Análise: Com nível ainda muito baixo, investimento federal sobe quase 60% neste ano

Ampliar o investimento não passa só por um novo arranjo fiscal, mas também pela melhora na qualidade do gasto

Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF). Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF). Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

No ano das eleições, o governo federal tem conseguido ampliar mais significativamente suas despesas. E o investimento público, uma das rubricas que mais sentiu a pressão do teto de gastos nos últimos anos, está tendo um forte crescimento em 2022. A alta no primeiro quadrimestre, dado mais recente que o Tesouro Nacional colocou à disposição, foi de 58% acima da inflação. O ritmo só perde para a conta de subsídios e subvenções, que quase dobrou entre janeiro e abril, na comparação com igual período do ano passado.

O movimento, contudo, não significa uma nova era dos investimentos públicos. Olhando mais detidamente os números do Tesouro percebe-se que o montante pago nesse período foi de apenas R$ 10,5 bilhões. Extrapolando-se esse volume para todo o ano, apontaria para algo em torno de R$ 32 bilhões. A projeção oficial, porém, sinaliza R$ 44,6 bilhões até dezembro. Mesmo que esse cenário se concretize, ainda estaria abaixo do que foi gasto em 2016, último ano antes da entrada em vigor do teto de gastos, quando foram pagos R$ 48 bilhões (sem atualização pelo IPCA).

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Fica claro que, a despeito da aceleração no início do ano, o quadro do investimento público federal continua desalentador. Na última terça-feira (14), em evento da Frente Parlamentar do Empreendedorismo, representantes da área econômica do governo, como o chefe da assessoria especial de estudos econômicos, Rogério Boueri, o subsecretário de planejamento fiscal do Tesouro, David Athayde, e o subsecretário de Orçamento, Fabio Pífano, ao serem cobrados pelos deputados presentes, defenderam que o problema do investimento no Brasil não é decorrente do teto de gastos, mas sim da rigidez orçamentária. A tese é que é preciso desvincular e reduzir ou pelo menos estabilizar despesas obrigatórias para ampliar o espaço para os investimentos.

Os três defenderam a regra fiscal como importante para redução da inflação e do custo de financiamento do país, o que impulsiona o setor privado, e tentaram mostrar que a responsabilidade pela penúria nos investimentos não seria da regra. Os parlamentares presentes, porém, não pareciam muito convencidos. E os dados de fato não ajudam muito nessa tese, ainda que seja forçoso lembrar que a despesa em obras públicas sempre foi uma variável de ajuste fiscal, mesmo quando não havia teto de gastos.

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Para o professor de economia da Unifesp André Roncaglia, de fato os números dos investimentos, mesmo com a alta deste ano, são muito baixos. Ele aponta que o montante é insuficiente até para repor o estoque de capital investido no passado e que se deprecia com o passar do tempo. “É um problema grave porque o investimento público tem efeitos multiplicadores importantes para a economia. Seu baixo volume também acaba minando o gasto privado”, disse.

Para ele, o desenho fiscal imposto pelo teto de gastos é “hostil ao investimento” porque vai “esmagando” as despesas discricionárias. “Com esse arranjo é difícil o governo dar prioridade ao investimento público. Há essa ideia [na equipe econômica] de que o setor privado tem capacidade de substituir o investimento público, independente do setor e das complexidades. Mas na verdade o setor público colabora para sustentar o investimento e a confiança do setor privado”, salientou, defendendo um modelo fiscal que supere o teto de gastos para abrir espaço para investimentos, sem descontrolar outros gastos correntes.

Os dados fiscais deste ano mostram que, mesmo com mais um drible imposto pela PEC dos Precatórios, o teto de gastos tem de fato contido a evolução das despesas. O gasto total subiu 5,4% acima da inflação no primeiro quadrimestre, enquanto as receitas aumentaram 12,3% em termos reais. Sem o teto e com as eleições aí, certamente a classe política estaria colocando nível de despesa bem mais alto e sem qualquer preocupação com a sustentabilidade do gasto. Dessa forma, o teto de fato contribui para uma melhora no quadro fiscal ao evitar que toda alta de receita seja transferida para o lado da despesa.

Mas o teto não conseguiu entregar uma melhora substancial no perfil do gasto público. Para se ter uma ideia, mesmo com a forte alta no período, os investimentos representaram menos de 2% do gasto total entre janeiro e abril. Em 2016, estavam próximo de 4% da despesa total.

Está claro que o nível dessa rubrica precisa ser ampliado nos próximos anos, tornando a despesa pública mais produtiva para a sociedade. E também está evidente que o teto, que tem virtudes e defeitos, precisa ser repensado à luz desse problema e do fato de que, mesmo com reformas (a Previdência já produz efeitos e o gasto com pessoal segue caindo bastante), o investimento continua comprimido.

Nesse sentido, é preciso trazer de volta à discussão também a apropriação ineficaz do orçamento pelos congressistas, sobretudo por meio das emendas de relator geral (RP9, o popular orçamento secreto). Esse dinheiro, que neste ano deve chegar a R$ 16,5 bilhões, estaria muito melhor empregado dentro de um plano mais estratégico de investimento público do que disperso em tratores e afins pelo Brasil.

Ampliar o investimento não passa só por um novo arranjo fiscal, mas também pela melhora na qualidade do gasto e avaliação de políticas, sobretudo as lideradas pelos congressistas.

Fabio Graner é analista de economia do JOTA em Brasília.
A Inteligência Financeira é um canal jornalístico e este conteúdo não deve ser interpretado como uma recomendação de compra ou venda de investimentos. Antes de investir, verifique seu perfil de investidor, seus objetivos e mantenha-se sempre bem informado.


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