Proposta do Tesouro de novo arcabouço fiscal para substituir teto prevê gatilhos para gastos

Proposta prevê substituição do teto de gastos por arcabouço fiscal que fixa dívidas em faixas prudenciais de despesa

Sede do Ministério da Economia (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
Sede do Ministério da Economia (Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

Além da vinculação do crescimento real das despesas do país ao tamanho da dívida pública, a proposta de novo arcabouço fiscal elaborada pelo Tesouro Nacional sugere uma reformulação do resultado primário, que deixaria de ser uma meta fiscal para se tornar um mecanismo de incentivo ao esforço de arrecadação e se extinguiria com o chamado bloqueio bimestral de orçamento.

A proposta de novo arcabouço fiscal, que substituiria o teto de gastos, ainda prevê a existência de gatilhos, que visam reduzir o ritmo de crescimento das despesas obrigatórias, e cláusulas de escape associadas à abertura de créditos extraordinários.

Inscreva-se e receba agora mesmo nossa Planilha de Controle Financeiro gratuita

Com a inscrição você concorda com os Termos de Uso e Política de Privacidade e passa a receber nossas newsletters gratuitamente

“A pandemia de covid-19 trouxe, às regras fiscais brasileiras, um elemento didático: para ter maior resiliência, a regra fiscal precisa ser flexível, mas sem comprometer sua credibilidade ou seu objetivo”, informa o texto para discussão com o título “Reforma do Arcabouço de Regras Fiscais Brasileiro: reforçando o limite de despesa e o planejamento fiscal”.

Proposta será apresentada a Guedes e novo governo

A proposta, segundo técnico ouvido pelo Valor, ainda vai ser apresentada oficialmente ao ministro da Economia, Paulo Guedes. Mas, a expectativa desse técnico, é que o material seja usado para o debate de reformulação do arcabouço fiscal no próximo ano, com a posse do governo eleito.

Últimas em Economia

“Propõe-se uma única regra operacional, uma regra de despesa, vinculada a uma âncora de dívida traduzida em faixas prudenciais. O limite para o crescimento real da despesa da União estaria condicionado ao nível e à trajetória da Dívida Líquida do Governo Geral, indicador escolhido como aquele que melhor reflete os impactos de política fiscal e minimiza constrangimentos à gestão da política monetária ou à administração da dívida pública”, destacam os autores do texto em discussão: Cecília de Souza Salviano, Daniel Carvalho Cunha, Flávia Fernandes Rodrigues Barbosa, Luiz Fernando Alves, Mario Augusto Gouvêa de Almeida, Rafael Perez Marcos, Seiji Kumon Fetter e Thaís Riether Vizioli.

O Tesouro sugere que, quanto maior o nível de dívida, menor seja a taxa de crescimento da despesa. Dado um cenário fiscal em que a dívida líquida se encontra acima de 55% do PIB, por exemplo, haveria possibilidade de crescimento real da despesa de 0,5% a.a. em caso de trajetórias de redução da dívida, ou de nenhum crescimento real em caso de trajetórias de aumento do endividamento

Para dívidas entre 45% e 55% do PIB, o crescimento real da despesa poderia ser de 0,5% a.a. (caso de crescimento da dívida) ou de 1% a.a. (caso de redução da dívida). Por fim, para dívidas abaixo de 45% do PIB, seria permitido crescimento real da despesa de 1% ou de 2% a.a. A mesma regra valeria para a trajetória ascendente. O limite para a despesa será menor do que se a dívida estiver em trajetória declinante.

Superávit primário como incentivo de despesa

A taxa de crescimento também sofreria influência do superávit primário, que funcionaria como um bônus, neste caso atualizado todos os anos.

O estudo estabelece que essa taxa de crescimento da despesa seria válida por dois anos. Ou seja, no primeiro mandato do presidente, seria definida qual a taxa de crescimento que vigoraria pelos dois anos seguintes.

No caso do resultado primário, ganharia a configuração de mecanismo de incentivo para manutenção do esforço arrecadatório, permitindo maiores taxas de crescimento da despesa em caso de bons resultados. Ou seja, a realização de superávit primário poderia implicar em bônus para a expansão do gasto.

Considerando essa proposta, o Tesouro mostra, por exemplo, que o resultado primário obtido em 2023 (primeiro ano de mandato) poderia permitir a obtenção de bônus de resultado primário a partir de 2025 (penúltimo ano de mandato), e a apuração do bônus no último ano de mandato seria integralmente dependente do desempenho fiscal registrado durante os dois primeiros anos de mandato.

Segundo simulações do Tesouro, considerando esse modelo de arcabouço fiscal, em 2024, dada a expectativa de queda da dívida pública em 2022, haveria uma expansão do limite de despesas em 0,5%, ainda que o nível de dívida esteja alto. “Compõe-se a este valor os 2% de adicional de primeiro ano. Para 2025, como a taxa de crescimento é determinada para o biênio, mantém-se apenas o 0,5% estipulado pelas condições de dívida e resultado primário”, ressalta o documento.

Desonerações fiscais

“O texto para discussão ressalta que o que se propõe é a integração do resultado primário ao limite de despesas por meio de um bônus, a ser acrescido ao limite de crescimento real da despesa em função dos resultados primários obtidos. Ou seja, é dado um estímulo ao governo para que ele considere o efeito negativo das desonerações na arrecadação e no resultado primário, trazendo um custo à ampliação não planejada de desonerações, sob pena de menor crescimento real futuro da despesa. Este bônus será permanentemente incorporado ao limite de despesa e poderá ser direcionado a qualquer item sujeito ao teto, conforme avaliação de prioridades definida no momento da aprovação do orçamento pelo Congresso Nacional”, explicam os técnicos em texto para discussão.

O documento ainda destaca que a meta de resultado primário perderia sua configuração atual. O bloqueio de recursos para garantir a meta fiscal ou sanção formalmente estabelecida em caso de descumprimento seria substituído por “custos reputacionais”.

Explicações do Ministro da Economia

No caso de descumprimento da meta fiscal, o ministro da Economia teria que dar uma explicação pública com as justificativas. Esse modelo já é utilizado no caso de a meta de inflação, por exemplo, não for cumprida pelo Banco Central. Neste caso, o presidente do Banco Central tem que escrever uma carta explicando o motivo para o descumprimento.

O novo arcabouço proposto pelo Tesouro inclui gatilhos que visam reduzir o crescimento das despesas obrigatórias sujeitas ao teto, quando estas ultrapassarem 90% do limite de despesa, contribuindo para a não compressão das despesas discricionárias e para a melhoria da qualidade do gasto, além de cláusulas de escape, por meio da excepcionalização do limite de despesas dos créditos extraordinários, à semelhança do teto de gastos atual. Também está previsto que o teto de gasto dos Poderes seja definido de forma individualizada.

O texto ainda recomenda o redirecionamento da ênfase do planejamento fiscal brasileiro do curto para o médio prazo.

A Inteligência Financeira é um canal jornalístico e este conteúdo não deve ser interpretado como uma recomendação de compra ou venda de investimentos. Antes de investir, verifique seu perfil de investidor, seus objetivos e mantenha-se sempre bem informado.


VER MAIS NOTÍCIAS