Consumidores jovens e cerveja zero álcool esquentam disputa entre Ambev (ABEV3) e Heineken (HEIO34) no Brasil

O fronte da guerra de cervejas no Brasil mudou. As bebidas sem álcool ganham espaço entre os jovens e colocam a Heineken (HEIO34) frente a frente com a Ambev (ABEV3).
O mercado financeiro espera uma maior rivalidade entre as duas principais cervejarias no Brasil em 2025 e vê a disputa como fator de risco para os acionistas da Ambev.
Afinal, a marca brasileira não era superada pela holandesa até a pandemia, quando o jogo começou a virar. Esse quadro deve ganhar novos contornos este ano.
Ao mesmo tempo, Ambev e Heineken têm pela frente um cenário desafiador, segundo especialistas entrevistados pela Inteligência Financeira.
Sem álcool, sem graça? Não é bem assim
O mercado de bebidas alcóolicas no mundo inteiro encolheu no ano passado em relação a 2023, como mostram dados globais da consultoria Nielsen IQ. As vendas de bebidas alcoólicas totalizaram um volume de US$ 112 bilhões, queda de 0,8% na comparação anual.
A cerveja foi uma das principais justificativas para esse encolhimento. A bebida mais popular do mundo caiu 2,7% em volume de vendas, enquanto o faturamento geral ficou estável.
Mas, ao mesmo tempo em que a Nielsen mostra queda no volume de vendas, aponta também que dentre as categorias com saldo positivo, a cerveja zero álcool acumulou ganho em valor de vendas de US$ 140 milhões em 2024. E por uma boa razão: a fatia de clientes à procura de bebidas sem álcool aumentou 30% frente a 2023.
E há mercado para abocanhar dentre os consumidores de cerveja zero.
De acordo com dados da consultoria IWSR, a categoria de bebidas zero álcool deve crescer 7% em vendas por ano até 2028, ou o correspondente a US$ 4 bilhões. No Brasil, a expansão anual do segmento no período será ainda maior, de 10%, segundo a IWSR.
Mudança no consumo
Se a indústria de bebidas passa por estabilidade, a tendência de consumo atravessou mudanças radicais, diz Ana Clara Matta, consultora de marketing de bebidas. Ela já atuou pela Berkman, importadora de vinhos.
“Existe foco maior em saúde e vemos isso muito presente no consumo de álcool”, diz.
“A geração Z (nascida entre a segunda metade da década de 1990 até o início dos anos 2010) é mais gregária, que gosta de socializar, e valoriza experiências sobre bens duráveis.”
Nesse sentido, os jovens Gen Z mudaram até o horário de pico de consumo de álcool, diz Luiz Henrique Foggetti, CEO da APTK Spirits. “Hoje o consumo está mais vespertino, de 13h às 21h”, aponta.
Segundo ele, a Gen Z associa o consumo de cerveja à “barriguinha” e migra para drinks mais sofisticados. “Eles preferem, assim, beber melhor e evitar a ressaca no dia seguinte”, aponta Foggetti.
Heineken ganha fatia de mercado premium e zero álcool
A Heineken divulgou que sua cerveja zero álcool, que contém menos calorias do que a versão normal, cresceu 10% em vendas na escala global no ano passado.
A marca holandesa quer levar versões zero álcool para produtos que representam 91% de seus negócios.
“A categoria de zero álcool também foi líder de segmento no Brasil em 2024”, diz Ana Clara Matta.
Na Ambev (ABEV3), a inovação da cerveja sem álcool não passou em branco.
Afinal, a marca Corona cresceu 20% em volume de vendas em 2024, puxada pela Corona Cero, versão recém-lançada de teor alcoólico 0,0%.
Para os especialistas, a Heineken tem a vantagem na categoria.
“A Heineken soube jogar esse jogo de ‘cerveja zero’ melhor”, diz Rubem Eger, da consultoria Beer King.
“Além disso, eu acho que ela soube emplacar melhor a Heineken Zero. Hoje percebo mais clientes de classes A e B pedindo por ela”, diz.
O BTG Pactual mostra a evolução dos resultados da Heineken em relatório divulgado na segunda-feira (10). O banco afirma que “quando a Heineken superou suas restrições de capacidade produtiva, voltou a superar a Ambev após o recuo da pandemia”.
Em 2024, o volume de vendas da Heineken na divisão de cervejas cresceu 1,6% na média global, batendo a mesma métrica da Ambev, que expandiu 0,6%, considerando os países onde atua além do Brasil.
“A empresa (holandesa) tem mais o pulso no mercado mais jovem, é mais rápida na resposta às tendências e é uma máquina de marketing”, afirma Ana Clara Mattas.
Guerra das cervejas é risco para ações da Ambev (ABEV3)
As ações da Ambev (ABEV3), por enquanto, não sentiram a pressão. No ano, o papel sobe cerca de 11% após embalo dos resultados do quarto trimestre, cuja boa recepção no mercado financeiro veio do ganho de margens na operação internacional.
A divisão da Ambev no Canadá e na Argentina surpreendeu, tanto que o JPMorgan prevê uma mudança no consenso de mercado sobre as ações da empresa.
A BB Investimentos gostou do que viu e incorporou os números. Manteve, assim, a recomendação de compra do papel para 2025 com potencial de alta de 21%.
A analista da BB Investimentos Georgia Jorge, no entanto, aponta que um dos riscos para acionistas é o “acirramento da concorrência, que pode resultar em perda de participação de mercado”.
Quem também se preocupa com a concorrência é o Citi. Em relatório, o banco afirma que o ganho de margem em valor de vendas da Ambev no segmento de cervejas premium “parece estar sob ameaça”.
“Dados da Nielsen indicam que a Heineken conquistou fatia de mercado a custo de preços menores”, diz o banco de investimento.
O BTG avalia que a Ambev conseguiu inovar na pandemia e, com apps como o Bee Delivery e o Zé Delivery, captou dados de hábitos do consumidor que podem ajudá-la a conquistar novos mercados.
“A empresa agora tem muito mais dados sobre os hábitos de consumo e mais ferramentas para atuar assertivamente na gestão de preços e receita. O quão longe pode ir com isso? Parece promissor, mas só o tempo dirá”, conclui, assim, o BTG.
Ao banco, o CEO da Ambev (ABEV3) Carlos Lisboa disse que pretende revitalizar a venda de bebidas básicas da marca, principalmente a Skol.
O que analistas pensam da Ambev e suas ações
Banco | Recomendação para Ambev (ABEV3) | Visão |
BTG Pactual | Neutro; preço-alvo de R$ 15 | “O crescimento da Ambev depende de sua capacidade de manter um poder de precificação sustentável.” |
Citi | Neutro; preço-alvo de R$ 11,80 | “A ação negocia com preço em linha com fabricantes do setor na América Latina.” |
BB Investimentos | Compra; preço-alvo R$ 26 | “Nossa visão é de que a companhia tem um histórico de execução positivo, com capacidade de navegar em cenários mais desafiadores.” |
Heinken é ‘competição mais forte’ da Ambev em anos
À reportagem, um ex-executivo de uma marca conhecida comprada pela Heineken diz que a holandesa é o maior desafio competitivo da Ambev (ABEV3) em anos. Principalmente por ser internacional.
“Antes tínhamos a Petrópolis, Brasil Kirin e Ambev. Depois entrou a Heineken, que aumentou a presença no mercado brasileiro e compete mais forte com a Ambev do que as outras”.
“Não existe espaço para ressaca no mercado de cerveja”, comenta Foggetti
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