A passagem do Ano Novo é um dos momentos mais simbólicos no ano. Este é o único feriado comemorado em todos os países do mundo, tanto que é até chamado de Dia da Confraternização Universal. Em outras palavras, apenas o Ano Novo é realmente universal e está fortemente ligado à ideia de mudanças, renovação, novos objetivos.
O grande poeta Carlos Drummond de Andrade em Receita de Ano Novo (editora Record, 2008) sintetizou de forma magistral essa ideia em seus versos:
“Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.”*
As finanças comportamentais e o efeito calendário
Apesar dos livros-texto de finanças e economia idealizarem os investidores, como seres plenamente racionais, desprovidos de qualquer influência emocional e/ou irracional em suas decisões, portanto imunes a desvios da lógica fria da maximização da riqueza, na verdade sabemos que isto não é bem verdade.
Investidores são seres humanos e, portanto, cometem erros e são influenciados por suas emoções e crenças. A teoria de finanças inclusive criou um campo de pesquisa, conhecido como “Finanças Comportamentais” para estudar estes comportamentos não plenamente racionais dos investidores.
Richard Thaler, vencedor do prêmio Nobel de Economia de 2017 e expoente das finanças comportamentais, de forma bem-humorada, resume essa ideia dizendo que os livros-texto de economia tratam os seres humanos como se fôssemos todos Einstein.
Porém, para Thaler estamos mais é para Homer Simpsons mesmo (fazendo alusão ao icônico personagem do seriado de TV “Os Simpsons” marcado pela sua pouca ou nenhuma perspicácia, para colocar de forma educada).
As finanças comportamentais estudam os mais variados tipos de comportamentos que se desviam da previsão formulada por meio da hipótese da racionalidade absoluta dos humanos. Thaler de forma provocativa inclusive denomina esses desvios de “mau comportamento” (misbehaving em inglês), título de um de seus livros.
Neste contexto, um dos fenômenos mais documentos e estudados pelas finanças comportamentais é justamente o efeito calendário. Alguns são tão conhecidos que se tornam até lendas do mercado financeiro.
Temos, por exemplo, o famoso “rali de final de ano na bolsa de valores”. A grande maioria dos meses de dezembro historicamente são de alta na bolsa, não ocorre necessariamente todos os anos, mas é muito frequente. Não há uma explicação estritamente racional para isso, atribui-se muto disto ao bom-humor dos investidores com a chegada das festas de fim de ano.
Há também a situação inversa, neste caso, particular dos EUA, com o ditado “sell in May and go away” (algo como: “venda em maio e vá embora”). Nesta situação, historicamente os meses de maio são, em sua maioria, ruins para a bolsa estadunidense. Novamente não há uma explicação puramente racional, atribui-se ao menor volume de investimentos pelo início das férias de verão no hemisfério norte.
Há diversas outras como a bolsa subir em sextas-feiras e cair em segundas-feiras. O efeito, claro, é pequeno, mas estatisticamente significativo em longo prazo, refletindo o bom-humor dos investidores com a véspera do final de semana e o mau-humor com o seu término. E, claro, o Ano Novo.
O Ano Novo possui um grande apelo cultural e emocional, fazemos promessas de guardar dinheiro, emagrecer, comer melhor, iniciar uma rotina de exercícios físicos, entre diversas outras. Colocamos nossas expectativas, desejos, esperanças e nos motivamos a mudar, ainda que muitas vezes não passe do desejo ou até comece em janeiro, mas seja abandonado em fevereiro (particularmente no Carnaval, outro candidato a efeito calendário).
Os investidores, contudo, devem evitar essa armadilha mental. Não se sinta pressionado a alterar seus investimentos, tomar mais risco, fazer day trade, investir em novas classes de ativos, apenas pelo efeito da entrada do Ano Novo. Investir é um exercício de longo prazo, que necessita de uma estratégia bem formulada e adequada ao perfil e objetivos específicos do investidor.
Cuidado com o efeito calendário no Ano Novo (e ao longo do ano todo também). Foque em sua estratégia de longo prazo que aumenta suas probabilidades de maiores retornos com menores risco, isto é inteligência financeira.