Lula decide demitir Silvio Almeida após denúncias de assédio

Relatos contra Almeida foram encaminhados à organização Me Too Brasil, que atua em defesa de mulheres vítimas de violência sexual

Silvio Almeida foi demitido do cargo de ministro dos Direitos Humanos e Cidadania do governo Lula Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Silvio Almeida foi demitido do cargo de ministro dos Direitos Humanos e Cidadania do governo Lula Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

Um dia após a divulgação de denúncias de assédio sexual contra o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu demiti-lo do cargo. O caso gerou forte reação negativa, exigindo uma ação rápida da gestão petista.

“Diante das graves denúncias contra o ministro Silvio Almeida, Lula decidiu pela demissão do titular da Pasta de Direitos Humanos e Cidadania”, afirmou a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, em nota.

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“O presidente considera insustentável a manutenção do ministro no cargo considerando a natureza das acusações de assédio sexual”, acrescenta.

No texto, o governo ressalta que “nenhuma forma de violência contra as mulheres será tolerada”.

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Entenda o caso

As denúncias contra Almeida foram encaminhadas à organização Me Too Brasil, que atua em defesa de mulheres vítimas de violência sexual, e acabaram sendo reveladas pelo portal Metrópoles. A informação também foi confirmada ao Valor pela entidade.

O ministro, que nega as acusações, chegou a ser chamado ontem à noite para apresentar esclarecimentos à Controladoria-Geral da União (CGU) e à Advocacia-Geral da União (AGU) sobre o episódio.

Nesta sexta, pouco antes de a decisão ser formalizada, Almeida foi convocado para um encontro com Lula e alguns ministros no Palácio do Planalto, entre eles Ricardo Lewandowski (Justiça), Esther Dweck (Gestão) e Cida Gonçalves (Mulheres).

De acordo com a reportagem do Metrópoles, uma das vítimas dos casos seria a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco. Procurada via assessoria de imprensa, Anielle não retornou. Após a divulgação da denúncia, a primeira-dama, Janja da Silva, postou na noite de ontem uma foto em que beija a cabeça de Anielle.

Questionado sobre a publicação da primeira-dama, Lula já havia demonstrado incômodo com o caso. “A Janja postar uma foto com a Anielle é uma demonstração de que as mulheres estão com mulheres. É normal, não tem como ficar favorável ao assédio. Alguém que pratica assédio não vai ficar no governo”, reiterou Lula, horas antes da demissão ser oficializada, durante entrevista a uma rádio de Goiânia (GO).

O presidente destacou que tem como foco coibir casos de violência contra as mulheres.

“Eu estou numa briga danada contra a violência contra as mulheres. O meu governo tem uma prioridade em fazer com que as mulheres se transformem definitivamente numa parte importante da política nacional. Eu não posso permitir que tenha assédio”, explicou o presidente.

Silvio Almeida, que ocupava o posto ministro desde o início do governo Lula, foi um dos quadros escolhidos com o apoio de Janja. Reconhecido pela atuação na área de direitos humanos, ele foi um dos convidados pela primeira-dama para discursar na superlive realizada na campanha de 2022, com a participação de influencers e ativistas, para pedir votos para a eleição de Lula.

Ministro tentou se defender

“A transparência acerca dos critérios de averiguação de fatos ensejadores de denúncias de violência contra a mulher representa espectro inarredável da sua esfera de proteção e carecem de diretrizes orientadas por perspectivas de gênero, evitando-se interferências de ordem a promover agendas que não colocam a mulher na posição central”, diz defesa de Silvio, representada pelo escritório Boaventura Turbay Advogados.

Depois das denúncias de assédio sexual, a defesa do ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, informou, nesta sexta-feira (06), que “realizará as medidas necessárias para fortalecer os dispositivos de proteção e acolhimento à mulher, em especial, vítimas de violência”.

Segundo nota divulgada à imprensa, Silvio Almeida “não realizará qualquer ação de silenciamento e invisibilização de vítimas de violência, tampouco, irá se desincumbir dos compromissos assumidos por toda a vida, de defesa irrestrita aos Direitos Humanos”.

“O sistema de justiça não pode atuar à margem de ações protetivas e deve ser instado a proteger de maneira interseccional vítimas de violência e opressão. A convocação do agir institucional regulado, sério e isento não pode ser visto como construto de opressão”, informa a nota.

Anielle comentou caso com outros ministros

Integrantes da cúpula do governo Luiz Inácio Lula da Silva admitem, em condição de anonimato, que a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, já havia admitido nos bastidores que teria sofrido assédio do titular dos Direitos Humanos, Silvio Almeida. Apesar disso, os governistas justificam que Anielle não teria oficializado a denúncia contra Almeida, o que explicaria a permanência dele no cargo durante esse período.

Lula disse que não vai tolerar casos de assédio em seu governo e que a Polícia Federal (PF) irá investigar as denúncias contra Almeida. “Alguém que pratica assédio não vai ficar no governo. Eu só tenho que ter o bom senso: é preciso que a gente permita o direito à defesa”, afirmou o presidente em entrevista à rádio Difusora Goiânia na sexta-feira (6).

Para Ministério das Mulheres, denúncias são graves

O ministério das Mulheres classificou como “graves” as denúncias de assédio sexual que vieram a público contra o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida. Em nota divulgada à imprensa, a pasta reafirma que “a prática de qualquer tipo de violência e assédio contra a mulher é inadmissível e não condiz com os princípios da Administração Pública Federal e da democracia”.

“É preciso que toda denúncia seja investigada de forma célere, com rigor e perspectiva de gênero, dando o devido crédito à palavra das vítimas, e que os agressores sejam responsabilizados de forma exemplar”, informa o ministério, comandado por Cida Gonçalves.

Em nota, a pasta manifestou solidariedade a todas as mulheres que diariamente quebram silêncios e denunciam situações de assédio e violência e informou que o governo federal tem um programa de proteção a quem faz denuncia de assédio. Lançado em julho deste ano, atende os trabalhadores do serviço público e inclui ações para terceirizados.

“Cabe ainda reiterar que proteção às pessoas denunciantes e mecanismos de acolhimento, escuta ativa, orientação e acompanhamento estão entre as ações previstas no Programa Federal de Prevenção e Enfrentamento do Assédio e da Discriminação no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional”, adiciona.

O Ministério das Mulheres informou que denúncias podem ser feitas no Ligue 180 e da Ouvidoria. “Nenhuma violência contra a mulher deve ser tolerada”, finaliza.

Comissão de Ética da Presidência abre processo

Mais cedo, a Comissão de Ética da presidência da República anunciou a abertura de um procedimento preliminar para cobrar explicações do ministro Silvio Almeida.

“Sobre as notícias publicadas em veículos de imprensa nos últimos dois dias, a respeito de supostos casos de assédio sexual envolvendo o Ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, e considerando ofício recebido do próprio Ministério, o Colegiado, por unanimidade, deliberou, na 27ª Reunião Extraordinária da Comissão de Ética Pública (CEP), de 6 de setembro de 2024, pela abertura de procedimento preliminar, para solicitar esclarecimentos ao Ministro sobre os fatos narrados”, diz o colegiado, em nota.

Presidente de comissão de direitos humanos da Câmara defende investigação séria e justa de denúncias

Em meio às acusações de assédio sexual contra o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, a presidente da comissão de Direitos Humanos da Câmara, deputada Daiana Santos (PCdoB-RS) afirmou nesta sexta-feira que o princípio da presunção de inocência deve ser preservado, mas ponderou que as denúncias são graves e que é preciso ter o compromisso contra a impunidade e o abuso de poder.

“É imprescindível destacar que o princípio da presunção de inocência deve ser preservado em todos os casos, garantindo que nenhuma pessoa seja julgada sumariamente sem o devido processo legal. No entanto, não podemos ignorar a gravidade das denúncias, que envolvem uma questão tão delicada quanto o assédio sexual”, escreveu Daiana em nota enviada à imprensa.

“As denúncias feitas por essas mulheres devem ser ouvidas e investigadas de forma séria e justa, respeitando o devido processo”, acrescentou.

Professora revela caso de assédio em 2019

Professora e candidata a vereadora em Santo André, no ABC Paulista, Isabel Rodrigues publicou um relato em suas redes sociais, nesta sexta-feira (6), em que afirma ter sofrido violência sexual por parte do ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida. “Se achou no direito de invadir as minhas partes íntimas sem o meu consentimento”, disse em vídeo.

Isabel Rodrigues afirma que o episódio com Almeida aconteceu há cinco anos e que eles eram amigos naquela época. “Dia 3 de agosto de 2019 foi o dia em que, em um almoço, onde tinham mais pessoas, sofri violência sexual por parte do ministro”, ela disse.

“Eu sentei do lado do Silvio. Ele estava do lado direito, eu do lado esquerdo. Eu estava de saia. Ele levantou a saia e colocou a mão nas minhas partes íntimas, com vontade. Eu fiquei estarrecida. Fiquei com vergonha das pessoas, porque é assim que as vítimas se sentem”, prosseguiu o relato.

Isabel Rodrigues diz ter demorado para entender que havia sido vítima de violência sexual. Mas, um tempo depois, entrou em contato com Silvio Almeida e os dois falaram sobre o que aconteceu.

“Eu liguei e falei ‘Silvio, eu quero te falar sobre aquela ocasião, daquele almoço, que você cometeu uma violência sexual comigo’. E ele falou, ‘você tá louca, Isabel? Quantas vezes nós nos encontramos e não aconteceu nada?'”, narrou a professora.

Ainda de acordo com o relato compartilhado no Instagram, ela respondeu: “Mas dessa vez aconteceu, Silvio. Eu quero que você me responda. Eu consenti em você colocar a mão no meu corpo, nas minhas partes íntimas?”.

O Almeida teria dito novamente “você está louca, Isabel?”. Ela insistiu para que ele respondesse. O ministro, então, segundo o relato da professora, teria dito que iria entrar em contato com seu terapeuta “porque tinha feito muito mal a uma amiga que gostava muito”.

Isabel Rodrigues afirma que decidiu falar publicamente sobre o caso por solidariedade às mulheres. “Se eu não prestar solidariedade às mulheres nesse momento, quando as coisas estão pipocando, quando será? Quando passar? O momento é hoje.” E finalizou: “Eu fui vítima do Silvio. Eu sou uma voz dessas mulheres.”

Com informações do Valor Econômico

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