Copom admite corte da Selic na próxima reunião, mas diretores não estão tão seguros assim
Existe um grupo mais cético em relação ao atual processo de queda de preços
Pela primeira vez desde o início do atual ciclo de alta da taxa básica de juros, os diretores do Banco Central (BC) admitem uma possível queda da Selic. Isso deve ocorrer em uma próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom).
Em ata da última reunião do colegiado realizado na semana passada, divulgada nesta terça-feira (27) pela instituição, os técnicos consideram as chances de voltar a estimular a economia. Para isso, portanto, seria necessária a redução da Selic, desde que mantida a atual tendência de queda na taxa de inflação.
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No penúltimo parágrafo da ata, os diretores do BC destacam que “a continuação do processo desinflacionário em curso, com consequente impacto sobre as expectativas, pode permitir acumular a confiança necessária para iniciar um processo parcimonioso de inflexão na próxima reunião”.
O trecho, no entanto, vem carregado de ressalvas. A primeira delas é que essa opinião, apesar de “predominante”, divide uma parte do colegiado.
Grupo está mais cético
De acordo com a ata, um outro grupo mostra-se mais cético em relação ao atual processo de queda de preços.
O texto aponta que, para esses diretores, a dinâmica desinflacionária “ainda reflete o recuo de componentes mais voláteis”. Além disso, “que a incerteza sobre o hiato do produto gera dúvida sobre o impacto do aperto monetário até então implementado”.
“Entretanto”, continua o texto, “os membros do Comitê foram unânimes em concordar que os passos futuros da política monetária dependerão da evolução da dinâmica inflacionária”. O texto destaca que, “em especial dos componentes mais sensíveis à política monetária e à atividade econômica”.
Cenário externo segue difícil
O documento ressalta que o ambiente externo ainda apresenta adversidades, apesar da redução do estresse nos mercados financeiros internacionais.
Segundo a ata do Copom, o bancos centrais das principais economias continuam empenhados em combater a inflação. Isso, então, pode afetar países emergentes, como o Brasil.
“Em diversos países, as leituras de inflação recentes apontam para alguma estabilização dos núcleos de inflação em patamares superiores às suas metas e reforçam o caráter persistente do atual processo inflacionário”, destaca o comunicado.
O BC destaca diretamente a atual alta dos juros além do esperado pelo Banco Central da Inglaterra. Outro ponto são as declarações recentes de Jerome Powell, presidente do Fed (Federal Reserve, o banco central americano), de que apesar da pausa recente na alta dos juros, já disse que deve retomar o ciclo de desestímulo. De acordo com o Copom, tudo isso impacta em países como o Brasil.
“No período recente, notou-se a retomada do ciclo de elevação de juros em algumas economias e a sinalização majoritária de um período prolongado de juros elevados para combater as pressões inflacionárias”. Consequentemente, “o que demanda maior cautela na condução das políticas econômicas também por parte de países emergentes”, destaca o texto.
Pressões inflacionários globais
Na análise de riscos, o Copom destaca que a conjuntura internacional está um pouco mais favorável para o processo inflacionário no Brasil. No entanto, fatores como o baixo grau de ociosidade do mercado de trabalho em algumas economias e a persistência da inflação elevada e disseminada no setor de serviços indicam que as pressões inflacionárias devem persistir por mais tempo.
O Comitê ressalta que a determinação dos bancos centrais em controlar a inflação e a dinâmica da taxa de câmbio podem ajudar a reduzir essas pressões.
Cenário doméstico: PIB surpreendeu, mas economia desacelera
No cenário doméstico, a ata destaca que os indicadores recentes apontam para uma desaceleração gradual da economia. O Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre de 2023 surpreendeu positivamente, impulsionado pelo agropecuário, mas com menor dinamismo em setores mais cíclicos. O mercado de trabalho apresentou resiliência, com aumento líquido de empregos, porém houve redução na taxa de participação.
Quanto à inflação, houve redução nos índices de preços ao consumidor, principalmente em bens industriais e alimentos. No entanto, os componentes mais sensíveis ao ciclo econômico e à política monetária ainda estão acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta. As expectativas de inflação para os próximos anos também recuaram, mas permanecem acima das metas estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional.
Taxa de juros neutra sobe
Quanto à condução da política monetária, o Copom decidiu elevar a estimativa da taxa de juros real neutra de 4,0% ao ano para 4,5% ao ano. Essa elevação foi justificada pela elevação das taxas de juros neutras nas principais economias e pela resiliência da atividade econômica brasileira combinada com um processo desinflacionário lento.
O Comitê destaca a importância de decisões que contribuam para a ancoragem das expectativas de inflação e para a estabilidade de preços.
Arcabouço fiscal ajuda, mas há riscos
O cenário fiscal também foi discutido, e o Copom avalia que a apresentação e tramitação do arcabouço fiscal reduziram substancialmente a incerteza sobre o risco fiscal. No entanto, desafios ainda persistem para o cumprimento das metas estipuladas para o resultado primário.
“O Copom novamente enfatizou que não há relação mecânica entre a convergência de inflação e a aprovação do arcabouço fiscal, uma vez que a trajetória de inflação segue condicional à reação das expectativas de inflação e das condições financeiras”, escrevem os técnicos.
Além disso, o Copom destaca a importância de continuar avançando nas reformas estruturais, principalmente aquelas relacionadas ao equilíbrio fiscal, à melhoria do ambiente de negócios e ao aumento da produtividade. Essas medidas são consideradas fundamentais para o crescimento sustentável da economia brasileira e para a ancoragem das expectativas de inflação.
Inflação no Brasil: risco para alta e para baixa
Em relação à inflação, o Copom aponta que há riscos tanto para alta quanto para baixa. Entre os riscos de alta estão a persistência das pressões inflacionárias globais, a incerteza sobre o arcabouço fiscal e a desancoragem das expectativas de inflação.
Por outro lado, os riscos de baixa incluem a possibilidade de uma desaceleração mais intensa da economia global, o que poderia impactar negativamente os preços das commodities, e uma frustração das expectativas em relação às reformas estruturais no Brasil.
Diante desse cenário, o Copom ressalta a importância de manter a atenção e a cautela na condução da política monetária. O Comitê destaca que é necessário acompanhar de perto a evolução dos diferentes riscos e a dinâmica da economia, a fim de adotar as medidas adequadas para garantir a estabilidade de preços e o controle da inflação.
No que diz respeito às expectativas de mercado, a ata revela que houve um aumento na mediana das projeções para a taxa de juros ao final de 2023, indicando uma possível elevação da Selic nos próximos meses. No entanto, o Copom reitera que qualquer decisão futura de política monetária será dependente da evolução dos dados econômicos e dos riscos para a inflação.