Título isento rouba a cena e fundos de investimento perdem R$ 163 bi

Setor tem resgate recorde e fecha 2022 com patrimônio de R$ 7,4 tri

Título isento rouba a cena e fundos de investimento perdem R$ 163 bilhões. - Ilustração: Inteligência Financeira
Título isento rouba a cena e fundos de investimento perdem R$ 163 bilhões. - Ilustração: Inteligência Financeira

A alta da inflação e da Selic ao longo de 2022 provocou um deslocamento gigante de recursos dos fundos de investimentos, que tiveram resgate recorde de R$ 162,9 bilhões. O ambiente macroeconômico mais adverso reduziu a renda do brasileiro e também a disposição para a tomada de risco. Foi uma combinação em que os títulos de crédito privado isentos roubaram a cena.

Apesar da derrapagem na captação, o patrimônio da indústria cresceu 7,1%, a R$ 7,4 trilhões, acima da variação do IPCA no período. Desde 2008, na esteira da crise das hipotecas de alto risco, que culminou na quebra do banco americano Lehman Brothers, o segmento não tinha um ano fechado de fluxo negativo. O desempenho vem após um 2021 de ingressos de R$ 412,5 bilhões.

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É difícil carimbar o destino do dinheiro que tem saído dos fundos, diz Pedro Rudge, vice-presidente da Anbima, mas alguns fatores ajudam a ligar os pontos dessa história. “O primeiro deles é a competição dos títulos isentos, em que o investidor encontra um tratamento fiscal melhor do que se estivesse num fundo de renda fixa. O ambiente de inflação relativamente mais alta faz com que a renda disponível das pessoas diminua, ou seja, para manter o mesmo padrão de vida, sobra menos dinheiro para poupar. E a taxa de juros alta também faz com que pessoas endividadas prefiram saldar suas dívidas, gastando parte da sua poupança.”

Só em multimercados e ações, os resgates somaram R$ 158,1 bilhões, um sinal de que o investidor não quer estar sujeito às oscilações de humor do mercado.

Esse comportamento também foi percebido no recorte dos fundos, de diversas classes, que podem aplicar até 67% da carteira no exterior (IE). O patrimônio desse conjunto encolheu de R$ 70,9 bilhões para R$ 36 bilhões no ano, até novembro de 2022. Houve resgates de R$ 26,1 bilhões nesse período, e o número de contas caiu 42,3%, a 247,4 mil.

Os fundos de renda fixa também tiveram saques, de R$ 48,9 bilhões, em 2022, movimento concentrado em carteiras de curto prazo, normalmente destinadas a caixa. Só no último mês do ano, a classe registrou saídas de R$ 123,3 bilhões. Numa parcial da Anbima até novembro, a entidade mostra que os fundos de pensão e o varejo foram os públicos responsáveis por puxar as saídas do ano na categoria.

Os títulos de renda fixa representaram uma concorrência frontal, com o estoque só de letras e certificados de crédito imobiliário e do agronegócio (LCI, LCA, CRI, CRA) com incremento de R$ 264,3 bilhões no ano.

Mesmo com o início da marcação a mercado para títulos de crédito privado e públicos vendidos fora do Tesouro Direto, Rudge considera ser difícil bater a economia fiscal com os papéis isentos de imposto de renda para a pessoa física. “Dada a magnitude de juros, esses títulos ganham atratividade muito grande. E quando tem a possibilidade de isenção sobre o ganho de capital, ficam ainda mais atrativos”, diz Rudge. “É uma vantagem muito relevante que os fundos de renda fixa não têm.”

Do lado positivo, a previdência atraiu R$ 13 bilhões. Nos estruturados, os fundos de investimentos em direitos creditórios (FIDC) captaram R$ 12,7 bilhões, mas houve um ingresso concentrado, de R$ 27,9 bilhões, em uma carteira do tipo agro, indústria e comércio. Já fundos de participação receberam R$ 17,8 bilhões.

Rudge acha que o vento contra para o setor pode se prolongar se o Banco Central não encontrar condições para reduzir a Selic e as incertezas fiscais prevalecerem após a troca de governo. Ele lembra que, meses atrás, os agentes financeiros tinham como certa a redução do juro básico da economia com os sinais de arrefecimento da inflação, mas entrou em cena uma componente de tensão política maior.

“Com a incerteza fiscal, o mercado e os investidores acabaram incorporando talvez um cenário que [o BC] tenha que aumentar juros”, afirma. “Para esse movimento de saída de recursos de fundos virar e começar a ter um fluxo positivo, precisa antes ter um certo arrefecimento dos ânimos e previsibilidade do que vai ser a solução, ou pelo menos equilíbrio fiscal que o governo vai propor.”

As negociações para a PEC da transição, para aumentar o valor do Bolsa Família para R$ 600, com a licença avalizada pelo Congresso para furar o teto de gastos em quase R$ 200 bilhões, já trouxeram ruídos para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva antes mesmo da posse. “Tudo gerou bastante incerteza e as mensagens não foram tão positivas quanto se esperava inicialmente, de talvez ter um governo mais preocupado com o equilíbrio fiscal.”

Reportagem: Adriana Cotias

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