Análise: Orçamento mostra piora no déficit, mesmo com contenção improvável de despesas

Cenário fiscal continua muito nublado para 2023, diz Fabio Graner, do JOTA

O ministro da Economia, Paulo Guedes (Foto: Alan Santos/Presidência)
O ministro da Economia, Paulo Guedes (Foto: Alan Santos/Presidência)

O projeto de lei orçamentária apresentado no fim da tarde desta quarta-feira (31) aponta para uma deterioração fiscal no próximo ano. A proposta apresentada pelo Ministério da Economia para o primeiro ano do presidente a ser eleito em outubro projeta um déficit de R$ 63,7 bilhões para o governo central, saindo de um número que deve ser positivo ou ao redor de zero em 2022.

Isso ocorre mesmo com um cenário de contração significativa de despesa, que parece ter poucas chances de se efetivar. A peça enviada ao Congresso trabalha com uma alta nominal de apenas 1,9% na despesa total de 2023 (bem menor que a inflação projetada). E isso levaria a uma forte queda da relação gasto/PIB – de 18,9% em 2022 para 17,6% no próximo ano.

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Esse comportamento considera que a base atual de gastos estaria inflada por uma série de créditos extraordinários que não necessariamente se repetirão no próximo ano. Certamente também se deve a um conservadorismo diante do fato de que o orçamento deve ser bastante alterado pelo Congresso, com Bolsonaro derrotado ou não.

Mesmo já incorporando R$ 52 bilhões em despesas para a possiblidade de renovação do Auxílio Brasil em R$ 600, que não consta na proposta, mas é promessa de Bolsonaro e Lula, o crescimento da despesa seria de 4,7%, ainda abaixo da inflação e que empurraria esse indicador para 18,1% do PIB. Mas é bom lembrar que há outras promessas e pressões importantes para aumento de gastos. Só para se ter uma ideia, o investimento projetado é de apenas R$ 20 bilhões, um valor irrisório.

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O ex-ministro da Fazenda e do Planejamento Nelson Barbosa comentou ao JOTA que o PLOA apresentado, nesse cenário de despesa, se assemelha ao que ocorreu com a peça de 2022. Na ocasião, a previsão de despesa era de 17,5% do PIB, mas o ano está terminando de fato com os gastos totais em quase 19% de todas as riquezas produzidas pelo país.

O economista, que tem dado contribuições para as discussões econômicas na campanha petista, comenta que, comparado com um “orçamento fictício”, a hipótese de se furar o teto no ano que vem pode representar um grande valor, mas quando comparado com o efetivamente praticado neste ano em curso, pode ser bem menos intensa.

Vale lembrar que há discussões para que o próximo governo, caso Lula vença, tenha licença para fazer alguns gastos adicionais fora do teto de gastos, embora os valores estejam indefinidos, não só no Auxílio Brasil.

Outro ponto que pode mudar bastante no orçamento do ano que vem é o cenário de arrecadação. A peça orçamentária trabalha com um cenário “conservador” de receitas, com alta nominal de apenas 1,4%, abaixo da inflação, portanto, e queda em relação ao PIB para 21,2%, saindo de 22,9% do PIB projetados para este ano.

Grande parte dessa projeção é influenciada pela perspectiva de prorrogação de desonerações adotadas neste ano e também algumas novas, que, somadas, atingem R$ 80,2 bilhões. Essas medidas ainda terão que ser negociadas com o Congresso, em sua maior parte.

Vale lembrar ainda que o cenário de receitas é afetado pelo comportamento da economia, que no PLOA está projetado em alta de 2,5% para o PIB de 2023. O mercado tem trabalhado com uma atividade econômica crescendo menos que 0,5% no próximo ano, ou seja, o governo pode estar, nesse ponto, superestimando a projeção. Sem falar em outras incertezas importantes, como os rumos dos preços do petróleo, o comportamento do mercado de trabalho e a própria inflação.

O que se depreende com base nos principais dados do PLOA apresentados nesta quarta-feira, e com tudo o que se tem dito nas principais campanhas eleitorais, é que o cenário fiscal continua muito nublado para 2023. Se as despesas podem, mesmo com vários gastos adicionais ao que está oficialmente definido, ainda ficar em níveis razoáveis em proporção do PIB, não se pode esquecer que a peça já nasce com um déficit relevante. Ou seja, qualquer gasto extra pressiona esse saldo negativo para pior.

A trajetória final vai, em muito, depender do quadro de receitas, que ainda é bastante incerto. E em um ambiente no qual os gastos com juros vão pressionar cada vez mais a dívida pública, a situação inspira cuidados.

(Por Fabio Graner, analista de economia do JOTA em Brasília)
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