Greve no Banco Central: ‘Não existe a hipótese de um servidor tirar o Pix do ar’
Executivo do banco conversou com a IF e explicou as reivindicações dos funcionários
Nesta semana, o Sindicato Nacional de Funcionários do Banco Central (Sinal) veio a público para falar algo que, até então, nunca se tinha ouvido: o BC vai entrar em greve. O que os funcionários da autarquia querem, obviamente, é reajuste salarial. Tudo porque o governo federal estaria em vias de publicar uma medida provisória com reajuste para os policiais federais e deixou os trabalhadores do BC a ver navios. Para entender o que de fato está acontecendo e como está o clima dentro do banco, a Inteligência Financeira ouviu um executivo concursado, que preferiu não ter seu nome revelado. O clima é tenso. “Juntamente com a greve, deve vir a entrega de comissões. Temos uma lista de mais de 700 cargos comissionados prontos para serem entregues”, nos contou o executivo. Abaixo a entrevista que ele nos concedeu por escrito:
O que vocês estão reivindicando?
Basicamente reestruturação da carreira de Especialista do Banco Central (Técnico e Analista) e reajuste salarial igual ao que está em vias de ser concedido à Polícia Federal (de quase 27%). Quando se fala em reestruturação seria a passagem do cargo de Técnico do Banco Central de segundo grau para nível superior e a mudança do nome do cargo de Analista para Auditor.
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Por que estão fazendo essas reivindicações?
No início deste governo houve o aumento da contribuição previdenciária de 11% para 14%, que impactou em diminuição do salário líquido dos servidores civis da União de um modo geral. Depois veio aumento expressivo de preços nos últimos três anos, com inflação acumulada de 22%. Porém, apesar do forte impacto financeiro no bolso dos servidores (e da população também), não havia clima para pedido de reajuste salarial. Nunca se cogitou isso em virtude de todos os problemas que a sociedade vem passando nesses últimos anos. Ter emprego já seria uma vitória. Porém, conceder aumento para uma categoria específica, a PF, por interesses pessoais, em detrimento das demais, levantou, de forma absurdamente expressiva como jamais vi em mais de 20 anos de casa, a indignação do corpo funcional do Banco Central.
Há uma agenda para ir paralisando os trabalhos aos poucos?
A greve está agendada começar hoje (1). Atualmente os servidores estão fazendo operação padrão, trabalhando entre 9h e 14h.
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O que há de verdade e de mentira nas divulgações?
Retirar o Pix do ar não é verdade. Foi uma inferência mal feita pela imprensa em cima da declaração do sindicato. Não vejo como tirar o Pix do ar. Os sistemas são automatizados, funcionam sozinhos e têm contingência, ambos são os sistemas que alimentam o Pix. Não existe a hipótese de um servidor “retirar o Pix do ar”, pois tudo é muito bem controlado e reservado e os servidores do Banco Central têm responsabilidade sobre os diversos sistemas operados. A ideia de uma greve é apenas parar de trabalhar, mantendo os serviços essenciais, mas não agindo para criar mecanismos de pressão de forma irresponsável e criminosa. Porém, em caso de falha operacional no sistema, o Pix pode ficar fora do ar temporariamente por falta de pessoas capacitadas para a correção, até o seu reestabelecimento, mas é apenas uma hipótese não certificada. Era sobre isso que o Presidente do Sinal alertou em sua entrevista, do risco de indisponibilidade.
Quais serviços podem ficar fora do ar?
Em tese, os serviços que não trazem impacto significativo serão os mais afetados, como atendimento ao público ou distribuição de dinheiro. Nada ficará fora do ar. O problema da greve do Banco Central é que nós só temos dois instrumentos de coerção: bomba atômica e estilingue. Como a bomba nunca será usada, ficamos atirando com o estilingue e tentando convencer a população e o governo federal da nossa importância e valorização. Os serviços críticos funcionarão normalmente: Sistema de Transferência de Reservas, Selic, Mesa de Câmbio, Mesa de juros, dentre outros.
Qual o papel do Banco Central hoje?
As principais funções são: emitir moeda, sanear e controlar a liquidez de oferta de moeda, controlar as contas internacionais, controlar a taxa de juros para atingir a meta, fiscalização prudencial das Instituições supervisionadas, fornecer liquidez para os bancos e controlar taxa de câmbio (executor da política cambial).
Como a greve pode atingir o dia a dia do investidor pessoa física?
Alguns atrasos ocorrerão por falta de funcionários, pois trabalharão em regime de plantão, mas a vida do investidor em nada será comprometida. Os sistemas são automatizados. Apenas o que requerer intervenção manual será mais afetado.
Quais serviços podem ficar de fora e que podem afetar o investidor PF?
Nenhum serviço corre risco de ficar fora por intervenção direta de servidores com esse propósito, a menos que haja falha operacional e que a ausência de servidores seja um complicador.
Como foi a negociação com o governo, antes de se optar pela greve?
A negociação foi ruim. Primeiro porque o presidente do Banco Central não quis assumir um protagonismo junto ao governo, segundo porque os canais políticos que obtivemos não foram confiáveis. A grande questão é que o governo está aguardando chegar próximo a 4 de abril para conceder aumento aos Policiais Federais, motivo da indignação dos servidores do Bacen. Veja que após 4 de abril será proibido conceder aumento a servidores por conta das eleições em outubro. Essa é a estratégia do Governo, conceder aumento para um grupo de interesse no apagar das luzes para evitar reclamação das demais carreiras.
Outro lado
Procurado pela IF, o Banco Central esclareceu que o cadastro de chaves não depende da intervenção de servidores do BC e que a liquidação das operações via Pix é automatizada e não depende de intervenção manual. “O Pix não será interrompido, o sistema continua a operar 24 horas e todos os dias.”
Em nota, o BC também esclarece que: “reconhece o direito dos servidores de promoverem manifestações organizadas; confia na histórica dedicação, qualidade e responsabilidade dos servidores e de seu compromisso com a Instituição e com a sociedade; tem planos de contingência para manter o funcionamento dos sistemas críticos para a população, os mercados e as operações das instituições reguladas, tais como STR, Pix, Selic, entre outros.”
Já a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) disse que “seus bancos associados acreditam em uma breve resolução no impasse entre o órgão e seus funcionários” e que “como já divulgado pelo Banco Central, existem planos de contingência para manter o funcionamento dos sistemas críticos para a população, os mercados e as operações das instituições reguladas”.