Petróleo em queda livre: Opep+ e Trump combinam para criar tempestade no mercado

Empresas citadas na reportagem:
A decisão da Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados (Opep+) de aumentar a produção da commodity a partir de maio deste ano em volume maior do que o previsto surpreendeu o mercado, preocupa petroleiras e jogou mais incertezas no difícil cenário global de curto e médio prazos.
O anúncio do cartel se deu na quinta-feira (3), um dia depois do tarifaço do presidente americano Donald Trump. Na visão de analistas e de executivos do setor, a combinação dos dois fatores aumentou ainda mais as incertezas.
As sobretaxas americanas sobre o comércio tendem a desacelerar a economia mundial, o que pode reduzir o crescimento dos países e a demanda por petróleo. Mas, mesmo diante desse quadro já complexo, a Opep optou por triplicar o volume de oferta adicional em relação ao plano anterior, de 2024, o que fez tombarem os preços do petróleo.
Na sexta-feira (4), o petróleo tipo Brent, referência mundial, fechou a US$ 64,95 por barril, queda de 6,44% sobre a véspera e de 10,73% no acumulado da semana.
Cenário pode ajudar a Petrobras no Brasil?
Um cenário com preços mais baixos para o Brent pode ajudar a Petrobras a reduzir os preços do diesel e da gasolina no mercado doméstico. Em 1º de abril, a empresa cortou o preço do diesel em R$ 0,17 por litro, queda de 4,6%. Foi a primeira vez que a petroleira reduziu o preço do combustível desde dezembro de 2023. A gasolina, que teve aumento em julho de 2024, ainda segue sem alteração.
Mas a redução do preço do Brent, se mantida a mais longo prazo, também deve levar o Brasil a ter menos receitas com a exportação de petróleo. Em 2024, a commodity foi o principal item da pauta exportadora brasileira, superando a soja, com vendas de US$ 44,9 bilhões, alta de 5,23% sobre 2023.
Daniel Osorio, chefe da área de energia da Hedgepoint para os Estados Unidos e América Latina, diz que o Brasil está em situação difícil:
“O aumento da produção dos membros da Opep pode tornar mais difícil para a Petrobras e outros players brasileiros competirem na Europa e na Ásia.”
Na quinta, a Opep, responsável por cerca de 40% da produção global de petróleo, decidiu elevar a oferta da commodity em 411 mil barris por dia a partir do mês que vem.
O volume equivale a três meses do plano de retomada da oferta anunciado em dezembro. A ideia naquele momento era acrescentar à produção do cartel 140 mil barris/dia, a partir de abril de 2025, incluindo ainda maio e junho.
Até aí pode se dizer que o anúncio da oferta feito esta semana era esperado desde o fim do ano passado. Mas o que surpreendeu foi o acréscimo de um número muito maior de barris de uma única vez.
Banco reduz estimativa de cotação do petróleo
Diante da conjuntura, o Goldman Sachs reviu a estimativa da cotação do petróleo para US$ 66 por barril no fim de 2025, redução de US$ 5 por barril em relação à previsão anterior. Segundo o banco, além da decisão do cartel, as tarifas anunciadas por Donald Trump também elevam o risco, o que deve trazer maior volatilidade até o fim do ano.
Osorio, da Hedgepoint, diz que o anúncio da Opep tem relação com políticas internas do grupo. “Embora o momento possa parecer estranho, é importante considerar que a Rússia vinha expressando preocupações sobre o crescimento da produção do Cazaquistão há algum tempo, especialmente após a ampliação do gigantesco campo petrolífero Tengiz, operado pela Chevron. A decisão reflete tensões regionais contínuas, em vez de uma resposta direta às tarifas (de Trump)”, afirma.
O analista da Hedgepoint avalia que já era esperado que a Opep retomasse os níveis de produção em 2025, mas que essa decisão somada às tarifas de Trump pode ter efeitos incertos: “O que é certo é que muitos países serão forçados a negociar com os Estados Unidos. As empresas já estão buscando formas de mitigar os efeitos dessas novas tarifas.”
A queda da cotação do petróleo, acrescenta, pode levar os produtores de petróleo a reduzir os níveis de oferta em campos mais caros, o que deve levar as petroleiras a reavaliarem planos de investimentos.
Para Citi houve um golpe duplo
O Citi classifica o conjunto tarifas americanas e a decisão da Opep como um “golpe duplo” para o setor de petróleo e gás, elevando os riscos sobre o crescimento econômico global e a demanda pela commodity.
Em relatório, o banco afirma que a escolha da Opep de triplicar o volume de retomada da produção, em relação ao que era previsto anteriormente, acelerou a queda do petróleo: “A mudança de política do grupo de produtores parece vir de um período de tensões sobre certos membros que excederam os limites de produção.”
Felipe Perez, analista da S&P, diz que, apesar das incertezas trazidas pela Opep, há a ideia de que as tarifas de Trump têm vida curta e são instrumentos de negociação que podem estar sendo usadas em conversas com a Arábia Saudita, membro da Opep:
“A Opep tem desafios de trazer consenso entre os membros. Caso a tendência continue de queda de preço, o produtor americano vai considerar os planos de produção e ir contra a campanha americana por mais perfuração, o ‘drill, baby, drill’.”
Para Perez, o preço do barril mais baixo pode ajudar a Opep a conter alguns membros que, por terem alto capital privado estrangeiro na produção, estavam acima das cotas.
*Com informações do Valor Econômico
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