Bento XVI: Entenda como será o funeral do primeiro Papa a renunciar em seis séculos

Morte aos 95 anos foi anunciada neste sábado (31)

Papa Bento XVI, antes de renunciar, faz oração no Vaticano no Natal. Foto: Tiziana Fabi/AFP
Papa Bento XVI, antes de renunciar, faz oração no Vaticano no Natal. Foto: Tiziana Fabi/AFP

Quando morre um Papa, a tradição do Vaticano para funerais é bastante clara e antiga, mas o fato de Bento XVI, cuja morte aos 95 anos foi anunciada neste sábado, ter sido a primeira pessoa a renunciar ao Pontificado em seis séculos deixa os preparativos mais incertos. Segundo a Santa Sé, o corpo será exposto na Basílica de São Pedro a partir da manhã de segunda-feira para que os fiéis possam se despedir.

Em nota, a Igreja disse que o corpo de Bento XVI permanecerá no monastério Mater Ecclesiae, onde ele vivia desde que renunciou ao trono de São Pedro em 2013, até segunda-feira, quando será levado para a Basílica de São Pedro e poderá ser visitado por fiéis a partir das 9h de segunda-feira (5h no Brasil). O espaço também ficará aberto das 7h às 19h, hora local, na terça e na quarta.

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O funeral, afirmou a instituição, será na quinta-feira, com uma missa presidida pelo Papa Francisco na Praça de São Pedro. A cerimônia, marcada para começar às 9h30 (5h30 no Brasil), será a primeira vez na História milenar da Igreja católica que um Papa em exercício presidirá o funeral de um Pontífice emérito. De acordo com o porta-voz da Santa Sé, os rituais serão “solenes, mas sóbrios”, e terão a presença das delegações oficiais da Itália e da Alemanha, país natal de Bento.

Procedimentos

Os procedimentos devem ser similar aos previstos para funerais papais tradicionais, mas ainda há uma série de incógnitas. Não se sabe se Bento, cujo nome de batismo é Joseph Ratzinger, usará as tradicionais vestes vermelhas papais e o pálio — tradicional colarinho de lã branca — ou se haverá os tradicionais nove dias de luto, conhecidos como Novendiales, por exemplo.

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Uma das poucas certezas é que não haverá necessidade de convocar o tradicional conclave, já que não há um vácuo de poder. Logo, os cardeais não vão precisar se reunir no Vaticano para escolher um novo Pontífice, e a chaminé da Capela Sistina não emitirá a tradicional fumaça branca anunciando que há um novo Papa.

As regras para funerais papais são estabelecidas em um guia de 400 páginas chamado “Ritos Funerais do Pontífice de Roma”. Por diretrizes nele estabelecidas em 1996, o enterro do chefe da Igreja Católica deve ocorrer entre quatro e seis dias após a sua morte — durante esse intervalo, será exposto para os fiéis em uma simples estrutura.

Simples caixão cipreste

O corpo só será posto em um simples caixão cipreste horas antes do sepultamento, quando é abençoado com água benta, e o rosto do Pontífice é coberto com um véu branco. O artefato será envolto em outros dois caixões: o intermediário é de zinco, adornado com uma cruz, o nome do Papa, os anos de seu Papado e seu brasão, e o externo é feito de elmo ou nogueira e fechado com pregos de ouro.

Papas em exercício podem escolher onde serão enterrados: vários optaram por suas paróquias ou igrejas em Roma, mas os restos mortais de 148 dos 266 homens que já presidiram a Igreja Católica estão na Basílica de São Pedro. Bento se juntará a eles, disse o Vaticano, e será enterrado em uma cripta nas grutas que abrigam os restos mortais de outros Papas.

Relatos da imprensa em 2020 indicavam que Bento havia escolhido ser enterrado na antiga tumba de João Paulo II, no túmulo de São Pedro. No subterrâneo da Basílica, o local fica em uma área chamada Necrópole Vaticana, onde há diversas sepulturas e mausoléus, inclusive o que a Igreja diz serem relíquias do primeiro Papa, o apóstolo Pedro.

Anel do pescador

Tradicionalmente, quando um Papa morre, seu anel do pescador — um dos principais símbolos papais, feito especialmente para cada Pontífice e antigamente usado para selar documentos — é destruído, em outro rito da passagem de bastão. Quando Bento deixou o Pontificado em 2013, contudo, a parte de cima do seu anel foi marcada com um X para indicar que não tinha mais poder.

Os nove dias de luto são incertos, já que servem não apenas para os fiéis prestarem seus respeitos e cardeais celebrarem eucaristias em sua homenagem, mas também para que o conclave possa ser preparado. Segundo vaticanistas, contudo, parte dos procedimentos pode ter sido definido por Bento antes mesmo de sua morte — em 2020, seu biógrafo oficial, Peter Seewald, disse que ele deixaria um testamento. A palavra final, contudo, deverá ser de Francisco.

O último funeral papal ocorreu em 2005, quando morreu João Paulo II, cujo Papado havia começado em 1978. Seu corpo foi velado antes de uma missa de três horas na Praça de São Pedro, presidida pelo então cardeal Ratzinger. Acompanhada por uma multidão estimada de 1 milhão de pessoas, foi na época o funeral com maior participação da História.

Porta-voz do conservadorismo no Vaticano

Os restos mortais do popular religioso polonês, de quem Ratzinger era bastante próximo quando cardeal, foram levados para outra parte da basílica, o Altar de São Sebastião, quando ele foi beatificado em 2011. Em 2014, já no Papado de Francisco, foi declarado santo.

Bento, que por 25 anos chefiou o escritório de doutrinas da Igreja e foi um dos principais porta-vozes do conservadorismo no Vaticano, não era tão popular quanto seu antecessor, mas ainda assim seu velório deve atrair multidões de fiéis e curiosos. A popularidade do sisudo alemão também foi afetada por uma série de escândalos durante seu Papado, principalmente fiscais e de abuso sexual no Vaticano — muitos deles herdados da época de João Paulo II.

Assim que Bento deixou o cargo há nove anos havia temores de que a existência de dois Papas criasse um racha na Igreja, particularmente diante das divergências dogmáticas entre o alemão e o argentino. O latino-americano é mais moderado e vem fazendo uma série de reformas, não raramente recebidas com resistência, em uma das instituições mais antigas do planeta.

Salvo raras exceções, Bento XVI optou por manter-se em silêncio e evitar atritos com seu sucessor. Passou a última década vivendo praticamente em clausura no mosteiro Mater Ecclesiae, no Vaticano.

Por O Globo e agências internacionais — Cidade do Vaticano

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