Análise: Política cambial deve ter inflexão caso Lula vença

Até agora, olhando as duas candidaturas favoritas, o país está bem no escuro sobre o que vem a partir de 2023, diz Fabio Graner, do JOTA

Foto: Pixabay
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Os analistas econômicos têm se interessado muito em entender os possíveis rumos da política fiscal em um eventual governo Luiz Inácio Lula da Silva. Mas outro ponto das diretrizes econômicas recentemente divulgadas pelo PT merece atenção: a questão cambial. Nessa seara, pode haver mudanças relevantes em relação à prática dos últimos anos, mesmo em um regime no qual há independência formal do Banco Central.

O documento do PT publicado no mês passado fala muito genericamente em agir para reduzir a volatilidade da moeda brasileira, sem entrar no mérito de como fazer isso. E nas conversas com interlocutores da campanha petista, claramente se busca evitar detalhamento sobre como isso será executado. Mas algumas fontes ligadas a Lula e ouvidas pelo JOTA lembram do que já foi feito no passado, dando indícios sobre a direção da política a partir de 2023, caso o petista vença a eleição em outubro.

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Medidas na área tributária, como o uso dos IOFs, e também na seara regulatória, trabalhando temas como exposição em derivativos, já foram usados no passado e podem voltar a ser acionadas. Mas há avaliações de que um instrumento poderoso precisa voltar a ser acionado com mais frequência: os swaps cambiais (operações no mercado futuro de câmbio feitas pelo Banco Central).

Nesse sentido, com o BC independente por lei, o caminho seria fazer o Conselho Monetário Nacional (CMN) ganhar ainda mais relevância do que já tem hoje dentro da institucionalidade da política econômica. Essa instância poderia formalizar diretivas para que o BC seja levado a ter uma política cambial mais ativa, inclusive usando esse tipo de instrumento do mercado de derivativos.

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“O BC não é autônomo na definição dos objetivos, mas sim para o uso dos instrumentos”, disse ao JOTA Pedro Rossi, professor da Unicamp que tem contribuído no âmbito da Fundação Perseu Abramo nos temas de política cambial, no qual é especialista, e política monetária. “A definição das diretrizes é atribuição do governo”, completou Rossi, destacando que ainda não há qualquer definição de política específica e que está claro que, se eleito, Lula pretende dialogar bastante com o BC.

Rossi salienta que a taxa de câmbio brasileira é a mais volátil do sistema financeiro internacional e isso precisaria mudar. “Política cambial não pode ser tabu. Uma política cambial ativa não deve ser confundida com intervencionismo. A ideia é continuar com um regime de câmbio flutuante, mas usando instrumentos para reduzir a volatilidade da nossa moeda, que é muito sujeita a ciclos especulativos”, afirmou.

O economista afirma que uma menor volatilidade cambial ajuda a conter a inflação. Nesse tema, Rossi também aponta que uma eventual gestão Lula teria uma política mais ampla para desinflacionar a economia, mudando por exemplo a gestão de preços de combustíveis na Petrobras e outras medidas para além da taxa de juros, que, na visão dele, precisa ter um nível menor também para diminuir a volatilidade cambial.

Cauteloso, ele evita falar em mudar as metas de inflação para os próximos anos, mas afirma que elas precisam ser “críveis”. Rossi lembra que o governo Bolsonaro só cumpriu seu objetivo em dois dos quatro anos e avalia que isso é ruim.

Política cambial é tema dos mais importantes. Um dos pontos que custou a alta da inflação no ano passado e que persiste até hoje foi o problema da excessiva desvalorização do real ante o dólar, em grande medida causada pelas incertezas políticas e econômicas, em enorme medida provocadas pelo governo e pelo Congresso, e em parte também vindas do exterior.

Assim, seja qual for o eleito em outubro, tão ou mais importante do que ter uma política cambial ativa para estabilizar o câmbio e conter seus impactos inflacionários, é preciso apresentar um arcabouço de política econômica que diminua as incertezas de médio e longo prazo sobre o país. Até agora, pelo menos olhando as duas candidaturas favoritas, o país está bem no escuro sobre o que vem a partir de 2023.

(Por Fabio Graner, analista de economia do JOTA em Brasília)
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