Midterms: como a maior alta de juros do Fed desde 2008 afeta o governo de Joe Biden

Postura do Fed pode afetar Biden e levar a um "furacão" de apoio aos republicanos para assumirem Congresso e Senado nos EUA

O presidente dos EUA, Joe Biden. Foto: Kevin Lamarque/Reuters
O presidente dos EUA, Joe Biden. Foto: Kevin Lamarque/Reuters

O mercado acionário americano e a economia mundial observaram na tarde de quarta-feira (2) mais um capítulo da alta mundial de juros. O Federal Reserve (Fed), banco central dos Estados Unidos, aumentou pela quarta vez consecutiva a taxa básica de juros em 0,75 ponto percentual, que foi elevada a um patamar de 3,75% a 4% ao ano — a mais elevada desde janeiro de 2008.

Com o aumento dos juros, a economia americana continua a sinalizar um resfriamento para gerar novos empregos e alguns setores mais afetados incluem o ramo imobiliário, de consumo discricionário — restaurantes, lazer, hotéis e utilidades domésticas, entre outros — e o setor de tecnologia (Meta, Apple, Microsoft).

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Mas as consequências não são apenas financeiras. A postura do Fed de aumentar os juros pode afetar negativamente a perspectiva de vitória crucial dos democratas, partido de Joe Biden, atual presidente dos EUA, para ganhar as midterms.

Apesar de os EUA terem criado 261 mil novas vagas de emprego em outubro, acima da expectativa dos economistas consultados pelo Wall Street Journal, de 201 mil, a taxa de desemprego aumentou 3,4%. Os dados foram recebidos pelo mercado de forma mista.

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O que são as Midterms?

As midterms são as eleições que acontecem justamente no meio do mandato do presidente dos EUA, em que novos representantes dos EUA são eleitos, com a renovação do Senado e do Congresso, o que seria o equivalente aqui no Brasil à Câmara dos Deputados e ao Senado. Essas eleições são, na maioria das vezes, uma reflexão da popularidade do presidente eleito, e interferem diretamente em sua capacidade de governar, pois quem assume maioria do Congresso e do Senado é capaz de tramitar projetos com mais facilidade.

“Na última vez em que tivemos as eleições de meio de mandato, o ex-presidente Donald Trump perdeu a maioria do Congresso, o que foi decisivo para resto do sua gestão”, explica Vinicius Rodrigues, professor de Economia e Relações Internacionais da FAAP.

Com o Federal Reserve aumentando os juros, o especialista avalia que Biden terá uma eleição mais difícil para vencer em novembro, quando os americanos vão às ruas decidir quem serão os novos senadores e deputados. “A situação é de que, muito provavelmente, o Biden perca o controle da Câmara baixa do Congresso, o que muito provavelmente pode ocorrer com essa alta nos juros”.

A alta nos juros seria, nesse caso, mais uma dor de cabeça para o presidente democrata, que tem as mãos cheias com a guerra da Ucrânia e com pautas como a discussão da legalização do aborto nos EUA. O mau desempenho de Biden ao abordar a crise econômica é refletido nas pesquisas. Atualmente, há maior reprovação do que aprovação de seu mandato.

Segundo o site Five-Thirty Eight, que compila pesquisas eleitorais, o atual chefe de Estado americano possui 42,2% de sentimento positivo contra 53,1% negativo em relação à sua gestão. Em relação às midterms, o site diz que os republicanos devem assumir a maioria do Congresso. Já no Senado, a disputa está mais acirrada, com uma chance um pouco maior para os republicanos.

“Quanto maior aumento dos juros, maior contração na economia americana, a recessão, e menores as perspectivas de investimentos. É uma medida para controlar a inflação e preservar empregos, mas pode acabar prejudicando o sentimento da gestão de Biden”, aponta Rodrigues.

Vitória dos republicanos nas midterms

Em choque com o mercado, o Fed revisou os resultados da produção da economia americana para o segundo semestre. A projeção do PIB para 2022 é de apenas 0,2%, enquanto em 2023 o banco central americano estima um crescimento de 4% na economia do país.

Para Roberto Uebel, professor de relações internacionais da ESPM Porto Alegre, a alta nos juros é uma rasteira em Biden porque dificulta o consumo do americano médio e restringe o acesso a linhas de crédito.

“É um remédio amargo tradicional da macroeconomia, mas também a tempestade perfeita para que os republicanos voltem ao comando das duas casas no Congresso.”, diz o especialista. “A leitura política é de que Biden não conseguiu controlar inflação recorde, aumentou desemprego, e tentou alavancar setores chave da economia enquanto tentou domar indicadores como os juros. Foi inocência”, completa.

“Em novembro veremos muito provavelmente uma derrota contundente dos democratas nas urnas. É de se esperar um ‘furacão republicano’, o que eventualmente pode favorecer uma candidatura do partido à presidência em 2024”, afirma Uebel. Donald Trump é cotado como forte candidato dos republicanos.

Quem ganha — e perde — com a alta dos juros nos EUA

É cedo demais para avaliar quem perde e quem ganha com a alta de juros do Fed. Por ser uma medida macroeconômica, não há setores claros que ganham com a normativa do banco central americano. Esta é a avaliação de Uebel, que diz que, no curto prazo, há uma incerteza que atinge toda a cadeia produtiva da cadeia norte-americana.

“O efeito da alta dos juros nos EUA é global e sentido por outras economias, isso traz alerta vermelho para o restante do mundo”, afirma o professor.

William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue, ouvido pela Inteligência Financeira, diz que o setor de utilities e concessões públicas, que inclui provedoras de telefonia móvel, internet, água e luz, tem um histórico de atravessar crises com mais facilidade.

O que acontece com o governo Biden?

O aumento do Fed pode dificultar as coisas em casa, mas Biden tem um forte aliado a seu favor: o dólar. Ontem a moeda, ainda usada como reserva pela maioria dos países, se valorizou em patamar recorde. Mas o cenário pode mudar, já que esta semana marca a terceira consecutiva em que o dólar perde valor frente ao yen, moeda chinesa.

O positivo é que isso favorece importações de bens industriais da Europa, por exemplo. Rodrigues, da FAAP, diz que o governo Biden tenta tirar linhas de produção de chamados “países inimigos”, como a China, para trazê-las a aliados, como Marrocos e México.

“Mas essas medidas não devem chegar a tempo das midterms e não devem fazer a cabeça do eleitor americano”, explica o professor.

Se os republicanos ganharem maioria nas duas casas, Senado e Congresso, ficará mais difícil para Biden governar o país por meio de emendas e projetos de lei. Ficou claro, com aprovação apertada da “Lei da Redução da Inflação” pelo placar de 51 a 50 no Senado, com voto de Minerva da vice-presidente Kamala Harris, que a maré pode virar contra o presidente.

“Há o risco de paralisia do governo Biden com a vitória republicana nas midterms. Se este for o caso, os democratas terão de achar outra solução para se recuperar no país.”

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