Por que a quebra do SVB não deve virar uma crise como a do Lehman Brothers
Para Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2008, a explicação está na própria história do banco
A intervenção federal no Silicon Valley Bank (SVB) trouxe à tona a lembrança da crise do subprime de 2008, que começou com a quebra de um banco de investimentos americano, o Lehman Brothers, e, como efeito dominó, se transformou em um colapso econômico mundial.
O economista Paul Krugman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2008, acredita, no entanto, que o caso não deve ser o prenúncio de uma derrocada do sistema bancário como um todo.
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A explicação está na própria história do banco. Criado em 1983, o SVB viu os depósitos aumentarem rapidamente durante a pandemia, quando as empresas de tecnologia receberam enormes somas de dinheiro, à medida que os investidores procuravam retornos mais altos do que os oferecidos pelos títulos do Tesouro americano de curto prazo.
“O que o SVB estava vendendo? Tanto quanto eu posso dizer, foi apenas extraordinariamente bom em cultivar relacionamentos com, hum, Vale do Silício, especificamente [fundos de] VC [venture capital]”, escreveu Krugman, no Twitter.
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Segundo o economista, havia dois problemas com esse modelo de negócios: Primeiro, o banco atraiu grandes contas, muito maiores do que os US$ 250 mil segurados pelo FDIC (uma espécie de FGC brasileiro), tornando-se vulnerável a uma corrida bancária – como de fato veio a ocorrer. “Em segundo lugar, não tinha nenhuma experiência em colocar esse dinheiro para trabalhar.”
O SVB estava parado sobre uma enorme pilha de dinheiro, sem boas opções para alocá-lo. A saída foi aplicar em títulos de longo prazo, que na época pagavam juros muito mais altos do que os ativos de curto prazo.
“O problema é que havia uma razão para as taxas de longo prazo serem mais altas do que as de curto prazo. […] Só que as taxas curtas podem subir. O que significa que apostar no spread é arriscado. Se e quando as taxas curtas subirem, você terá problemas.” E foi o que aconteceu.
Krugman disse ainda que não está claro se o SVB era inerentemente insolvente. O que dá para afirmar é que o valor de mercado de seus investimentos caiu quando as taxas longas subiram, mas seus ganhos ainda podem ter sido suficientes para cobrir os juros de seus depósitos. “Mas grandes depósitos o tornaram vulnerável a uma corrida bancária.”
Corrida aos bancos?
O ponto importante, segundo Krugman, é que tudo isso parece bastante sui generis. “Outros bancos como o SVB podem estar na mesma situação, mas quais são esses bancos semelhantes? Logo, provavelmente não virá uma onda de corridas aos bancos.”
Além disso, como o SVB estava basicamente comprado em títulos do Tesouro, que são ativos seguros, os seus problemas não devem provocar os mesmos efeitos do MBS e do Lehman. O que não está claro é quanto isso prejudicará o ecossistema financeiro de capital de risco.
Krugman resgata uma entrevista de 2001 com Barry Ritholtz, CEO do SVB, que descreve o banco como “o único dedicado ao setor de inovação global”. De fato, o SVB fornecia serviços para startups, como empréstimos, orientação de investimentos etc.
“Mas não era aí que ganhava a maior parte de seu dinheiro. Em vez disso, basicamente atraiu depósitos e colocou os fundos em títulos de longo prazo, um simples carry trade que deu muito errado.”
Na época dos investimentos, os títulos de longo prazo pagavam mais do que os de curto, porém havia um risco unilateral: as taxas curtas poderiam subir.
“Portanto, esta não foi uma estratégia de investimento brilhante, apenas uma tomada de risco não reconhecida.”
Logo, a conclusão de Krugman é de que toda essa história de “dedicação à inovação global” até tinha alguns negócios reais, mas, em grande parte, era uma forma de marketing, de vender criptomoedas, startups etc.
“Em um sentido profundo – mas não no sentido legal da coisa – o que o SVB realmente fez foi uma espécie de fraude por afinidade à la [Bernie] Madoff. Ele conseguiu convencer o mundo VC/startup/crypto etc que era um deles, parte de sua comunidade e, portanto, confiável.”
Segundo o economista, a boa notícia é que o FDIC, o FGC americano, confiscou o banco. A notícia ruim é que parece provável que haja transbordamento sistêmico suficiente para que os reguladores tenham que intervir em alguns depósitos não segurados.
Ao que ele concluiu que “é irritante. Basicamente, estamos falando de um tipo de golpe: um banco que se vendeu sob falsos pretextos. É realmente parte da história maior do marketing de ilusão que inclui criptografia.”