Investir é equivalente a apostar?
Em muitos sentidos, a comparação é indevida. Mas em um elá é util
O processo de investir muitas vezes é comparado a um jogo de azar. Há uma frase atribuída ao famoso economista John Kenneth Galbraith afirmando que a bolsa de valores é “um grande cassino”. Gestores profissionais de recursos algumas vezes se autodenominam “players de mercado” (literalmente: jogadores de mercado). Mas esta metáfora entre investir e jogar estaria correta? Em muitos sentidos a comparação é indevida, mas em um aspecto específico ela é muito útil: as probabilidades futuras.
Da mesma forma que nos jogos, o sucesso ou fracasso de um investimento está relacionado com uma série de variáveis cujos desdobramentos só serão conhecidos no futuro. Assim não há certezas para o investidor, apenas probabilidades futuras, como nos jogos. Existem, contudo, diferentes tipos de jogos, com diferentes probabilidades de sucesso. De forma simples, podemos classificá-los em três grandes categorias:
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- Jogos com assimetria negativa: as probabilidades de ganho são menores que as de perda. Um exemplo são os cassinos, na maioria dos quais as chances de ganhar são de apenas 5%, com uma vantagem de 95% para a banca. Nassim Taleb, em sua tríade, denomina esse tipo de fenômeno de “frágil”, aquele que se perde com o risco, com a volatilidade. Um jogador está em uma posição frágil frente ao cassino.
- Jogos com simetria: as probabilidades de perda e ganho são iguais. Um exemplo é jogar uma moeda honesta, apostando em cara ou coroa: 50% de chances para cada uma. Taleb chama essa situação de “robusta” ou “resiliente”, aquela que não se ganha e nem se perde com o risco.
- Jogos com assimetria positiva: as probabilidades de ganho são maiores que as de perda. Um exemplo é jogar uma moeda com um lado mais pesado que o outro (chamada de “viciada”), por exemplo com 70% de chance para coroa e 30% para cara. O jogador sabe desta informação e pode apostar no lado da coroa. Taleb chama essa situação de “antifrágil”, aquela que se ganha com o risco, a volatilidade.
Fazendo o paralelo com os investimentos, ativos com assimetria negativa (frágeis) estatisticamente tendem a levar o investidor a perdas em longo prazo, sendo, portanto, ruins. Os simétricos (resilientes) também não são interessantes, pois tendem a empatar em longo prazo, sem ganhos consistentes esperados. Os realmente interessantes para o investidor são os antifrágeis.
Os investidores devem buscar ativos com assimetria positiva (antifrágeis), pois as probabilidades de ganhos estarão a seu favor em longo prazo.”
Existem várias categorias de investimentos antifrágeis. As ações são um bom exemplo de assimetria positiva em longo prazo (com a devida diversificação e dimensionamento da carteira conforme o perfil do investidor). Para ilustrar, analisando o desempenho das ações na B3 nos últimos 5 anos temos:
Últimos 5 anos* | Nº de ações | % do total |
Ações com ganho acumulado | 130 | 57% |
Ações com perda acumulada | 98 | 43% |
Total | 228 | 100% |
*Consideradas apenas as ações com negociação ininterrupta nos últimos 5 anos
Caso um investidor houvesse escolhido uma ação ao acaso, de forma aleatória na B3 há 5 anos, ele teria uma chance de 57% de ter escolhido uma ação que apresentou ganho e 43% de chance de uma com perda. Analisando desta forma, parece mais um investimento simétrico, com probabilidades relativamente próximas de 50%. Além disso esses percentuais variam conforme o período escolhido. Contudo essa análise está omitindo o ponto central da assimetria:
Últimos 5 anos* | Nº de ações | % do total | Ganho/perda médio da ação (%) |
Ações com ganho acumulado | 130 | 57% | + 168% |
Ações com perda acumulada | 98 | 43% | – 51% |
Total | 228 | 100% |
Apesar da probabilidade de ganho ou perda na escolha da ação ser próxima de 50%, há uma assimetria positiva a favor dos ganhos, os quais foram, em média de +168% contra perdas médias de -51%.
A explicação para isso está na natureza dos retornos esperados das ações, conhecidos tecnicamente como matriz de payoff. O nome é sofisticado, mas o conceito é simples: o máximo que uma ação pode ter de perda é de 100% enquanto seus ganhos potenciais são ilimitados, podendo ser muito maiores que a perda máxima. Vejamos nesse período as cinco maiores perdas e os cinco maiores ganhos na B3:
Maiores Ganhos | Ganhos acumulados em 5 anos (%) | Maiores Perdas | Perdas acumuladas em 5 anos (%) |
Petro Rio (PRIO3) | + 2.884% | ATMA Part (ATMP3) | – 99% |
Unipar (UNIP6) | + 1.055% | Viver Incorp (VIVR3) | – 98% |
Log-In (LOGN3) | + 874% | Saraiva (SLED4) | – 98% |
Inepar (INEP4) | + 828% | PDG Realty (PDGR3) | – 97% |
Dexxos Part (DEXP3) | + 772% | Blue Tech (BLUT4) | – 97% |
A perda máxima possível com o investimento em uma ação é de 100% pela natureza legal de responsabilidade limitada que o acionista possui em empresas S/A. Mesmo em uma eventual falência, o acionista responde apenas com o capital que investiu, sendo limitado a esse montante juridicamente. Os ganhos potenciais, ao contrário, são potencialmente ilimitados. Nos últimos 5 anos na B3, algumas empresas tiveram perdas próximas a 100%, porém nunca poderiam passar deste patamar. Já os ganhos foram muitas vezes maiores que 100%, atingindo 2.884% com a Petro Rio, por exemplo. Há uma clara assimetria positiva.
O investidor para ser bem-sucedido em longo prazo deve apostar em classes de ativos com assimetria positiva (antifrágeis) analisando as matrizes de payoff dos investimentos. Essas escolhas farão com que as probabilidades trabalhem a seu favor em longo prazo, potencializando as chances de ganhos expressivos de sua carteira de investimentos.