O que esperar da próxima reunião do Copom com corte de 0,50 p.p. na Selic já precificado?
Decisão do Copom sobre taxa de juros estará no centro das atenções
O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) se reúne nesta semana para a primeira decisão sobre juros de 2024. O ano começa com o mercado interessado em saber se até dezembro a autoridade monetária reduzirá a Selic dos atuais 11,75% para o patamar de um dígito.
Algumas projeções apontam para isso. Embora a queda a um dígito não seja certa, há algumas certezas no horizonte. Especialistas ouvidos pela Inteligência Financeira são unânimes em dizer que o BC cortará 0,50 ponto percentual (p.p.) na próxima decisão, que será anunciada na quarta-feira (31).
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Posteriormente, no dia 20 de março, repetirá a medida.
O que esperar do Copom para além do corte de 0,50 p.p.
Segundo Leonardo Cappa, economista-chefe da consultoria Traad, “as previsões indicam queda até perto de 9% (conforme o último boletim Focus) ao final do ciclo. Ou, no cenário mais conservador, a 10%”. Mesmo que caia só até 10%, ainda haverá mais dois cortes de 0,50 p.p. e, depois, mais um, de 0,25.
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Ou seja, esses cortes já estão precificados pelo mercado. Diante disso, a dúvida é sobre o tom do comunicado do Copom.
“Se o ciclo de corte de juros está perto do final, a linguagem deve ser modificada (em relação aos outros comunicados). Mesmo se não estiver, é preciso sinalizar ao mercado. Por isso, mais do que nunca, começa a ficar relevante o que será dito pelo Banco Central”, acrescenta Gustavo Cruz, estrategista da RB Investimentos.
Meta fiscal pode ser novo ponto de atenção
A perseguição à meta fiscal deve ganhar ainda mais destaque no comunicado de quarta-feira, para além do que já vem sendo sinalizado nas últimas reuniões, segundo Cappa, da Traad.
Com isso, pode aumentar o ruído entre Banco Central e governo. Isso porque “os economistas são unanimes em dizer que não haverá déficit zero (como pretende o BC). Mas, sim, algo entre 0,3% e 0,8%. A gente não sabe ao certo”, alerta o consultor.
Além disso, o governo está anunciando novos gastos sociais. “Com isso, a questão fiscal pode ganhar espaço ainda maior no comunicado. Contudo, no Focus, a gente já vê uma melhora na projeção da dívida”, pondera Cappa.
Plano industrial pode ser pauta nova no comunicado
Para Ricardo Pompermaier, estrategista-chefe da Davos Investimentos, “deve ganhar espaço a discussão sobre expansão parafiscal após o novo plano industrial do governo”. Ele se refere ao anúncio feito pelo BNDES de investir até R$ 300 bilhões em incentivos ao que tem sido chamado de neoindustrialização do país.
Com essa nova rubrica e aumento de gastos, existe a possibilidade de o Banco Central reforçar, em seu comunicado, a importância de o governo perseguir a meta fiscal de déficit zero, segundo o estrategista da Davos.
Decisão do Copom deve ter cenário internacional em foco
O conflito no Mar Vermelho, que afeta diretamente o tráfego de mercadorias pelo mundo, pode vir a ser abordado pelo BC quando o assunto for cenário internacional. “Há algum tipo de pressão inflacionária aos produtores por conta do aumento do frete, fruto do que está acontecendo naquela região”, avalia Cruz, da RB. Com isso, a abordagem a esse assunto pode incluir um tom mais duro.
Porém, há quem veja um alívio nas tensões geopolíticas. Não tanto relacionado à dissolução dos conflitos no Oriente Médio e na Ucrânia, mas ao impacto apenas marginal (por enquanto) em fatores que influenciam diretamente no comportamento dos ativos aqui, no Brasil.
“Indicadores importantes para a inflação doméstica, como o preço do barril de petróleo e o câmbio, não foram impactados como o esperado”, segundo Matheus Pizzani, economista da CM Capital.
O aumento de 122% no preço médio do frete desde novembro é relevante. Contudo, a menção no comunicado deve ser apenas discreta. Nesse sentido, o BC “não pode dar a entender que o ciclo de cortes será interrompido por fatores ainda difíceis de precificar”. A afirmação é de Caio Schettino, head de alocações da Criteria.
Inflação e juros no exterior
O BC deve se debruçar também sobre ambiente global de desinflação, que, na visão de Daniel Miraglia, economista da Integral Investimentos, “vem ocorrendo mais lentamente que o esperado”.
Com isso, o economista da Integral prevê que a taxa de juros dos EUA caia apenas na virada do semestre, diferentemente do que o mercado precifica hoje.
“O mercado avalia que o Fed deve começar a cortar os juros em março, com mais de 50% de probabilidade para este cenário. A gente acha, porém, que essa queda deve ocorrer apenas na decisão de junho”, diz Miraglia.
Inflação no Brasil também pesará sobre decisão do Copom
No cenário doméstico, a manutenção do processo de arrefecimento da inflação deve ser protagonista novamente no comunicado do Banco Central, diz Pizzani, da CM.
“Afora pressões inflacionárias motivadas por fatores sazonais, o IPCA seguiu em sua trajetória descendente ao longo do intervalo entre as reuniões, sustentando a principal base para o movimento de redução dos juros domésticos”, avalia Pizzani, da CM.
O que pode mudar o cenário?
Por outro lado, a inflação pode ser um fator a alterar a rota do Banco Central, segundo avaliação de Cappa, da Traad. Especialmente se tratando do comportamento dos preços para 2025 e 2026.
“Talvez o Copom queira sinalizar que, com a projeção de 9% de Selic, não será possível entregar inflação de 3,5%”, projetada pelo mercado. Isso porque o BC tem insistido em uma meta inflacionária de 3%, enquanto o governo segue engajado em ampliar esse horizonte.
Uma queda de inflação um pouco mais lenta pode estar relacionada ao aumento dos custos no setor de alimentos, com o impacto do El Niño na produção, aumentando principalmente os preços de soja e milho. “E esses preços se alastram pelo resto dos preços agrícolas”, acrescenta Cappa.
Diante desse cenário, de pressão inflacionária sobre os alimentos e elevação da dispersão do aumento de preços, conforme mostra o IPCA-15 de janeiro, a redução dos juros a um patamar de apenas um dígito seria mais difícil.
Além disso, “a deterioração da dinâmica inflacionária e/ou a piora do cenário geopolítico demandarão taxas mais altas para frear a aceleração dos preços”, segundo Yuri Alves, economista da Guide Investimentos.
Porém, os conflitos podem tomar caminhos mais serenos. Isso tende a causar uma dinâmica inflacionária menos preocupante. Dessa maneira, “as taxas de juros praticadas podem ter seu ritmo de redução acelerado”, complementa Alves.
Decisão do Copom e impacto sobre ações e ativos de risco
Para Miraglia, o mercado de renda variável segue suscetível a realizações de lucro, ou seja, saída de capital, ao menos no curto e médio prazos. No ano, o Ibovespa tem queda de quase 4%.
Os ativos de risco estão muito dependentes do que pode acontecer no exterior, segundo o especialista da Integral. E, até que o Fed apresente sinalizações mais certeiras de quando haverá o corte, “os ativos de risco podem ter mais realizações de lucro”. Essas sinalizações podem vir já na próxima quarta-feira, quando o Fed também decide sobre política monetária.
Contudo, Cappa afirma que os juros futuros em alta já mostram que os investidores têm antecipado alguma postura mais dura dos bancos centrais. Com isso, uma eventual postura mais hawkish (agressiva) das autoridades monetárias poderia ter um impacto reduzido, dado que parte disso já parece ter sido precificada, o que pode ser visto no desempenho negativo do Ibovespa em 2024 depois da alta robusta no ano passado.
“O mercado estava convergindo para o Focus, com projeções de juros próximos de 9% (no final do ciclo de queda). Porém, nas últimas semanas, o mercado se antecipou e está projetando um pouco mais de juros. Se o comunicado do Copom vier um pouco mais hawkish, não deve causar grande impacto porque já houve antecipação, mas, se vier ainda mais severo, aí os juros futuros podem subir a 10% ao final do ciclo, e os ativos de risco devem sofrer”, acrescenta.
Discurso mais brando e impacto sobre a bolsa
Portanto, caso o BC e o Fed sigam na linha mais dovish (branda), os ativos devem sofrer um impacto positivo, observando um fortalecimento da migração da renda fixa para a variável.
Jaqueline Kist, especialista em mercado de capitais e sócia da Matriz Capital destaca um aumento do fluxo de capital estrangeiro para a bolsa, “corroborando com a visão otimista para a bolsa brasileira dentre os países emergentes”, arremata.