Fed terá que elevar os juros acima do esperado, diz William Dudley

Ex-presidente do Fed de Nova York avalia que resultado deve ser uma recessão

Sede do Federal Reserve em Washington, D.C. (Foto: Reuters)
Sede do Federal Reserve em Washington, D.C. (Foto: Reuters)

O Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) vai ter de elevar as taxas de juros acima e por mais tempo do que o mercado espera atualmente e o resultado, provavelmente, será uma recessão, afirmou o ex-presidente do Fed de Nova York William Dudley, durante o BTG Macro Day. “O Fed terá de ir mais longe e por mais tempo do que as pessoas esperam, porque as condições financeiras, na verdade, não materializaram o aperto”, pontuou.

Apesar dessa percepção, o ex-presidente do Fed de Nova York acredita que o Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) vai começar a desacelerar o ritmo do aperto na próxima reunião, do 0,75 ponto percentual para 0,50 ponto. “A possibilidade é de desacelerar [o aperto] no encontro de setembro para 50 pontos base”, disse o economista. “O Fed agora considera estar num lugar mais confortável [do que no início do ano]”, explicou. “Mas isso realmente depende dos dados entre agora e o mês que vem.”

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Dudley afirmou ver o ritmo de 0,75 ponto de subida de juros implementado pelo BC dos EUA como uma forma de compensar a lentidão do início do ciclo de aperto monetário. “O Fed foi muito lento em apertar a política monetária diante da forte recuperação que se seguiu à pandemia e a inflação muito, mas muito, elevada. Mesmo em março, nós estávamos com taxa de juros de 0% e o Fed ainda estava comprando ativos financeiros mesmo com a inflação muito acima da meta.”

Apesar de ter acelerado para recuperar a distância, o Fed tem mantido uma postura muito otimista sobre o processo e em relação à taxa do fim do ciclo. O economista lembra que “nos últimos meses os mercados tiveram um rali, com as ações nos EUA subindo e os yields (rendimentos) dos bonds descendo”. E isso, acrescentou Dudley, “coloca mais pressão no Fed para fazer mais”.

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O BC americano tem se comunicado com pouca efetividade, na visão do ex-presidente do Fed de Nova York. “Acho que eles não têm comunicado bem o tamanho do trabalho que eles têm de fazer e têm sido muito otimistas sobre o quão fácil isso será.” Para Dudley, uma desaceleração controlada sem cair em uma retração da atividade será muito difícil de ser obtida. “Um pouso suave provavelmente não vai acontecer, porque o Fed começou tarde a apertar a política monetária”, disse.

O economista apontou o mercado de trabalho como um ponto- chave para controlar a inflação nos EUA. “Para conseguir trazer a inflação para a meta, o Fed terá de elevar a taxa de desemprego e desacelerar a economia, mas não atingiram nada disso até o momento”, avaliou.

O mercado de trabalho está no ponto mais apertado da história, ponderou o economista. “A taxa de vagas em aberto para cada trabalhador procurando emprego é de 1,8 para um. Então é um mercado de trabalho extraordinariamente apertado e o Fed terá trabalho para desacelerar a economia de modo a gerar uma folga suficiente no emprego para trazer a inflação para baixo.” O problema é que em sua comunicação “o Fed não deixa claro que poderá levar meses e meses e meses para conseguir ter a inflação sob controle e estão um pouco jogando para a frente a explicação sobre o quão difícil será”.

Conforme Dudley, o BC americano tinha em junho uma projeção de taxa de desemprego subindo para 4,1% com um leve aperto da política monetária. “E então teremos um belo pouso suave e viveremos felizes para sempre. Mas não é o que deve acontecer e é quase uma certeza de que teremos uma ampla recessão.”

Sobre os dados de contração da economia dos EUA nos últimos dois trimestres, o ex-presidente do Fed foi taxativo em considerar não haver recessão nos Estados Unidos ainda. “Não estamos numa recessão ainda. Acho que os dois primeiros trimestres com crescimento negativo não foram consistentes com uma recessão porque não foram em uma base ampla.”

O crescimento dos salários, pontuou Dudley, tem estado muito acima da meta de inflação do Fed de 20% ao ano. “Se você fala de inflação de 2%, provavelmente, teríamos de falar de alta de salários na faixa entre 3% e 4%, mas no momento estamos entre 5% e 6%. Então falamos de salários dois pontos acima do que o Fed quer e o processo de aceleração da inflação de salários não está no fim ainda. Isso porque as companhias olham para a inflação que está no passado [perto de 9% ao ano] e entendem que precisam pagar mais para seus profissionais. Mas não acho que estamos perto de uma espiral de inflação salarial, porque as expectativas estão bem ancoradas.”

Conforme o economista, há confiança no mercado e nas pessoas de que o Fed vai conseguir manter a inflação sob controle. “É realmente importante manter as expectativas sob controle, porque isso contribui para segurar reajustes mais elevados de salários. A desancoragem das expectativas é como as coisas saem do controle.”

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