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Jogos de Pequim 2022: como foi planejada a primeira Olimpíada de Inverno com neve 100% feita por humanos
Mais de 100 geradores e 300 máquinas de ventilação de neve trabalham incessantemente para cobrir de neve artificial as pistas de esqui e esportes de inverno dos Jogos Olímpicos de 2022, que começaram oficialmente na sexta-feira (4). É isso mesmo, os Jogos de Pequim, na China, foram planejados para serem os primeiros Jogos de Inverno com praticamente 100% de neve artificial.
“Pequim não é o único lugar a enfrentar problemas com a falta de neve. Essa é uma questão recorrente nas áreas montanhosas de todo o mundo. Nosso objetivo não é nomear e envergonhar a sede dos jogos olímpicos de inverno, mas queríamos ilustrar os desafios com os esportes de neve avançando e, esperançosamente, iniciar uma conversa sobre como os eventos esportivos podem se adaptar às mudanças climáticas”, diz a pesquisadora Madeleine Orr, da Loughborough University, em Londres.
Maddy, como é conhecida entre seus pares cientistas, lidera um grupo de pesquisadores (The Sport Ecology Group) que estuda fenômenos que estão na interseção do esporte e das mudanças climáticas. Baseada em Londres, ela é uma das autoras do estudo Slippery Slopes: como as mudanças climáticas estão ameaçando os Jogos Olímpicos de Inverno de 2022.
“A produção artificial de neve (como planejada para os Jogos de Pequim 2022) não é apenas intensiva em energia e água, como frequentemente usa produtos químicos para retardar o seu derretimento. A neve artificial também oferece uma superfície que muitos atletas dizem ser imprevisível e potencialmente perigosa (pode rapidamente virar gelo, caso não encontre temperatura ambiente inferior a zero graus Celsius)”, afirma o estudo.
A região ao redor das instalações olímpicas enfrenta um período de seca extrema neste inverno. Mesmo em anos normais, a região não é particularmente adequada para esportes de neve. A queda média anual de neve em Yanqing (onde estão as encostas alpinas) e Zhangjiakou (onde muitos dos outros eventos são realizados, incluindo o biatlo) é de aproximadamente 20 centímetros, embora anos de neve mais altos tenham sido registrados.
TechnoAlpin, a fábrica de neve
A empresa italiana TechnoAlpin venceu a licitação para fornecer os equipamentos de fabricação de neve para os Jogos de Pequim, um contrato de mais de US$ 20 milhões. A TechnoAlpin cobriu as encostas secas de Yanqing com 272 canhões de neve e outros 82 “lança-neve” para produzir “neve técnica” para os locais de esqui e snowboard das Olimpíadas de Inverno. Eles estão todos ligados a um sistema de bombas e tubos de alta pressão que transportam água resfriada por torres de resfriamento pelas encostas.
“Estamos muito orgulhosos em dizer que somos a única empresa que fornece os sistemas de fabricação de neve para os Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim 2022”, disse em entrevista à CNN Michael Mayr, executivo da TechnoAlpin para a Ásia. O executivo afirmou à rede norte-americana de TV que é a primeira vez que uma única empresa é encarregada de fornecer toda a neve para os Jogos de Inverno.
Os “lança-neve” da TechnoAlpin lembram pequenos motores a jato ou secadores de cabelo, só que gigantes, com bicos que pulverizam cristais de gelo pelas pistas que estão sendo usadas pelos atletas. As máquinas podem ser guiadas remotamente usando Bluetooth para disparar a neve artificial a dezenas de metros, de forma a cobrir amplas ladeiras. “É enquanto está caindo no chão, quando entra em contato com o ar, que a neve é criada”, diz Mayr.
Os “lança-neve” têm até 10 metros de altura e não têm ventiladores, em vez disso, usam a gravidade para transportar a mistura de neve para o chão, tornando-a um pouco mais parecida com a queda de neve natural. As instalações de neve para os Jogos de Pequim 2022 estão espalhadas por três áreas.
A primeira fica no Centro Nacional de Esqui Yanqing, que é o local dos eventos alpinos, com os desenvolvimentos mais importantes realizados em termos de equipamentos de neve. O segundo é o distrito de Zhangjiakou Chongli, que abriga o Centro de Esqui Guyangshu, que inclui o Centro Nacional de Saltos de Esqui, o Centro Nacional de Cross-Country e o Centro Nacional de Biatlo. Eles hospedam os eventos nórdicos (salto de esqui e corrida de esqui cross-country), de biatlo e freestyle. Por fim, as instalações na capital Pequim, local do Shougang, que acolhe os eventos Big Air (snowboard e esqui freestyle), bem como os outros eventos indoor de gelo.
Clima adverso
Há um componente crítico jogando contra toda a parafernália tecnológica da TechnoAlpin, o clima. Alguns dos locais das competições não têm temperaturas frias o suficiente para congelar a água. Portanto, formar neve fica mais difícil.
Em Pequim, que sediará alguns eventos ao ar livre, quase todos os dias de fevereiro nos últimos 30 anos estiveram acima de zero, de acordo com o estudo Slippery Slopes, realizado pelo time de Maddy, da Loughborough University. Yanqing e Zhangjiakou, que são locais de maior altitude, são mais frios, com temperaturas médias altas que atingem o pico acima de zero e baixas que caem para cerca de menos 10 graus Celsius à noite.
“Houve avanços tecnológicos recentes que permitem a geração de neve quando está acima de zero”, explicou à CNN Jordy Hendrikx, diretor do Laboratório de Neve e Avalanche da Universidade Estadual de Montana. “Esta não é a neve ‘fofa leve’ que você pode imaginar – é muito mais densa e não muito macia.”
Quanto mais quente, mais energia para fazer neve
Fazer neve exige enorme quantidade de energia e água. “Obviamente, precisamos de mais energia quanto mais quente fica”, diz Mayr, da empresa italiana TechnoAlpin. E com 1,2 milhão de metros cúbicos de neve necessários para cobrir cerca de 800 mil metros quadrados de área de competição, de acordo com o relatório Slippery Slopes, a demanda de água nos Jogos Olímpicos de Inverno deste ano é gigantesca.
O Comitê Olímpico Internacional estimou que 222 milhões de litros de água serão usados para criar neve artificial para os Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim. É água suficiente para encher 3.600 piscinas de quintal de tamanho médio, ou o equivalente a um dia de consumo de água potável para quase 100 milhões de pessoas.
O COI não enfrenta esses desafios sozinho. A neve artificial está sendo usada como ferramenta para estender as temporadas de esqui em competições e resorts em todo o mundo, muitos dos quais estão ameaçados pelo aquecimento das temperaturas da crise climática.
No primeiro fim de semana dos Jogos de Pequim, as condições estavam ensolaradas, mas frias e tempestuosas. Para os atletas, estas condições adicionam dificuldade a percursos que já são tecnicamente desafiadores. Às 12h30 do domingo, no Genting Snow Park, instalação em Zhangjiakou, localizada a cerca de uma hora de trem da capital, base para as provas de snowboard, a sensação térmica era de menos 12 graus Celsius, com rajadas de vento de até 20 quilometros por hora, soprando na parte inferior da pista.
Os Jogos Olímpicos de Inverno de 2022 serão, sem dúvida, um espetáculo incrível – assistido e apreciado por milhões de pessoas em todo o mundo. Mas também devem provocar um debate sobre a mudança climática, o futuro dos esportes de neve e os limites da engenharia.
Fontes
https://www.sportecology.org/research
https://www.technoalpin.com/en/
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