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Lemann e seus sócios na 3G Capital são processados por investidora nos EUA
No inferno astral de Jorge Paulo Lemann, até “inconsistências contábeis” que pareciam página virada voltam do passado para assombrá-lo. Uma investidora acaba de processar o bilionário e alguns dos seus sócios na 3G Capital pelos problemas na Kraft Heinz — que escandalizaram investidores e resultaram em uma baixa contábil de US$ 15,4 bilhões quatro anos antes de o rombo da Americanas virar manchete.
Segundo a petição inicial do processo, à qual a coluna Capital, do jornal O Globo, teve acesso, a investidora Adriana D. Felicetti acusa Lemann e a 3G de terem falhado em seu dever fiduciário com a empresa e seus acionistas e até de terem praticado insider trading (uso indevido de informação privilegiada) para lucrar com os papéis da Kraft Heinz antes de os problemas virem a público.
Ela pede reparação para suas perdas como acionista e para a própria empresa, inclusive com o ressarcimento da multa de US$ 62 milhões aplicada pela SEC (Securities and Exchange Comission, que regula o mercado de capitais nos EUA) contra a Kraft Heinz e de US$ 210 milhões que ainda devem ser pagos para encerrar ação coletiva iniciada por causa do mesmo escândalo. Outra demanda é que a 3G devolva os ganhos que teria obtido com o suposto “insider”.
‘Esconderam a verdade’, diz investidora
O caso foi protocolado no dia 6 de março na Delaware Court of Chancery, que existe há 230 anos e é um dos principais foros para resolução de disputas corporativas nos EUA. A corte tem a particularidade de permitir soluções mais flexíveis e abrangentes que o expressamente previsto na legislação. Foi lá, por exemplo, que foram julgados litígios sobre as fusões entre HP e Compaq e entre a dona da Louis Vuitton e a Tiffany.
“Por meio desta ação, a autora procura responsabilizar os réus por violação de dever fiduciário com a Kraft Heinz e seus acionistas. Os réus eram responsáveis por garantir que a empresa mantivesse controles efetivos, (…) que a Kraft Heinz divulgasse informações precisas e não enganosas e que a empresa cumprisse as disposições antifraude. Em vez disso, eles esconderam a verdade até que a 3G Capital se apropriasse indevidamente de informações importantes não públicas sobre o verdadeiro estado financeiro da empresa para seu benefício próprio, vendendo grande quantidade de ações ao público mal informado por mais de US$ 1,2 bilhão”, escreveram os advogados de Adriana D. Felicetti na ação.
Advogado diz estudar caso Americanas
Segundo disse à coluna Richard Greenfieldm um dos representantes de Adriana, a equipe da investidora está se debruçando sobre o caso Americanas — possivelmente para que ele reforce os argumentos da investidora sobre a conduta dos fundadores da 3G Capital.
Além de Lemann, são acusados no processo vários brasileiros, entre eles: Marcel Telles, um de seus braços-direitos e um dos homens mais ricos do Brasil; Alexandre Behring, cofundador da 3G que foi CEO da Kraft Heinz; e Bernardo Hees, que já foi CEO de Heinz e Burger King.
(Beto Sicupira, o terceiro membro do trio formado com Lemann e Telles, parece ter se livrado dessa por não ter assumido cargo na Kraft Heinz no período que abrange o caso, embora ele seja sócio-fundador da 3G).
A coluna entrou em contato com a 3G Capital, mas não obteve resposta.
Cultura 3G em xeque
Os problemas na Kraft Heinz obrigaram a gigante alimentícia a reconhecer uma baixa contábil de US$ 15,4 bilhões em 2019 e lhe rendeu multa de US$ 62 milhões. A companhia é controlada pelos grupos de Lemann e do americano Warren Buffett, seu amigo.
“A Kraft e seus ex-executivos estão sendo responsabilizados por colocar a busca pelo corte de custos acima do cumprimento da lei”, escreveu a SEC ao aplicar a multa, em 2021.
O comunicado pôs em xeque o cerne da cultura da 3G Capital, firma criada pelos três brasileiros e que controla também AB InBev e Burger King. Os 31% do trio na Americanas são detidos por meio de outros veículo, mas a filosofia é a mesma: obsessão por corte de custos, orçamentos que começam do zero a cada ano e bônus agressivos para executivos que cumprirem a cartilha. Estava claro para a SEC que incentivos errados e fraude caminharam juntos na Kraft Heinz.
Os papéis da Kraft valem hoje menos da metade que no pico, em 2017.
Por Rennan Setti, do blog Capital
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