Ações: quem ganha e quem perde com a alta dos juros

As companhias que dependem do mercado consumidor interno acumulam perdas; entre as piores baixas na terça-feira (26) estavam a construtora EZTec, queda de 7,64%; a operadora de turismo CVC, baixa de 6,8%; o grupo de moda Soma (dono de marcas Hering e Farm), recuo de 6,5%; e a Méliuz, de fidelidade Méliuz, com baixa de 6,7%

Foto: Adeleke Anthony/TheNews2/Agência O Globo
Foto: Adeleke Anthony/TheNews2/Agência O Globo

A disparada da inflação no Brasil vem alimentando apostas de que o Banco Central terá que ser duro para tentar conter os aumentos de preços, elevando bastante os juros.

Na terça-feira (26), a notícia de que IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) ficou em 1,2%, bem acima da previsão média do mercado financeiro de 0,97%. “Com relação ao nosso valor projetado, destaque para variação acima do esperado no grupo de transporte, influenciado principalmente por passagem aérea. Surpresas altistas também em alimentação no domicílio e alguns itens de serviços subjacentes (lanche, estética e conserto de veículo)”, escreveram Julia Passabom e Luciana Rabelo, analistas do Itaú, em relatório a clientes.

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Tais surpresas fizeram os economistas do mercado financeiro passarem a vislumbrar um aumento de mais de 1,5 ponto percentual na Selic na reunião do Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) desta quarta (27). Assim, a taxa básica de juros da economia poderia chegar a 7,75% ao ano.

A ferramenta dos juros faz a inflação desacelerar porque desencoraja as empresas de tomar crédito para fazer investimentos na sua atividade e desanima o consumidor que deseja contrair um empréstimo ou fazer o parcelamento de uma compra. Com esses agentes gastando menos, a lei da oferta e da procura funciona como nos livros de economia: quem vende qualquer tipo de bem ou serviço não consegue aumentar os preços porque há menos interessados em adquiri-los.

O outro lado dessa história fica bem claro na movimentação da Bolsa de Valores brasileira, a B3, nos últimos dias. As companhias que dependem do mercado consumidor interno vêm acumulando perdas, e as que não sofrem nesse cenário têm escapado das vendas que fazem os preços cairem (de novo, a lei da oferta e da procura agindo).

Entre as piores baixas na terça estavam: a construtora EZTec, cujas ações perderam 7,64%, cotadas a R$ 18,63; a operadora de turismo CVC, com queda de 6,8%, para R$ 16,91; o grupo de moda Soma (dono de marcas como Hering e Farm), que recuou 6,5%, para R$ 14,17; e a administradora de programas de fidelidade Méliuz, com baixa de 6,7%, a R$ 3,74. Para vender, as três primeiras dependem, em maior ou menor grau, de financiamento. Já a última precisa que os consumidores… consumam.

Esses setores tendem a continuar apanhando enquanto a Selic for subindo. Pelas projeções dos analistas de mercado captadas semanalmente na pesquisa Focus, do BC, a taxa deve terminar o ano em 8,75% e subir para 9,5% em 2022.

Os bancos, que lucram com o aumento dos juros, desta vez estão sofrendo, porque o endividamento do brasileiro anda bastante elevado. Por exemplo, na capital paulista, 69,2% das famílias têm algum tipo de dívida – o maior percentual para o mês desde 2004, de acordo com levantamento da Fecomercio SP (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo). Há dez meses esse percentual não para de aumentar. As que estão inadimplentes são 19%. Nesse cenário, uma elevação dos juros pode fazer esses índices piorar muito.

Na terça (26), as ações do Bradesco perderam 2,26%, cotadas a R$ 20,29; as do Santander Brasil, 1,09%, para R$ 35,07; as do Itaú, 1,08%, a R$ 23,74; as do Banco do Brasil, 1,05%, a R$ 29,20. O Ibovespa, principal índice acionário da B3, recuou 2,1%, para 106.419 pontos.

A própria Bolsa se desvalorizou em 5,7%, a R$ 12,15. Os juros mais altos podem atrair para a renda fixa uma parte dos investidores que aplicam em ações, potencialmente reeduzindo o giro do mercado e a receita da B3 com taxas.

Do lado das altas, se encontram principalmente as concessionárias de serviços de energia elétrica. Muitas distribuidoras têm suas tarifas reajustadas com base na inflação. A EDP Brasil, que opera em 11 estados do país, ganhou 2,2%, a R$ 19,67, enquanto a CPFL, que tem forte presença no interior paulista, avançou 0,78%, para R$ 25,80. O setor de utilities [serviços de utilidade pública] voltou ao radar dos investidores e a teórica previsibilidade e segurança do setor tem sido mais valorizada nas ultimas semanas”, Carolina Carneiro e Rafael Nagano, analistas do banco de investimentos Credit Suisse, escreveram em relatório a clientes.

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