George Soros e a teoria da reflexividade do mercado financeiro
O senso comum entende que o mercado reflete os fundamentos da economia e das empresas. George Soros defende que isso não é bem verdade: mercado e fundamentos podem se afetar de forma contínua, o que traz risco e oportunidades
John Maynard Keynes, um dos economistas mais importantes do século XX, propunha uma metáfora para compreendermos o mercado de ações: você seria um jurado em um concurso de beleza e deve votar na pessoa mais bonita. Caso acerte a pessoa vencedora você receberá uma remuneração mais alta do que se não acertar.
Para acertar e levar a remuneração superior então, na verdade, você não deve votar na pessoa que considera a mais bonita, mas sim naquela que você acredita que a maioria dos jurados irá considerar a mais bonita. Contudo, todos os jurados irão pensar exatamente desta forma e ficarão uns tentando adivinhar as opiniões dos outros.
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Para Lorde Keynes, o mercado de ações funcionava como na metáfora. As ações que subiam não eram necessariamente as melhores (“mais bonitas do concurso de beleza”), mas aquelas que as pessoas achavam que os outros investidores diriam ser as melhores. George Soros aprimorou e ampliou a genial observação de Lorde Keynes na sua teoria da reflexividade dos mercados.
A inusitada história de Soros
Soros teve uma adolescência e início de vida adulta muito difíceis, para dizer o mínimo. Nascido na Hungria no ano de 1930, por ser judeu, teve que viver escondido e usar documentos falsos para fugir dos nazistas na sua adolescência, em plena Segunda Guerra Mundial.
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Após a guerra, com apenas 17 anos de idade, mudou-se sozinho para Londres para estudar, com bolsa, na prestigiosa London School of Economics. Por lá, teve aulas com Karl Popper, um dos maiores filósofos do século XX.
Essa convivência despertou no jovem Soros a vontade de se tornar um filósofo, como confidenciou em entrevistas, muito tempo depois, ao ficar famoso. Contudo, ele precisava se manter e foi trabalhar em algo mais prosaico, no mercado financeiro.
O homem que quebrou o Banco da Inglaterra
Após um relativo sucesso inicial na carreira financeira, George Soros decidiu criar o Quantum Fund em 1973, um dos primeiros Hedge Funds do mundo, os quais adotam estratégias mais sofisticadas, e muitas vezes arriscadas, com o objetivo de obter altas rentabilidades.
Essa decisão mudaria a sua vida e o transformaria em uma celebridade do mundo de investimentos, quando em 1992 fez uma “singela” aposta de US$ 10 bilhões contra a libra esterlina e ganhou US$ 1 bilhão apenas com esta aposta. Ficou então conhecido como “o homem que quebrou o Banco da Inglaterra”.
Melhor que Warren Buffett?
Mais do que essa genial operação em 1992, Soros também é uma lenda pelo incrível histórico de rentabilidade do seu fundo. De acordo com levantamento do The Wall Street Journal, Soros conseguiu o incrível retorno médio de 32% ao ano de 1969 a 2000.
Para se ter uma ideia de quão incrível é isso, basta dizer que Warren Buffett obteve “apenas” 21% ao ano de 1965 a 2018 e que a média do S&P500 foi da ordem de 10% ao ano neste período.
O segredo do sucesso
Naturalmente não há apenas um segredo do sucesso de George Soros. Há uma série de fatores que vão desde sua genialidade, sua equipe fantástica, dedicação, momento da carreira e abordagem inovadora até a sorte em algumas circunstâncias.
É muito difícil explicar o sucesso dos gênios. No entanto, Soros mesmo coloca como uma de suas vantagens competitivas em relação aos concorrentes uma visão de mundo diferenciada, proporcionada pela sua teoria da reflexividade.
A teoria da reflexividade de George Soros
Em um artigo publicado pelo próprio Soros, ele diz que é difícil, em certo sentido, explicar a sua estrutura conceitual. Essa estrutura trata da relação entre pensamento e realidade, mas o pensamento dos participantes faz parte da a realidade que eles têm que pensar, o que torna a relação circular. Círculos não tem começo nem fim, o que complica a explicação.
De forma muito resumida funciona muitas vezes como uma profecia autorrealizável – aquilo que o mercado acredita acaba acontecendo justamente porque o mercado acredita. Esse é o caso que geralmente ocorre em corridas bancárias, por exemplo.
Por algum motivo o mercado acredita que determinado banco está em situação de risco e pode falir. Então, os seus investidores sacam ao mesmo tempo os recursos das contas bancárias, o que deixa a instituição sem recursos e efetivamente precisa pedir falência. Uma profecia que se autorrealizou.
A teoria da reflexividade de Soros acredita que esse tipo de fenômeno ocorre com alguma frequência no mercado financeiro, mas não sempre. Em alguns momentos o mercado fica próximo ao comportamento previsto pela teoria econômica clássica, situações próximas do equilíbrio.
Em outros momentos, contudo, a situação se torna reflexiva, levando o mercado a uma condição longe do equilíbrio. Para essa teoria, as bolhas e crises de mercado, na maioria das vezes, são causados por um processo reflexivo que saiu do controle.
O método de Soros consiste em tentar identificar esses processos reflexivos e, ao se antecipar ao mercado, ganhar dinheiro com isso.
O que os investidores podem aprender com George Soros?
Não é necessário ser um investidor arrojado e tomar bastante risco para utilizar a essência do pensamento de Soros a seu favor. As mesmas ideias valem para os arrojados e conservadores. A grande lição de Soros é que os mercados, algumas vezes, deixam de seguir estritamente os fundamentos micro e macroeconômicos, entrando em uma espiral reflexiva.
Ao perceber ou mesmo só desconfiar que esta situação está ocorrendo, é uma boa ideia, na lógica de Soros, que os investidores conservadores aumentem suas proteções e os que investidores arrojados aumentem sua procura por bons investimentos com algum risco controlável. Este é um momento de maiores riscos, mas também de maiores oportunidades. Estar preparado para lidar com isso é Inteligência Financeira, cortesia da genialidade de George Soros.