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A importância da narrativa
O ciclo econômico de 2009-2020 gerou o maior ciclo de expansão da economia americana desde a segunda guerra. Foram pelo menos 11 anos de expansão que morreram “abruptamente” devido a uma pandemia.
O ciclo que nasceu na sequência, em março de 2020, está sendo por sua vez um dos ciclos mais rápidos registrados, passando da recessão março/junho de 2020, para recuperação e expansão e flertando com a recessão novamente em 2 anos.
Com os estímulos monetários, fiscais e de liquidez sem precedentes inseridos nas economias globais para reagir à incerteza da pandemia, tivemos um rebote rápido e furioso das economias. E junto com este rebote veio uma inflação no mundo desenvolvido que não víamos há mais de 40 anos.
E é neste ponto que nos encontramos hoje, na discussão sobre qual das forças é mais forte, o medo de inflação ou o medo de recessão.
Uma maneira interessante de observar a preocupação (ou interesse) pelo tema é analisar a procura dos termos em ferramentas de pesquisas de websites.
O gráfico abaixo mostra a procura nos EUA pelos termos inflation (em azul-petróleo) e recession (em laranja) – que fez pico recente – na ferramenta do Google desde 2020.
Por que isto é importante? Se você fala muito sobre um tema, você fica mais alerta sobre ele e muda seu comportamento. Se o CEO do JP Morgan, maior banco americano, avisa para você “se preparar para um furacão econômico”, e o CEO da GS, maior banco de investimentos americano, sugere para seus clientes “serem cautelosos”, adivinhe, empresas seguram investimentos, indivíduos seguram gastos e uma recessão de fato acontece.
Da mesma maneira, se os noticiários estão empenhados em alertar a sociedade dos perigos da inflação, naturalmente as empresas de maneira defensiva repassam preços, os trabalhadores exigem maiores salários… e a inflação fica mais severa.
Claro, você deve estar pensando, os temas mais procurados refletem o que as pessoas estão sentindo na pele. Verdade. Mas historicamente a narrativa dominante tem efeitos importantes sobre a economia, numa espécie de referência circular.
Por exemplo, no estouro da primeira guerra mundial em 28 de julho de 1914, quando o Império Austro-Hungaro declarou guerra à Sérvia, as ações começaram a cair de maneira descontrolada. Reagindo ao pânico, a NYSE e as principais bolsas europeias fecharam as portas mesmo apesar dos EUA não estarem envolvidos na guerra. As bolsas só reabriram em 12 de Dezembro, quase 5 meses depois. Havia lembrança do Pânico de 1907 como prova de que o mercado americano era instável.
Já no estouro da segunda guerra mundial, quando a Inglaterra declarou guerra à Alemanha em 1939, o SP500 subiu 9.6% em um dia. A explicação da época era a de que quem segurou seus investimentos em 1914 ganhou muito dinheiro e de que a guerra seria lucrativa para os EUA que venderiam armas e outros produtos para a Europa.
Situações muito semelhantes, narrativas muito diferentes.
Este ano o mercado de commodities e de treasuries, os títulos do tesouro americano, estavam corretamente dominados até maio pela narrativa (e os dados!) de inflação. Recentemente começaram, no entanto, a prestar atenção para a narrativa da recessão, que segundo o Google passou a ser a predominante em algum momento no mês passado. O SP500 teve uma grande correção de múltiplos este ano, apesar de lucros esperados ainda altos, o que sugere que os analistas que olham os resultados das empresas não veem ainda uma recessão pontualmente nas empresas que analisam.
O medo de inflação continua presente e de maneira forte e importante. A história mostra que é o tipo de variável econômica que a realidade é bem mais colorida do que a teoria. Você a sente mais perto. Por outro lado, o medo da recessão chegou também e uma desaceleração econômica tem suas consequências na vida real. O balanço entre estes dois medos está dominando a narrativa econômica e os mercados, que oscilam de acordo com o dado mais fresco.
E esta dúvida de narrativa é a dúvida dos Bancos Centrais que, na ambiguidade de comunicar a qual lado olhar, gera a incerteza e a volatilidade que estamos presenciando nas últimas semanas nos mercados. Entender a narrativa dominante te ajudará a entender os mercados.
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