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Análise: Lula usa socorro às regiões atingidas por chuvas para reforçar defesa de gastos sociais
Em sua mobilização para liderar a resposta oficial à tragédia provocada pelos deslizamentos no Litoral Norte de São Paulo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) procura enfatizar a necessidade de mais recursos para obras e investimentos de natureza social no Orçamento.
O presidente e sua equipe aproveitaram o episódio para reforçar a defesa na flexibilização do teto de gastos, ligando a PEC da Transição, que permite quase R$ 200 bilhões de despesas extras em 2023, à dotação mínima para enfrentamento a calamidades como a provocada pelas chuvas durante o Carnaval —analogia que não encontra lastro técnico.
Discursando em meio a políticos e bombeiros em São Sebastião, o petista cuidou de associar a proposta, aprovada a toque de caixa no final de 2022, à destinação de verbas emergenciais para apoiar a região. “Nós tivemos sorte porque a PEC que foi aprovada, nós colocamos dinheiro para a Defesa Civil, que não tinha”, disse.
O atual governo sustenta que o valor reservado para o ano pela gestão anterior seria de apenas R$ 25 mil, o que seria naturalmente insuficiente para atender às famílias afetadas e ajudar os municípios mais atingidos.
Ocorre que uma situação excepcional de calamidade seria suficiente para remoção de obstáculos técnicos e jurídicos para redirecionamento de recursos de outras rubricas, via medidas provisórias, como ocorreu em outras crises similares no passado.
Em janeiro de 2022, por exemplo, MP editada por Jair Bolsonaro liberou R$ 700 milhões para as áreas afetadas pelas chuvas na Bahia, Estado então governado pelo PT. O dinheiro não estava inscrito com a rubrica da Defesa Civil na peça orçamentária, mas foi remetido em caráter de urgência para o litoral baiano.
Mais obras
Insistindo na retórica do gasto social como solução para o flagelo da população residente em áreas de risco, Lula, que nesta quarta-feira (22/2) conseguiu enviar R$ 7 milhões para socorro humanitário de famílias desabrigadas, também explorou a necessidade de orçamento mais robusto para habitação popular.
“Eu às vezes vejo na televisão lugares em que houve desabamento e que já passaram, cinco, seis, sete anos e não foi resolvido o problema habitacional. Dessa vez, o programa de construção de casas para pessoas que perderam suas casas vai acontecer de verdade”, afirmou o presidente no palanque montado para autoridades, lembrando da retomada do “Minha Casa, Minha Vida”.
O programa habitacional, relançado com pompa e circunstância por Lula na Bahia, é uma das principais vitrines do PT e tem a meta de contratar até 2 milhões de moradias até o fim do atual mandato.
O discurso lulista está em consonância com o apresentado na campanha eleitoral, na transição e nos primeiros 45 dias de administração — confrontando o mercado e as cobranças de rigor nos gastos públicos.
Para o presidente, a tragédia nas encostas da Serra do Mar é mais um exemplo de que a responsabilidade social deve prevalecer sobre a responsabilidade fiscal — mantra de sua terceira gestão, com potencial de ruído permanente com os agentes financeiros.
Cálculo político
Em paralelo ao objetivo político de demonstrar uma mudança de paradigma na relação da União com os entes federados, o presidente e seus ministros estão orientados a deslocar esforços e verbas para as áreas mais impactadas pelos deslizamentos.
A montagem de um “QG” do governo federal no porto de Santos, comandada pelo ministro Márcio França (Portos), que tem base eleitoral no litoral paulista, é parte dessa estratégia.
Lula quer demarcar as diferenças de conduta em relação ao antecessor, Jair Bolsonaro, que manteve uma queda de braço permanente com governadores e prefeitos, que eram, em sua maioria, da oposição. A ideia é mostrar que não haverá barreiras para repasses generosos de recursos.
O “laboratório” perfeito para essa nova métrica de articulação federativa é o Estado de São Paulo, governado pelo bolsonarista Tarcísio Freitas, potencial candidato ao Planalto em 2026.
Foi no território paulista que Lula travou uma das mais duras batalhas contra Bolsonaro na eleição de 2022, tendo vencido o rival na capital, mas sofrendo uma fragorosa derrota no interior e nas regiões litorâneas, agora mais afligidos pelos temporais de janeiro e fevereiro.
A presença ostensiva de autoridades federais na região durante o período mais crítico do enfrentamento aos desastres naturais é vista no Planalto como um imperativo na tentativa de reduzir a rejeição ao presidente no principal eleitorado do país, criando condições de recuperação da popularidade de Lula num dos mais consistentes cinturões antipetistas do país.
Por Fábio Zambeli, analista-chefe do JOTA em São Paulo
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