprescindível se atentar ao regime de bens do casal, a fim de evitar possíveis efeitos tributários adversos.
Por exemplo, no caso de uma conta conjunta de duas pessoas casadas sob o regime da comunhão total ou parcial de bens que fazem declarações separadas, é usual que cada parceiro declare 50% do saldo, desde que a conta conjunta componha o patrimônio comum do casal.
Em geral, quando estamos falando do regime da comunhão total de bens, todo o patrimônio de ambos os parceiros é considerado comum. Já no regime da comunhão parcial de bens, apenas o patrimônio adquirido onerosamente na constância da relação será considerado comum.
Por outro lado, no caso do regime da separação total de bens ou, ainda, quando os cotitulares forem pais e filhos, a situação se mostra um pouco mais complexa. Nesses casos, idealmente, cada cotitular deveria declarar a parte que lhe cabe da conta conjunta, pois, caso contrário, a autoridade fiscal competente poderia considerar que ocorreu uma doação tributável pelo ITCMD.
Isso porque, por vezes, um dos cotitulares acaba contribuindo de forma mais substancial com os recursos detidos naquela conta do que o(s) outro(s) cotitular(es). Além disso, na prática, é extremamente difícil controlar todas as “entradas” e “saídas” de recursos, tendo em vista a máxima de que “o dinheiro não tem carimbo”.
Assim, a despeito das facilidades operacionais de se ter uma conta com cotitularidade, é essencial avaliar os possíveis impactos a fim de escolher, de forma consciente, entre a abertura de uma conta conjunta e a manutenção de contas individuais de cada titular junto às instituições financeiras.
Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior
Para fins da Declaração de Capitais Brasileiros no Exterior ou DCBE, no caso de uma conta conjunta no exterior, cada cotitular deverá declarar a parte que lhe cabe, sendo usual a adoção do critério de proporcionalidade (ou seja, dividir em partes iguais).
Porém, é importante lembrar que, se o valor integral da conta exceder os valores mínimos estipulados para a obrigatoriedade da entrega da DCBE (USD 1 milhão para a declaração anual e USD 100 milhões para as declarações trimestrais), todos os cotitulares estarão obrigados a entregar a declaração, mesmo que suas partes individualmente consideradas não atinjam os respectivos valores mínimos.
Isso porque, conforme orientação do BACEN em relação aos bens detidos em cotitularidade, deve-se considerar o valor total do bem com o objetivo de definir se o cotitular será sujeito ou não ao reporte perante a autoridade administrativa, sem prejuízo de outros bens eventualmente detidos no exterior.
Como mencionado anteriormente, muito embora uma conta conjunta facilite a rotina de seus titulares, é essencial considerar a possibilidade de implicar em mais uma obrigação declaratória. Assim, os sujeitos devem ponderar se, por exemplo, faria sentido um filho dependente do pai ter uma conta conjunta no exterior com ele e acabar tendo que entregar uma DCBE em seu nome, ainda que detenha somente uma pequena fração dos recursos ao passo que a totalidade da conta ultrapasse USD 1 milhão.
Joint Tenancy with Rights of Survivorship (JTWROS)
O JTWROS consiste em uma ferramenta que prevê que cada um dos cotitulares são detentores da integralidade daquele ativo. Possui origem no regime de Common Law e não há paralelo na legislação brasileira, sendo que, no falecimento de um dos joint tenants, o titular sobrevivente consolida-se como o único proprietário, sem a necessidade de um processo de inventário no exterior.
DIRPF
No Brasil, não é possível atribuir 100% de um ativo a mais de um titular. Assim, a declaração deve, em tese, respeitar os percentuais que cada um contribuiu para o ativo em questão, sob pena de ser considerado que houve uma doação tributável pelo ITCMD.
Sendo assim, o JTWROS deve ser utilizado com bastante cautela, sendo mais usual a utilização no caso de cônjuges casados sob o regime da comunhão total ou parcial de bens, desde que o bem com a cláusula de JTWROS componha o patrimônio comum do casal.
Como mencionado anteriormente, no regime da comunhão total de bens, todo o patrimônio é considerado comum, salvo exceções. Enquanto isso, no regime da comunhão parcial de bens, é considerado comum o patrimônio adquirido onerosamente na constância da relação.
DCBE
A declaração na DCBE segue o mesmo racional aplicável à conta conjunta explicado anteriormente. Ou seja, cada cotitular deverá declarar sua parte, sendo usual, especialmente no caso de JTWROS, a adoção do critério de proporcionalidade (isto é, dividir em partes iguais).
De toda forma, se o valor integral do ativo exceder os valores mínimos estipulados para obrigatoriedade da entrega da DCBE, todos os joint tenants estarão obrigados a entregar a declaração, ainda que suas partes individualmente consideradas não atinjam os respectivos valores mínimos.
Como vimos, não apenas as questões familiares e os instrumentos sucessórios, mas também os tributos estão presentes em praticamente todas as etapas das nossas vidas, pois, como bem disse Benjamin Franklin, duas coisas são certas na vida: a morte e os tributos.
Sendo assim, é extremamente importante planejarmos o patrimônio, inclusive pensando nas modalidades de conta que pretendemos ter durante a vida.
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