Assessorias de investimentos se estruturam como ‘minibancos’

Seguros, crédito e operações de mercado de capitais passam a integrar serviços

Desde que o canal das assessorias de investimentos (os antigos agentes autônomos) ganhou os holofotes do mercado de distribuição, com a disputa de XP e BTG Pactual pelas estruturas mais consolidadas, os escritórios têm se armado para atuar como uma espécie de “minibancos”. Têm criado áreas de gestão de recursos, de fusões e aquisições, atendimento a empresas e de seguros, por exemplo.

Se no ano passado os atalhos via fusões e aquisições ou adições no time comercial tinham como objetivo aumentar os volumes em custódia, os lances recentes parecem juntar peças de um quebra-cabeça para uma oferta mais completa de produtos e serviços. O objetivo é que cada unidade das assessorias seja um centro de geração de negócios para famílias e empresas.

Uma movimentação nesse sentido é a chegada de Luiz Amato e Leonardo Mattiussi à Nau Capital, vindos da F4 Capital, escritório criado há cerca de um ano pelos dois, ao lado de Marco Gomes e Patrick Kalim, ex-vice-presidentes da mesa de renda variável do Itaú. Lá atrás tinha sido um casamento arranjado pela própria XP, e agora a plataforma propôs um outro tipo de associação.

A Nau tem o ex-Bradesco e Pan José Luiz Arcar Pedro como conselheiro e, até a chegada do reforço, atuava principalmente na gestão patrimonial. “É importante para explorar soluções com derivativos, existem operações que podem tanto entregar retorno para o cliente com a eventual queda das ações quanto proteger o patrimônio em momentos de inflação e recessão”, afirma Daniel Prado, sócio da Nau.

Mattiussi diz que foi a própria área de expansão da XP fez a aproximação dele e de Amato com a Nau. A F4 também integra a rede da plataforma e segue o seu rumo com os outros sócios. “A proposta foi juntar inteligência e vir para uma estrutura maior, com atendimento que vai além da própria renda variável.”

Prado afirma que, até o ano passado, as operações de fusões e aquisições tinham como objetivo apenas escalar a custódia, e que agora os movimentos são mais cirúrgicos, buscam trazer complementaridade. A chegada dos novos profissionais incrementa os volumes sob assessoria, hoje em R$ 2,5 bilhões, e vai representar um aumento entre 20% e 25% com receitas de trading. Em julho, a Nau já tinha trazido Mauricio Valadares Resende, que foi da asset do BTG Pactual e que nos último ano estava na AF Invest.

Nesta semana, a Faros Participações anunciou a compra da P7, plataforma mineira de corretagem de seguros e de formação de profissionais, depois de ter adquirido, no início do ano, o braço de gestão de fortunas do BS2. “Como somos um escritório com perfil de private banking, o cliente que tem um tíquete médio maior, a ideia é estar bem próximo dele, resolver todos os problemas que venha a ter, não só na pessoa física, mas muitas vezes na empresa em que é sócio, executivo, da família como um todo”, diz Felipe Bichara, um dos sócios-fundadores da Faros.

O grupo da Acqua Vero viu na aquisição da BlueGriffin, de Marcelo Karvelis e Flávio Castanheira, o embrião para a sua própria asset e para uma estrutura de gestão de riqueza. Os executivos, que estiveram no grupo de formação da Claritas, vendida para a Principal, passaram a ser os executivos-chefe de investimentos e de operações da gestora Avin, respectivamente.

Após um ano da ruptura do contrato de exclusividade com XP, plugando-se ao BTG Pactual, a Acqua Vero recompôs parte do patrimônio que tinha com a rede antiga e reúne hoje cerca de R$ 5 bilhões – dos R$ 8 bilhões anteriores. Segundo Eduardo Akira, sócio e co-fundador da Acqua Vero, a assessoria conseguiu converter mais de 100% do potencial que poderia trazer, já que parte dos profissionais decidiram permanecer plugados à XP.

Além da gestora, o grupo investiu na criação da Avin Seg, com a aquisição de uma corretora de seguros especializada em apólices individuais e planos de saúde, a All In Care, no ano passado. Tem atuado na formação de novos corretores. Pretende montar também uma estrutura de banco de investimento e trazer um time de fusões e aquisições. Nas novas linhas de atuação, a Acqua Vero pode tanto partir do zero quanto consolidar, tudo depende da velocidade que pretende dar a determinado segmento e da expectativa de retorno no tempo.

“Os escritórios de assessorias de investimentos vêm há algum tempo enxergando a oportunidade de potencializar o relacionamento com seus clientes, seja na pessoa física ou na jurídica. Antes, se concentravam no investimento da pessoa física, agora olham a parte de banking também”, diz Akira. “A ideia é que, uma vez aqui, o cliente possa se servir de tudo. Houve um momento no mercado em que ele não tinha a opção de estar fora dos grandes bancos, ali concentrava os investimentos em monoprodutos, as contas transacionais, o crédito, e houve a fase da descentralização, de experimentar as plataformas aqui e acolá.”

Akira acha que a tendência é haver um pouco da volta da centralização do atendimento, porque ninguém quer gerenciar dez contas e ter inúmeros aplicativos no celular, só que a figura de contato passa a ser o assessor, em vez do gerente da agência.

Foi essa pluralidade, considerada mais madura no BTG do que na XP, que esteve por trás da mudança de plataforma, acrescenta Eduardo Siqueira, também sócio-fundador da Acqua Vero. “A companhia que iniciou o trabalho com o BTG 14 meses atrás é completamente diferente da que existe hoje, com uma estrutura organizacional definida e preparação para fundar a nossa corretora.” O acordo prevê que o BTG tenha 49,9% do negócio.

Com cerca de 300 profissionais e escritórios no Espírito Santo, Ceará e São Paulo, alcançando 20 filiais, a Acqua Vero recém-inaugurou seu QG na Faria Lima, num escritório de 2 mil metros quadrados. Quando virar instituição financeira de fato, os assessores cortam o cordão com o BTG e passam a estar plugados à nova estrutura.

O grupo que forma a Blackbird criou em maio a sua gestora de recursos, a Nero Capital, mas se há algo em que não pretende gastar energia, por ora, é numa DTVM, diz Bruno Di Giacomo, sócio-fundador da assessoria, ligada à XP, e que se transferiu para a gestora como executivo-chefe de investimentos. “Nosso business é mais de seleção e de alocação de risco do que de distribuição de investimentos, é difícil tomar dois passos ao mesmo tempo.”

Mas há outros planos de expansão mapeados. Com o foco no atendimento ao investidor profissional, com patrimônio financeiro a partir de R$ 10 milhões, muitos deles ligados ao mercado financeiro, a proposta é ser mais reconhecido como uma butique de investimentos.

Di Giacomo conta que já atuava mais como uma gestora de recursos do que como agente autônomo, com a oferta de produtos estruturados, que normalmente não chegam ao varejo. Já tem uma operação de crédito proprietária, financiando diretamente empresários do “middle market”. Atende companhias com faturamento entre R$ 30 milhões e R$ 700 milhões.

A Nero Capital serve ao propósito de ter, por exemplo, um fundo de investimentos em direitos creditórios (FIDC), algo pensado para 2023. “É a desintermediação na veia”, afirma Di Giacomo. O executivo diz que a Blackbird atua majoritariamente no interior de São Paulo e que há várias transações no radar. “Há muitas coisas que os bancos não olham por questões de segmentação ou regulatórias, há uma série de normas para fazer uma operação de R$ 1 milhão, R$ 5 milhões, que são pequenas para eles, não pagam a conta, mas a gente consegue fazer.”

Na asset, haverá gestão de fundos líquidos, primeiro uma carteira que compra cotas de outros fundos de crédito, e depois um multimercado de crédito privado.

Seguros e atividades de fusões e aquisições são outras linhas de negócios que a Blackbird pretende desenvolver. No aconselhamento financeiro, o patrimônio soma R$ 1,4 bilhão, e na Nero já são cerca de R$ 200 milhões em fundos exclusivos e carteiras administradas. O plano é atingir R$ 1 bilhão em dois anos.

A estratégia de verticalização de negócios de grupos que nasceram como agentes autônomos tem vários exemplos no mercado. Pier Mattei, fundador da Monte Bravo, criou ao lado do ex-Rio Bravo Eduardo Levy a Kilima e ainda atraiu o ex-Petros Alexandre Mathias para liderar o negócio. O grupo da EQI também colocou de pé a sua própria asset, passos também dados por SVN e Lifetime.

Di Giacomo resume bem todos esses movimentos. “Pensa-se que muito já foi feito no mercado independente, mas, quando se olha para fora, o Brasil tem só nove, dez anos, enquanto o americano tem 70, 80 anos. A desintermedição é um projeto para os próximos 20 anos.”

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