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Conheça as incertezas que cercam a decisão de juros do Copom
Há muito tempo reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) não geravam surpresas em suas decisões sobre a taxa básica de juros, a Selic. A comunicação do Banco Central (BC) com o mercado vinha ajudando a ancorar as expectativas dos agentes econômicos. Mas na reunião do Copom que se encerra hoje há mais incertezas que o normal: não pela elevação dos juros, que devem subir 0,5 ponto percentual, mas principalmente pela sinalização sobre novas altas no futuro.
Segundo a maior parte dos agentes econômicos, a Selic deverá ser fixada ao ano em 13,25% ao ano hoje. Porém, desde a última reunião, há 45 dias, o cenário mudou, e está muito mais incerto. Se antes havia a previsão que esta elevação encerraria o ciclo de altas, agora a situação está em aberto.
Isso se deve a três fatores principais: resiliência da inflação no Brasil, cenário externo conturbado com guerra da Ucrânia e impactos nos preços de combustíveis e o temor de problemas fiscais no futuro, principalmente devido ao ímpeto do governo em baixar o valor do diesel com subsídios e cortes de impostos.
Para ampliar o cenário de dúvidas, pela segunda vez este ano a decisão do Copom ocorrerá no mesmo dia em que o Fed vai definir as taxas de juros nos Estados Unidos.
A expectativa de uma restrição monetária mais acentuada na maior economia do mundo já está por trás da piora dos mercados nos últimos dias, com quedas consistentes de bolsas de valores pelo planeta e a valorização do dólar, além de previsão de crescimento menor e até recessão nos EUA.
Para este ano as expectativas de inflação não param de subir. De acordo com o Boletim Focus (levantamento do BC junto aos agentes financeiros) publicado o dia 6 — o último conhecido, depois de semanas sem os dados por causa da greve dos servidores da autoridade monetárias que impediram a divulgação das expectativas desta semana –, o mercado espera uma inflação para este ano de 8,9%.
Meta de inflação
A meta de inflação deste ano é de 3,5% com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual (p.p). Em março, o BC já havia admitido alta probabilidade de descumprimento da meta.
Assim como boa parte dos agentes de mercado, Mauricio Oreng, superintendente de pesquisa macroeconômica do Santander Brasil, projeta alta de 12,75% para 13,25% na Selic nesta quarta-feira. Já a aposta para a próxima reunião é de mais uma elevação para 13,5% e o fim do ciclo de altas.
Segundo ele, alguns fatores como o preço de commodities em reais e o desempenho do mercado de trabalho — com geração de vagas acima do estimado anteriormente — que pode começar a pressionar a inflação, devem ficar no radar do BC, mas a trajetória das expectativas de mercado para os preços em 2023 deve ser destacada.
“A gente está diante de um choque muito forte de preços, matérias primas, preços industriais, que estão se espalhando na economia e o que vai dizer se as pressões são mais duradouras ou menos são as expectativas”, disse o economista.
Mesmo com a inflação alta neste ano, o BC já está olhando para 2023 por conta da defasagem do efeito de política monetária. As mudanças na taxa básica de juros, conhecida como Selic, demoram alguns meses para impactar a economia real e por isso, o Copom sempre mira na inflação futura.
Para 2023, a meta é de 3,25% ao ano, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. A última atualização das expectativas de mercado foi publicada no dia 6 e mostra a inflação em 4,39% no ano que vem, ainda dentro do intervalo.
Cenário global
O dia é quente no cenário global. Nos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed) deve decidir por mais um aumento de juros e há um temor no mercado de que a elevação seja mais agressiva do que o esperado.
Para o mercado brasileiro, a chamada “Super Quarta” envolve as decisões de ambos os bancos centrais. A diferença é que o BC brasileiro começou sua trajetória de elevação antes da maioria de seus pares globais e a discussão já é sobre em que patamar será o fim do ciclo de altas.
Andrea Damico, economista-chefe da Armor Capital, ressalta que mesmo com um aumento mais forte esperado no Fed amanhã, o Banco Central deve manter a alta de 0,5 p.p.
“A gente está em momentos do ciclo bem diferentes, nós já tivemos o nosso momento de acelerar o pace (ritmo) e tudo mais, a gente tá num momento de redução de pace — disse a economista, que aposta em uma alta de 0,5 p.p nesta quarta e outra do mesmo tamanho na próxima reunião.”
Marcela Rocha, economista-chefe da Claritas Investimentos, vê a mesma trajetória de juros de Damico, elevando a Selic para 13,75% ao ano em agosto.
A economista explica que há uma corrida de grande parte dos bancos centrais para controlar a inflação no cenário global e ao mesmo tempo há uma preocupação com a atividade econômica. Dessa forma, o impacto para o Brasil seria por meio do câmbio, que pode se desvalorizar ainda mais.
“Se o cenário global continuar com os bancos centrais tentando controlar a inflação, mas levando preocupação com a atividade econômica, a gente pode ver uma taxa de câmbio doméstica desvalorizando com o Real perdendo em relação ao dólar, é mais uma pressão para inflação”, diz Rocha.
Preços dos combustíveis
A discussão sobre as medidas para diminuir o preço dos combustíveis também traz algum nível de incerteza fiscal para as decisões do Banco Central.
Na segunda-feira, o Senado aprovou projeto que cria um teto de 17% para o ICMS com um mecanismo de compensação para a arrecadação dos estados.
Essa aprovação é parte de um objetivo do governo para reduzir o preço do diesel, gasolina e gás de cozinha, que envolve também zerar os impostos federais sobre gasolina e etanol, além de outras medidas.
Segundo Oreng, do Santander, a alta dos combustíveis pesa indiretamente nas decisões do BC. Ele explica que a autoridade monetária deve se preocupar com as expectativas de inflação e o impacto dessas possíveis alterações nos combustíveis podem aparecer nas análises.
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