Lula x Bolsonaro: Para onde vão Ibovespa e dólar após o 2º turno das eleições?

Entenda o que já está precificado nos cenários dos investidores e como o mercado deve reagir nos próximos dias

Ibovespa e dólar: confira o desempenho dos ativos de risco - Foto: Arquivo / B3
Ibovespa e dólar: confira o desempenho dos ativos de risco - Foto: Arquivo / B3

Após uma campanha eleitoral atípica, em que os ativos locais pouco oscilaram devido aos desdobramentos políticos do país, as últimas semanas trouxeram a volatilidade de volta aos mercados e levantaram questionamentos sobre o que está, de fato, embutido nos preços.

Com uma disputa chegando à reta final mais apertada do que se imaginava há alguns meses, os investidores devem se preparar para um período de instabilidade no curto prazo. De um lado, há incertezas sobre o programa de governo e a equipe econômica de Luiz Inácio Lula da Silva em caso de vitória do ex-presidente petista. De outro, alguns analistas começam a apontar a possibilidade de contestação do resultado das eleições caso o candidato e presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), seja derrotado por margem estreita.

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À parte o ruído eleitoral das últimas semanas, o ambiente externo é o que mais tem influenciado a comportamento dos ativos diante da inflação e das altas nos juros de vários países. Os investidores mantêm um olho na eleição e o outro nos bancos centrais de economias desenvolvidas, especialmente o Federal Reserve, dos Estados Unidos.

Cenário-base

Segundo analistas consultados pelo Valor, o cenário-base do mercado aponta para uma probabilidade maior de vitória de Lula nas urnas, na linha do que apontaram as últimas pesquisas de intenção de votos. Após o desempenho surpreendente de Bolsonaro no primeiro turno, no entanto, a reeleição do presidente está longe de ser descartada.

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Na quinta-feira, o Datafolha divulgou levantamento que mostrou Lula com 49% das intenções totais de voto contra 44% de Bolsonaro — em votos válidos, o petista apareceu em vantagem de 53% a 47%.

Em outras métricas utilizadas pelo mercado, o favoritismo de Lula se mantém. De acordo com pesquisa elaborada pela Warren | Renascença DTVM com 120 participantes do mercado, 47,5% dos entrevistados acreditam que Lula possui probabilidade de vitória superior a 50%, enquanto 21,7% atribuem chance maior que 50% de vitória para Bolsonaro.

Quando são observadas as probabilidades implícitas em casas de apostas, Lula tem aproximadamente 65% de chance de vitória contra cerca de 35% de Jair Bolsonaro.

“Olhando para os preços que estão na tela, não consigo dizer que uma vitória de Lula já está totalmente precificada. Para mim, é algo mais próximo de uns 60% de chance de Lula contra 40% de Bolsonaro e isso quer dizer que há prêmios nos ativos pensando em qualquer um dos dois cenários”, avalia o economista-chefe da RPS Capital, Victor Candido.

Vitória de Lula?

Embora considerada mais provável, a vitória do petista ainda é encarada com um certo grau de reticência pelos agentes financeiros. As questões chave são a incerteza relacionada à condução da política econômica que seria adotada em seu governo e qual é o nível de comprometimento do Partido dos Trabalhadores com a responsabilidade fiscal e com a sustentabilidade da trajetória da dívida pública.

Na quinta-feira, Lula divulgou uma carta com diretrizes de seu governo, ma a euforia inicial dos investidores com o documento foi logo dissipada. A avaliação geral dos agentes foi a de que a carta continha poucas novidades e que mostrava uma agenda política pouco alinhada à do mercado.

Ao mesmo tempo, os ativos financeiros vêm demonstrando expressiva sensibilidade à especulação de nomes que possam comandar a Economia em um eventual governo petista. A possível indicação do ex-ministro da Fazenda e ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles tem sido ventilada e, em diversos momentos, o mercado reagiu positivamente a ela, retirando de prêmios de risco.

“A combinação de uma presidência de Lula com um Congresso conservador e uma figura favorável ao mercado, como o ex-banqueiro central Henrique Meirelles como ministro da Fazenda, poderia estar o mais próximo possível do melhor cenário para os investidores, pois garantiria alguns grau de continuidade nas políticas fiscal e monetária, enquanto as propostas de política mais radicais seriam bloqueadas pelos legisladores”, afirma o economista-chefe de América Latina da Oxford Economics, Marcos Casarín.

Na Bolsa

Na bolsa, as oscilações na probabilidade de vitória de Lula foram acompanhadas por papéis de empresas ligadas ao setor de educação — com a perspectiva de retomada do ProUni e do Fies —, além de construtoras de baixa renda, na expectativa da retomada de programas de habitação social pelo petista.

De modo geral, no entanto, a vitória do petista ainda é encarada como menos favorável para os ativos locais. Segundo a pesquisa da Warren | Renascença DTVM, 44,2% dos entrevistados acreditam que o Ibovespa encerraria o ano entre 110 mil e 120 mil pontos neste cenário e outros 40,8% esperam que o principal índice do mercado acionário local encerre o o ano abaixo dos 110 mil pontos. Apenas 15% esperam o Ibovespa acima dos 120 mil pontos caso Lula vença.

Vitória de Bolsonaro?

Para grande parte dos agentes do mercado, uma vitória do atual presidente, Jair Bolsonaro, abriria espaço para uma euforia de curto prazo nos ativos locais. Segundo eles, a reeleição supostamente garantiria uma maior previsibilidade na gestão da economia, já que haveria continuidade. Nesse cenário, tenderia a ser ais inclinada a privatizações e a uma menor participação do Estado para impulsionar a atividade econômica.

Essa perspectiva, afirmam, não está totalmente incorporada aos preços. Por isso, ao se concretizar, poderia levar a um rali importante nos preços nos próximos dias. “Paulo Guedes deve ficar e manter a matriz econômica. Com isso, esperamos que os juros caiam, o real se aprecie e a bolsa suba. Setorialmente, em linha com a expectativa de queda das taxas longas, investidores devem entrar em papéis com ‘duration’ maior, como o setor de consumo discricionário. As estatais também devem ir bem”, diz Lucas Tambellini, sócio da Sumauma Capital.

De acordo com pesquisa da Warren | Renascença DTVM, 45% dos 120 profissionais entrevistados veem a bolsa entre 120 mil e 130 mil pontos até o fim do ano em um cenário de vitória de Bolsonaro. Outros 37,5% acreditam que o Ibovespa pode ultrapassar os 130 mil pontos.

Outra pesquisa, elaborada pela BGC Liquidez com 230 investidores institucionais, aponta que a média das expectativas dos entrevistados é de uma alta de 6,31% na segunda-feira em caso de vitória de Bolsonaro. Além disso, a queda do dólar poderia ser da ordem de 3%, segundo a estimativa dos participantes.

Na Bolsa

“Apesar do ruído nos últimos dias, está precificado um equilíbrio no pleito. Se Bolsonaro vencer, deve haver uma reação mais positiva. Os agentes estão mais comprados ali, já que o discurso é mais pró-mercado, mais privatizador e possivelmente mais fiscalista. Na bolsa, estatais devem se destacar e, com as promessas recentes de aumento de renda para a população, varejo e consumo não discricionário podem ser impulsionados à frente”, observa Anand Kishore, gestor de renda variável da Daycoval Asset.

Resultados contestados

Apesar da aparente tranquilidade que os ativos locais demonstraram nas últimas semanas, o cenário de que os resultados eleitorais sejam contestados no caso de uma vitória apertada de Lula ganhou espaço no radar do mercado nos últimos dias. De modo geral, os investidores ainda esperam uma transferência ordenada de poder no dia 1º de janeiro, mas reconhecem que um cenário conturbado após o segundo turno ampliaria a volatilidade dos ativos financeiros.

“Um resultado apertado pode atrasar a concessão do adversário, mesmo que os resultados estejam disponíveis na noite de domingo. A recente acusação de Bolsonaro de que algumas emissoras de rádio exibiram mais anúncios de campanha para Lula do que para o presidente pode se tornar uma questão controversa, levando a ações judiciais”, afirma o Barclays, em nota enviada a clientes. “Embora acreditemos que uma transferência pacífica de poder ocorrerá em 1º de janeiro caso Lula vença, isso ainda pode criar um período de incerteza nos mercados enquanto as auditorias podem ser realizadas, possivelmente levando vários dias.”

Na mesma linha, o Citi aponta que as chances de um resultado contestado não são desprezíveis. Em relatório assinado pelos estrategistas Donato Guarino, Dirk Willer e Eric Ollom, o banco americano diz acreditar que a margem de uma possível vitória de Lula no domingo é o que pode determinar a resposta de Bolsonaro a uma derrota. “O atual presidente não se esquivou de suas persistentes alegações de fraude eleitoral, apesar de repetidas garantis de integridade do sistema por parte de tribunais e líderes políticos. Ele reiterou tais declarações, embora muitos dos aliados de Bolsonaro tenham vencido no primeiro turno das eleições”, afirma.

Em agosto, o gestor Luis Stuhlberger, da Verde Asset, alertou que uma vitória apertada de Lula poderia levar um estresse de curto prazo aos mercados. “Não sei precificar dólar, câmbio e bolsa se o Lula ganhar por uma pequena diferença de margem. Tenho dado o nome hipotético de ‘banana republic’ a uma crise de duas a três semanas depois, e acho que o mercado não está preparado para esse tipo de risco”, disse ao participar de painel da Expert XP 2022.

Na pesquisa realizada pela BGC Liquidez a probabilidade de Lula vencer as eleições e não haver contestação dos resultados é de 35%; a de Lula vencer e existir uma tentativa de “terceiro turno” é de 30%; e a de Bolsonaro vencer as eleições é de aproximadamente 34%.

Por ora, no setor bancário não há grande preocupação com uma eventual turbulência política pós-eleição. Interlocutores ouvidos pelo Valor relatam que, apesar de esse risco não ter saído de todo do radar, a tensão atualmente é menor, por exemplo, do que no 7 de setembro de 2021, quando a crise institucional atingiu um pico. “Por enquanto não há um grande temor, mas também não dá para descartar que Bolsonaro hesite em entregar o poder tranquilamente caso Lula vença”, diz um alto executivo do setor.

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