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Alta global dos juros indica cenário mais desafiador para ativos de risco
O comportamento dos ativos financeiros tem estado a reboque do cenário internacional, na medida em que as discussões em torno da inflação e dos rumos da política monetária nos Estados Unidos têm dominado as atenções dos participantes do mercado. As consequências de um ambiente de juros mais altos em economias avançadas e de menor liquidez estão em um cenário mais desafiador para ativos de risco, como apontaram Bruno Marques, sócio e gestor dos fundos multimercado da XP Asset Management, e Fabiano Godoi, sócio-fundador e diretor de investimentos (CIO) da Kairós Capital, ao participarem da “Live do Valor” desta quarta-feira.
“Estamos vendo nos EUA o mesmo filme do que aconteceu no Brasil e em outros emergentes”, aponta Marques. Ele nota que o Federal Reserve (Fed) tem indicado que sua função é levar a inflação de volta à meta e que pretende levar os juros rapidamente para o nível neutro. “Achamos que isso vai ser muito mais rápido”, diz o gestor. Para ele, o banco central americano deve promover ao menos mais quatro aumentos de 0,5 ponto nos juros, e, quando as taxas chegarem próximas do nível de equilíbrio, será possível começar a desacelerar o ritmo.
“O mercado, talvez por estar muito ancorado no que aconteceu nos últimos 10 a 15 anos, com uma volatilidade de inflação baixa e taxas de juros muito baixas, tenha demorado a aceitar isso, mas hoje está bem claro para onde o Fed quer levar os juros”, avalia Marques. Ele, porém, acredita que o erro da autoridade monetária dos EUA no momento está em “não reconhecer que vai precisar colocar os juros no restritivo”.
Godoi, da Kairós, lembra que o passado recente foi de juros reais negativos no mundo e que, na medida em que as taxas alcançam níveis mais elevados, “parece razoável imaginar que a relação risco/retorno de investimentos em bolsa passa a ser pior do que se tinha no momento anterior”. Para ele, o mundo com volatilidade de juros e de moedas diminuída permitiu uma alocação maior em ativos de renda variável do que o histórico. “Esse mundo tende a ser diferente, não só pelo aperto monetário, mas também por outro aspecto que é o da diminuição da liquidez internacional.”
O sócio da Kairós lembra que o Fed começará a retirar a liquidez do sistema somente no início do próximo mês e a um passo “relativamente comedido”, que irá acelerar somente depois de três meses. “Essa é uma parcela do problema que ainda vai gerar bastante movimentação, bastante volatilidade nos mercados e que tem potencial de atrapalhar muito os ativos de risco, justamente por retirar liquidez do sistema”, afirma Godoi. Assim, ao olhar mais à frente, o profissional acredita que a relação risco/retorno de investimentos em bolsa deve ficar prejudicada em um ambiente de juros mais elevados e de restrição de liquidez. “É uma coisa que a gente não vê há muito tempo.”
Marques, da XP Asset, tem visão semelhante, ao observar que, entre 2016 e 2020, as grandes apostas da gestora foram em queda de juros e alta da bolsa. “Quando a gente começa a pensar no reverso disso, tudo vai muito contra alocação em renda variável”, diz. O profissional nota que boa parte do impacto do aperto monetário no Brasil deve surtir efeito no segundo semestre deste ano e, principalmente, em 2023. “Nesse ambiente, não achamos alocação em Ibovespa muito boa. A bolsa vai ter muita dificuldade em ganhar do CDI no Brasil”, diz. A XP Asset não tem posições em bolsa no Brasil e opera com posições vendidas [aposta na queda] em bolsa nos EUA.
Godoi revela que a Kairós também tem operado com posições vendidas em bolsas globalmente, ao enfatizar que essa classe de ativos “dificilmente vai apresentar boa relação de risco/retorno”. Em relação ao Brasil, ele ressalta que boa parte do ajuste monetário já ocorreu e que o ciclo de aperto por aqui está “muito mais perto do fim” do que nos mercados desenvolvidos, embora ele aponte que isso “não é garantia” de que os ativos brasileiros passarão de maneira positiva pelo período de aperto das condições financeiras globais.
“O céu aqui não é de brigadeiro”, afirma Godoi, ao apontar para a junção de um ambiente externo mais desafiador com uma desaceleração maior da atividade à frente e com a proximidade das eleições, que devem deixar o ambiente mais volátil. “Talvez tenhamos eleições mais competitivas, o que normalmente vai significar um período eleitoral com críticas mais contundentes de lado a lado, o que acaba gerando mais volatilidade. Não conseguimos ficar animados para ter posições estruturais em Brasil, mesmo que os preços dos ativos aqui já pareçam convidativos”, diz o gestor.
Marques, da XP Asset, também aponta que as eleições ainda não têm ido para o preço dos ativos no momento, ao notar que ainda é preciso entender o programa de governo dos dois principais candidatos. “Acho que vamos continuar dependendo do ambiente internacional e de saber até onde vão as taxas de juros. Pode ser qualquer coisa entre 3,5% e 5%. É difícil saber até onde isso vai parar”, afirma o profissional.
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