Análise: Atos de 7 de Setembro mostram Bolsonaro resiliente e empenhado em reduzir rejeição

Manifestações atingem objetivo político da campanha e aliados comemoram tom ‘moderado’ do presidente, diz Fábio Zambeli, do JOTA

A primeira-dama Michelle Bolsonaro e o presidente da República Jair Bolsonaro, durante as comemorações do 7 de setembro / Foto: Alan Santos/PR
A primeira-dama Michelle Bolsonaro e o presidente da República Jair Bolsonaro, durante as comemorações do 7 de setembro / Foto: Alan Santos/PR

Os eventos de 7 de Setembro, que confundiram as festividades dos 200 anos da Independência do Brasil com comícios pró-Jair Bolsonaro em todo o país, serviram como impulso à campanha do presidente num momento crítico da disputa. Pelo tom cuidadoso adotado na retórica de palanque, os atos também reduziram, ao menos temporariamente, a tensão entre os poderes Executivo e Judiciário a 25 dias do primeiro turno.

Do ponto de vista político, Bolsonaro usou a data comemorativa para demonstrar que tem, neste instante, mais apetite pela campanha eleitoral que pela contestação das urnas, o que entusiasmou seu núcleo-duro.

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Em discursos feitos a plateias de apoiadores em Brasília e Rio, ele procurou se comportar como “Jair Paz & Amor”, exatamente como seus estrategistas de comunicação desejam apresentá-lo na TV e nas redes sociais para tentar reduzir os elevados índices de rejeição.

Nesse contexto, o chefe do Executivo reforça estereótipos do chamado “tiozão do churrasco”, personagem que permite a ele quase uma licença poética para proferir piadas machistas mescladas com chavões direcionados ao público feminino — segmento que representa uma vulnerabilidade substantiva de sua campanha.

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Os aliados do “centrão” acreditam que é ainda possível atuar na redução de danos à imagem de Bolsonaro com base na comparação com o rival direto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que mantém a dianteira na corrida pelo Planalto, com 9 pontos percentuais de frente, segundo o agregador do JOTA.

É assim que agiu o presidente, seguindo o protocolo de sua coordenação eleitoral. “Não sou bem educado, mas não sou ladrão”, disse, dando o tom do antagonismo que ele pretende estabelecer com o adversário petista.

Mais que isso: em rara manifestação direcionada ao conjunto do eleitorado brasileiro, Bolsonaro afirmou que quer governar para todos os 215 milhões de brasileiros, “inclusive os de esquerda”, a quem “não deseja nenhum mal”.

Subliminar

Ainda que tenha se esforçado para vestir o figurino do “Jair”, o presidente enviou recados simbólicos em especial ao Poder Judiciário, com quem trava uma batalha desde meados de 2019.

O primeiro deles foi a presença do empresário Luciano Hang ao seu lado no palanque da parada militar na capital federal. Defensor ardoroso de Bolsonaro, Hang foi um dos alvos de operação de buscas determinada pelo STF para apuração de troca de mensagens supostamente golpistas no WhatsApp. Foi uma imagem calculada para fustigar o algoz Alexandre de Moraes, que hoje preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e autorizou a ação policial contra o empresário.

Avançando mais em direção à base mais radical bolsonarista, o presidente falou em duas oportunidades sobre como pretende lidar com esse permanente confronto com o Judiciário, mas cuidou de empurrar medidas mais duras de enfrentamento para um eventual segundo mandato. Ele insinuou que vai atuar para enquadrar todos aqueles que teriam jogado fora das “quatro linhas” da Constituição, mas, para isso, precisa da reeleição. Em suma, funcionou como uma espécie de convocação/pedido de segunda chance para aqueles que têm comparecido às ruas frequentemente desde sua posse para cobrar intervenção militar e até ruptura institucional.

Esses recados, ainda que menos agressivos que os dados no 7 de Setembro do ano passado, servem para lembrar que, a despeito da disposição em se dedicar à eleição, Bolsonaro permanece um ator político cujos espasmos de moderação estão sempre sujeitos às contingências do dia. “Não temos expectativa de moderar o presidente. Apenas acreditamos que ele possa fazer cálculos para chegar com chances à reta final da eleição”, afirmou um ministro ao JOTA.

Os sinais do centrão

Ainda no campo do simbolismo político e institucional, o que mais chamou a atenção do establishment de Brasília foi a ausência de representantes das cúpulas dos poderes Legislativo e Judiciário no palanque do 7 de setembro na capital, especialmente por se tratar de uma data comemorativa do bicentenário da Independência, com a aparição solene de chefes de Estado de países lusófonos.

Ainda que fosse improvável a participação de Luiz Fux, que preside o STF, e de Rodrigo Pacheco, à frente do Senado, pois ambos cultivam uma relação de equidistância estratégia com o Planalto hoje, a decisão do presidente da Câmara, Arthur Lira, que preferiu ir ao seu reduto eleitoral alagoano fazer campanha, desperta um sentimento de dúvida entre os parlamentares centristas, pilares da governabilidade.

A prevalência dos interesses regionais em detrimento do engajamento numa pauta fundamental para Bolsonaro, que é a do “casamento com o Congresso”, que colocaria o Judiciário em desvantagem na correlação de forças na Praça dos Três Poderes, atesta uma migração da perspectiva de poder por parte de expoentes do “centrão”.

Um dos líderes do bloco, consultado pelo JOTA nesta quarta-feira, resumiu assim a ausência de Lira ao lado de Bolsonaro no desfile: “Se Bolsonaro estivesse liderando as pesquisas, ele estaria lá com toda a certeza”.

O que muda?

O impacto dos eventos de 7 de Setembro não deve ser expressivo nas intenções de voto, mas presta enorme serviço a Bolsonaro a esta altura da sua conturbada campanha. O presidente obteve as imagens que desejava de multidões de verde e amarelo do seu lado nas principais capitais. É o que se chama na base bolsonarista de “Datapovo” — um instrumento útil para contestação de pesquisas eleitorais e, em última instância, até do resultado das urnas.

Fotos, vídeos e memes das concentrações de apoiadores em Brasília, Rio e São Paulo vão alimentar as redes sociais e a propaganda televisiva do presidente nas próximas semanas, numa ofensiva que visa mostrar ao eleitor comum que ele é capaz de reunir mais gente nas ruas do que o principal oponente.

Para a classe política, a mensagem mais robusta dos atos do Dia da Independência é a da resiliência da candidatura bolsonarista mesmo diante da desvantagem nas pesquisas de alguma frustração no QG político do Planalto.

Segundo um assessor presidencial, depois dos últimos levantamentos mostrarem que as medidas econômicas e o pagamento do auxílio de R$ 600 vêm sendo insuficientes para impulsionar Bolsonaro, levando-o a tirar a diferença para Lula, era essencial demonstrar que a candidatura do presidente não está derretendo — ao contrário, consegue arrastar um público significativo às ruas.

“Explodiu o ‘Datapovo’. A campanha começa agora. As pessoas vão pedir votos, vão tentar convencer os vizinhos, os familiares, os amigos. O apelo do presidente é muito forte e verdadeiro. Quem acha que a eleição acabou, está enganado”, resume um ministro do QG bolsonarista ao JOTA.

(Por Fábio Zambeli, analista-chefe do JOTA em São Paulo)
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