Por que os reajustes dos planos de saúde estão tão altos?
De um lado, as operadoras apontam que o aumento foi menor do que no passado. Já o Idec questiona o novo valor
Somente em 2022, os planos de saúde tiveram um prejuízo operacional de R$11,7 bilhões. Isso, portanto, reforçou as expectativas para uma grande alteração nos contratos. O reajuste dos planos de saúde individuais e familiares ficou em 9,63%. Os dados são definidos anualmente pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
No entanto, no caso dos planos coletivos e por adesão, que não possuem teto de reajuste definido pela ANS, há quem acredite dentro do setor que o reajuste dos planos de saúde pode superar os 20%.
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O percentual de reajuste dos planos individuais e familiares é divulgado pela ANS entre maio e junho. Assim, vale para o período de maio de 2023 a abril de 2024.
Como a ANS define o aumento dos planos de saúde
Para definir a cifra, a ANS adota uma fórmula de cálculo, regulamentada na Resolução Normativa 441/2018. Dessa forma, leva em consideração a variação das despesas em saúde, ganhos de eficiência, a variação da receita por faixa etária, além do IPCA/IBGE.
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Aliás, especialistas esperavam um teto de reajuste ligeiramente maior, de 10% a 12%. “Estamos trabalhando com um índice de reajuste um pouco mais elevado do que talvez é esperado, mas muito inferior ao que a gente teve no passado, em 2022”, comentou Marcos Novais, superintendente executivo da Abramge, dias antes da definição da ANS.
Maior reajuste em 22 anos
Em 2022, o reajuste dos planos de saúde individuais e familiares foi de 15,5%, o maior em 22 anos. De acordo com a ANS, alguns fatores influenciaram nesse percentual. Entre eles, a retomada no uso dos serviços de saúde após o isolamento social, a alta nos custos de insumos e a incorporação de novas tecnologias ao rol de procedimentos.
O percentual de reajuste está intimamente ligado à utilização do plano e à inflação. Isso é o que explica Rogério Scarabel, ex-diretor da ANS e sócio da M3BS (Miglioli, Bianchi, Borrozzino, Bellinatti e Scarabel Advogados).
“É a diferença do comparativo de utilização e custo do ano 2022 em relação a 2021, que dá o resultado do reajuste de 2023”, destaca.
Planos coletivos não precisam do aval da ANS
Já os reajustes dos contratos de planos coletivos e por adesão não passam pelo aval da ANS. Eles são definidos conforme a negociação das operadoras com as pessoas jurídicas contratantes.
O percentual é estabelecido levando em conta a sinistralidade. Ou seja, a utilização do plano e pode variar a depender do número de vidas dos contratos.
O ex-diretor da ANS acredita que a média de reajuste dos contratos coletivos deve ficar na casa dos vinte por cento.
“Não dá pra cravar, mas acredito que fique em torno de 25%, entre 20% e 25%… É o valor que está sendo anunciado e também é o percentual que acabou sendo publicado para os contratos de menos de 30 vidas”, afirma.
Scarabel explica que o reajuste divulgado pela ANS para os planos individuais serve de parâmetro para os reajustes nos contratos coletivos. Isso porque a fórmula de cálculo usa a mesma proporção lógica que é a sinistralidade e ela tende a ser, na média, igual. No entanto, ele ressalta que em 2023 pode ser que seja diferente.
“Esse ano tem um componente um pouco diferente, porque a sinistralidade foi muito alta. Então você tem um impacto na utilização e por causa dessa sinistralidade eles [os reajustes dos contratos coletivos] devem ficar um pouco descolados dos individuais”, detalha Scarabel.
Prejuízos no setor
De acordo com as entidades do setor, o aumento nas despesas assistenciais e a alta taxa de sinistralidade contribuíram diretamente para que o prejuízo financeiro chegasse a casa dos bilhões de reais.
A taxa de sinistralidade em 2022 ficou em 89,2%, alta de 2,12 pontos percentuais. O valor das despesas médicas e administrativas das operadoras atingiu R$ 265,1 bilhões, número superior à receita total que somou R$ 264,2 bilhões no ano passado, conforme dados da ANS.
Segundo Novais, da Abramge, os prejuízos derivam do baixo crescimento da receita e do aumento das despesas assistenciais com a incorporação de tecnologias, a falta de protocolo e diretriz para as terapias e o volume de má utilização dos planos.
“A gente vem acumulando prejuízo operacional há algum tempo. Em 2021, o prejuízo operacional foi de 900 milhões de reais, ou seja, o volume de mensalidades que recebemos foi inferior ao volume de despesas pagas. Agora, em 2022, esse prejuízo alcançou mais de 11 bilhões de reais”, explica ele.
Aumento nos reembolsos
O superintendente também destaca o crescimento no número de reembolsos solicitados pelos beneficiários e as fraudes envolvendo os recibos.
“Tem pessoas fazendo implante capilar e pegando uma dezena de recibos para reembolso na promessa do médico de que você vai fazer o procedimento e não vai precisar pagar. Estamos com o maior volume da história de reembolso. Fomos de 5,6 bilhões de reais em 2019 para 10,9 bilhões de reais em 2022, boa parte disso é fraude e má utilização”, aponta Novais.
“Nesse cenário, sem os reajustes adequados, a operação dos planos de saúde corre sério risco de se inviabilizar, como é o caso de 263 operadoras que fecharam o ano de 2022 com despesas operacionais acima da receita”, pontua a FenaSaúde em nota.
Número de usuários dos planos aumentou
Por outro lado, o setor de saúde suplementar vem recebendo cada vez mais beneficiários. De acordo com dados da ANS, os planos de assistência médica contabilizaram 50.207.388 beneficiários em março de 2023.
Comparando com o mesmo período de 2022, houve aumento de 1.107.427 vidas. O mercado fechou o ano passado com o recorde de 50,4 milhões de usuários ativos.
Para a advogada do programa de Saúde do Idec, Marina Paullelli, o aumento da sinistralidade não configura um prejuízo na prática.
“Não há dados que essa alta sinistralidade gerou um prejuízo para as operadoras, uma vez que as taxas de juros garantiram uma alta rentabilidade dos recursos que advém das mensalidades”, diz.
O que diz o Idec sobre os reajustes nos planos
Paullelli explica que o Idec verificou os dados oficiais da ANS ao longo das últimas semanas para ter condições de avaliar as informações que começaram a sair na mídia em relação às previsões do reajuste.
Na avaliação da entidade, “os dados não respaldam as afirmações de que o setor está à beira do colapso ou que há uma justificativa para que o reajuste seja fixado num patamar tão alto”.
A advogada ainda acrescenta que durante o período da pandemia as operadoras de planos de saúde tiveram lucros e um aumento recorde de usuários.
“Esse tipo de acontecimento, com certeza, deve ser levado em consideração pelas empresas para avaliação do risco e também para fixação do preço dos contratos. Considerando que em um momento pandêmico houve um aumento de pessoas vinculadas ao contrato, não justificaria agora um aumento tão substancial, basicamente esse é o entendimento do Idec”, salienta Paullelli.
Por fim, ela afirma que a instituição tem atuado para melhorar as condições de reajuste dos planos coletivos.
“O Idec realizou uma reunião com a Agência esse ano para solicitar um avanço na regulamentação dos reajustes dos planos coletivos, para que a regulamentação para os planos coletivos se assemelhe ao que existe hoje para os planos individuais, ou seja, que a própria agência comece a delimitar ou confira uma posição mais próxima ao código de defesa do consumidor para os contratos coletivos”, conclui.
Aumento causado pela variação de custos
A FenaSaúde esclarece que o reajuste é um mecanismo legítimo e indispensável para recompor a variação de custos e garantir a continuidade dos serviços.
Também afirma que suas operadoras associadas buscam adotar medidas diversas para manter o equilíbrio dos contratos. E, consequentemente, o controle dos reajustes e a manutenção do serviço, como ações de gestão, controle de custos, combate a fraudes, abusos e desperdícios, estímulo ao uso consciente dos planos e defesa da incorporação adequada de novas tecnologias.
O aumento da oferta de planos com cobertura regional e coparticipação também são estratégias buscadas pelas operadoras para modular os preços e garantir a continuidade do acesso aos planos. Quando estes recursos não são suficientes, os beneficiários têm, ainda, o direito à portabilidade com aproveitamento de carências.