‘O Brasil sempre foi influenciado por celebridades. Agora, é pelo influencer’, diz Gabriela Onofre, CEO da Publicis

Em entrevista ao Visão de Líder, Gabriela Onofre, CEO da Publicis no Brasil, faz um balanço de seu primeiro ano no cargo e fala da força dos influencers para a operação da gigante da publicidade no Brasil

Gabriela Onofre, CEO no Brasil do grupo francês de publicidade e mídia Publicis. Foto: Inteligência Financeira
Gabriela Onofre, CEO no Brasil do grupo francês de publicidade e mídia Publicis. Foto: Inteligência Financeira

Há pouco mais de um ano, Gabriela Onofre deixou a Único (embora continue como sócia), startup brasileira de verificação de identidade (IDtech), avaliada em mais de US$ 1 bilhão, para se tornar a CEO no Brasil do grupo de mídia e publicidade Publicis.

No mundo, a Publicis é um colosso, presente em 130 países, com valor de mercado de 25,5 bilhões de euros. No Brasil, embora não revele seus números, é dona de agências renomadas como a DPZ (onde Washington Olivetto contava ter aprendido a ser publicitário), Leo Burnett e LePub.

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Assim que chegou a Publicis, Gabriela conta que uma de suas primeiras iniciativas foi rapidamente buscar compreender as fortalezas e fraquezas da empresa. Ela já conhecia, como cliente, o grupo. Mas entendeu que havia a oportunidade de criar uma solução de comunicação mais robusta com influenciadores digitais.

“Quando eu cheguei (a Publicis) fui olhar o que a gente não tinha. A gente não tinha uma solução robusta no mundo dos influenciadores. O Brasil sempre foi muito influenciado pelas celebridades. Agora, é pelos ‘infuencers’. O influenciador é um ‘creator’ (criador), mas também é conteúdo e mídia. A gente entendeu que se colocar ele na estratégia da campanha, lá do começo, vai ser muito melhor o resultado. Então, uma das coisas que eu fiz foi buscar um parceiro no Brasil”, disse em entrevista ao Visão de Líder.

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Assim, nasceu a PXP Creators, parceria com a BR Media, cuja proposta é simplificar a interlocução de empresas clientes da Publicis na criação de projetos com influenciadores.

O movimento aconteceu quase de forma simultânea ao anuncio global da compra da Influential pelo grupo Publicis, em julho de 2024. A Influential é considerada a maior empresa do setor e gerencia mais de 3,5 milhões de criadores de conteúdo em todo o mundo. 

As seguir, confira trechos editados da entrevista de Gabriela Onofre, da Publicis, ao Visão de Líder.

Você passou por grandes corporações de bens de consumo, como a P&G e Johnson & Johnson. Depois, foi para uma startup, a Único, de identidade digital. E, agora, está em um outro mercado, que é o de publicidade. Como esses universos se conectam?

Olha, eu sou engenheira (de alimentos, Unicamp) de formação. A lógica e a matemática nunca saíram de mim. Comecei como aprendiz na P&G, queria aprender marketing e negócios. E ali, tive muitos empregos diferentes. Cresci tanto no marketing como lateralmente. E o que me motivou a sair (da P&G) foi a possibilidade de gerenciar um negócio global a partir do Brasil.

Na Johnson, (no marketing) passei a cuidar de mercados emergentes. Meu grande país era a Índia, mas tinha também os países do leste asiático, além de América Latina. Ali, entendi que a tecnologia estava transformando a vida do consumidor. Não posso esperar que a tecnologia transforme ‘consumer goods’ (bens de consumo). E eu falei: ‘eu preciso estar na tecnologia’.

Então, decidi fazer uma mudança de carreira e ir para uma empresa de tecnologia. Entrei na Único, quando a empresa estava começando a crescer. Passei pela fase de dor do crescimento, que foi muito interessante. A gente saiu de um negócio ‘bootstrap’ para virar um unicórnio. Fomos de 100 para 1.500 funcionários. Adorei essa experiência. Aprendi muito sobre tecnologia, sobre o jeito de pensar digital.

E aí a Publicis me convidou (para assumir como CEO da operação no Brasil). Foi a oportunidade de combinar todas estas experiências. É um grupo que está se transformando por meio da tecnologia.

Como é que você aporta, na prática, toda essa experiência no dia a dia da Publicis?

A primeira coisa é que eu tenho cabeça de cliente. Fui cliente de agências durante 25 anos. Então, quando o grupo me traz para assumir como CEO entendo que deseja colocar o cliente no centro.

Um outro elemento é que a gente está com a comunicação no bolso. Como consumidor, a gente tem muito mais informação. E nunca foi tão importante a agência ajudar o cliente nessa jornada (de comunicação da marca com o cliente), porque a jornada está fragmentada.

Para fazer isso, precisa de dados, de tecnologia.

Então, além de saber isso, eu consigo entregar isso.

Você fala frequentemente com os clientes?

Quando eu cheguei, fiz questão de me apresentar para todos os clientes. Não tem como começar, senão pela escuta. Isso vale também para a liderança que estava aqui (antes de mim). Eu sigo todos os meus clientes nas redes, no LinkedIn.

Tem também outras maneiras de entender (o cliente). Muitas vezes, os clientes nos pedem para conhecer um outro cliente do grupo. Então, a gente criou uma plataforma chamada Le Groupe. Eu convido os meus clientes para uma troca (de conhecimento, experiências etc). Não necessariamente tem a ver com publicidade.

No último Le Groupe, a gente convidou o Alexander Shapiro, que é um investidor. Ele tem um olhar diferente para tecnologia, negócios e startups. Ele também tem um olhar muito apurado sobre o que está acontecendo.

A gente provoca muitas reflexões e acaba gerando uma conexão entre os nossos clientes, porque eles, às vezes, têm desafios semelhantes.

A Publicis é um grupo de comunicação que está prestes a completar 100 anos. Como se dá a transformação cultural de uma empresa que nasceu analógica, mas opera em um mundo digital?

O grupo Publicis sempre foi muito empreendedor. Quando a empresa começou a investir em dados, em tecnologia, adquirimos a Sapient (em 2014, por US$ 3,7 bilhões, uma das maiores transações da história da publicidade) e fomos muito criticados.

O mercado virou e questionou: ‘Como assim? Vocês vão deixar a criação?’ A resposta foi, não. A criação continua sendo importante, mas a gente transformou o modelo de negócio. Somos uma empresa só, mas com um conjunto de soluções e a tecnologia perpassa.

O grupo conseguiu combinar o que é ‘craft’ (arte) com escala (crescimento). E isso fez a gente crescer mais do que os outros. Esse pensamento de escala que a gente tem é o mesmo do de empresas de tecnologia.

Então, passamos de terceiro (lugar dentre as maiores empresas de publicidade e mídia do mundo) para o segundo lugar. Globalmente, somos hoje o grupo com maior valor de mercado dentre as concorrentes.

Efetivamente, essa transformação está dando certo, mas não é fácil.

Novas aquisições estão no seu radar?

Olha, eu acho que a gente precisa sempre olhar o que a gente não tem, né? Quando eu cheguei (a Publicis) fui olhar o que a gente não tinha. A gente não tinha uma solução robusta no mundo dos influenciadores.

O Brasil sempre foi muito influenciado pelas celebridades. Agora, é pelos ‘infuencers’. O influenciador é um ‘creator’ (criador), mas também é conteúdo e mídia. A gente entendeu que se colocar ele na estratégia da campanha, lá do começo, vai ser muito melhor o resultado. Então, uma das coisas que eu fiz foi buscar um parceiro no Brasil.

Então, eu digo que trabalho num grupo grande. M&A (fusão e aquisição) é uma possibilidade. Recentemente, a Publicis global comprou a Mars United (uma das maiores agências independentes especializadas em mídia de varejo do mundo, o valor da transação não foi divulgado).

Quando a gente vai fazer ou não (uma aquisição no Brasil), não sei. A gente olha muita coisa, procura entender as capacidades que não temos.

Você acredita que o influencer adiciona valor ao negócio de uma empresa?

Eu acredito muito. A gente é muito social como país, a gente é muito conectado no conteúdo. Antes a gente fazia isso só com personagens, com pessoas que estavam nas novelas. Hoje, todo mundo gera conteúdo. E quem tem uma associação de conteúdo dentro de um território pode ser um ‘creator’.

Agora, tem que ter muita ciência (para saber) quem é o influenciador, no que ele acredita. Precisa ter uma parte de governança. E é por isso que a gente decidiu testar a parceria (com a BR Media), pois precisava de alguém que tivesse essa operação azeitada, que tivesse dados para comprovar. Porque, no fim, é disso que se trata.

Eu preciso responder ao cliente: ‘Vale a pena fazer investimento nesse creator? Qual é o resultado comparado com outras possibilidades de mídia?’

O nosso trabalho como agência é ajudar o cliente a entender esse mundo diante das opções que estão na mesa.

Você tem uma presença bastante forte no LinkedIn. E aproveita a rede para defender suas causas, muitas delas pessoais. Como evita o conflito com o seu lado corporativo?

A primeira coisa é que eu sempre trabalhei em empresas que possuem valores semelhantes aos meus.

Então, a liderança feminina, que é uma bandeira que eu defendo, é um exemplo. Lá no começo, na P&G, sempre tive lideranças femininas. A diretora de marketing, virou CEO nos Estados Unidos (a carioca Melanie Healey, considerada uma das mulheres mais influentes do mundo pela Fortune). Então, eu era jovem e falava: ‘Nossa, é possível chegar ali.’ Isso me incentivou

A segunda coisa é que pessoas querem falar com pessoas. Por isso, o meu canal do LinkedIn pode ser que tenha mais seguidores do que o da própria página da empresa. As pessoas se conectam com pessoas.

É verdade que eu não posso esquecer que o meu sobrenome corporativo agora está Publicis Groupe. Então, toda vez que eu vou me manifestar, eu tenho que ter certeza de que eu estou carregando esse sobrenome, e que isso não bate com os valores
da corporação que eu estou.

Sempre tive esse cuidado, mas ao mesmo tempo sem deixar de ser eu. Eu mesma escrevo os meus posts. Quem me conhece um pouco mais de perto sabe que estou falando ali do jeito que eu falo aqui nas reuniões, nos corredores. Eu tento ser eu mesma.

Tem um post recente seu em que você escreveu ‘Sou CEO. Sou Mãe. Sou Esposa’. Qual era o contexto desse post?

Nós tivemos uma polêmica muito grande de um empreendedor que disse ‘Deus me livre ter uma mulher CEO’. Ele pode ter essa perspectiva, mas no mundo de hoje não pode falar isso. Tem muita mulher CEO. E não foi só isso. Ele falou porque é mulher, tem que ter só esse papel, de do lar, da família.

Não concordo. Sou mulher, eu sou mãe e gerencio uma empresa que gera milhões de EBITDA (Lucro antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização).

Eu me senti desrespeitada e achei que era necessário me posicionar.

Então, me sinto na responsabilidade de quebrar essas barreiras que impedem que outras mulheres cheguem à CEO.

Como a morte do Washington Olivetto, uma figura icônica do mundo da publicidade, bateu para você?

Bateu muito. Ele fez muito pela propaganda brasileira. A gente gosta de propaganda por causa dele. Aqui, no grupo, também tem uma situação especial, porque ele foi funcionário da DPZ quando a DPZ estava começando.

O Washington ficou 13 anos na DPZ. Foi aqui que ele começou o ‘Garoto Bombril’, que se tornou a campanha mais longeva na publicidade.

Assim, acho que todos nós desse mercado sentimos, porque, de verdade, muita gente entrou na publicidade por causa do Washington.

Realmente, foi uma grande perda.

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