Juros americanos: quais seus impactos no mercado? 

Fed manteve as projeções para os juros em 4,6% ao fim de 2024, o que significa que o banco central americano continua vendo espaço para 3 cortes de juros em 2024

Bolsa de Nova York, localizada em Wall Street - Foto: Robb Miller/Unsplash
Bolsa de Nova York, localizada em Wall Street - Foto: Robb Miller/Unsplash

Nas últimas duas semanas, tenho chamado a atenção para a questão sempre presente do risco-Brasil. É algo que afeta a vida de todo investidor brasileiro e, por isso, nunca deve ser ignorado. Mas, entrando no tema da coluna desta semana – os juros americanos e os seus impactos no mercado -, gostaria de trazer algumas atualizações de cenário, que são sempre importantes para quem investe. 

O evento do mês 

Na semana passada, tivemos um evento bastante relevante, que foi a decisão de juros americanos. Conforme esperado, o banco central americano manteve a taxa básica de juros americana em uma faixa entre 5,25% e 5,50%. No entanto, além disso, tivemos vários pontos importantes a serem analisados na decisão do Fomc (comitê de política monetária). 

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Mudanças nas projeções econômicas 

Em consonância com o que temos observado, e que irei demonstrar adiante, o Fed admitiu que o crescimento econômico tem sido maior do que o esperado aqui nos EUA – mudança na projeção do PIB (GDP). Além disso, junto com o maior crescimento, ele também admitiu que a inflação (PCE), especialmente em seu núcleo, pode ser maior do que sua estimativa em dezembro. 

No entanto, o Fed manteve as projeções para os juros em 4,6% ao fim de 2024. Isso significa que o banco central americano continua vendo espaço para três cortes de juros em 2024. 

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Menos dúvidas? 

O Fed mostrou uma menor dispersão de opiniões acerca dos juros no futuro. Ainda há um número relevante de dirigentes que veem menos espaço para cortes. Porém, ao julgar pelo famoso gráfico de pontos do Fed, pelo menos para 2024, um número maior de dirigentes vê a taxa do Fed Funds terminando entre 4,5% e 4,75%. 

A fala de Jerome Powell direciona os mercados 

Além do que já foi comentado, a entrevista do presidente do Fed, Jerome Powell, é de grande relevância para orientar os mercados. Em resumo, ele reforçou a resiliência da economia americana, do mercado de trabalho e o compromisso do banco central em trazer novamente a inflação para sua meta de 2%. 

No entanto, o ponto mais relevante de sua fala foi o fato de Powell reforçar a visão do comitê de que há espaço para cortes de juros em 2024, mesmo considerando o cenário de uma economia mais aquecida. Algumas falas denotam esse “compromisso” com possíveis cortes de juros: 

“Uma forte contratação no mercado de trabalho, por si, só não seria motivo para adiar os cortes nas taxas”. 

“Acho que eles (dados recentes de inflação) realmente não mudaram a história geral, que é a da inflação caindo gradualmente em um caminho às vezes acidentado em direção a 2%”. 

“Acreditamos que a nossa taxa de juros está provavelmente no seu pico dentro do ciclo atual da economia e que, se a economia evoluir conforme o esperado, provavelmente será apropriado começar a reduzir a política de aperto monetário em algum momento deste ano”. 

Impacto disso…  

A conclusão e interpretação decorrentes da decisão de juros, relatórios e da fala do presidente do Fed indicam que ainda será necessário acompanhar os dados e observar a evolução da inflação para afirmar se os juros irão ceder. 

No entanto, apesar dos dados mais fortes do que os esperados recentemente, a julgar pela fala de Powell, o Fed continua vendo espaço ou acreditando que os juros possam encerrar o ano próximo a uma faixa entre 4,50% e 4,75%. Mais uma vez, Powell defendeu que a taxa de juros esteja muito provavelmente em seu pico. 

Cenário de juros americanos

Refletindo o que comentei acima na conclusão, o mercado voltou a elevar a probabilidade de cortes de juros americanos, começando em junho. Então, podemos afirmar que o cenário de três cortes de juros em 2024 permanece como o cenário base mais provável. 

Com isso, entendemos que a janela de oportunidade para contratar taxas mais elevadas está se estreitando cada vez mais. Vemos títulos com vencimentos de 3 a 5 anos como a posição mais adequada na curva de juros, com títulos do governo americano e títulos de grau de investimento (investment grade) oferecendo um bom risco-retorno. 

Isso se deve à liquidez abundante, associada à redução da volatilidade e ao cenário benigno que temos observado nos mercados. Isso levou os spreads de títulos corporativos de alto risco (high yield) ao menor patamar em 2 anos. (Spread aqui é o quanto esses títulos pagam a mais em comparação com os Treasuries.)

E mesmo em bonds de maior qualidade, como os títulos corporativos investment grade, o spread se reduziu. A grande diferença aqui é que você pode conseguir uma remuneração melhor que a Treasury sem estar correndo um risco de crédito maior. E, por isso, mesmo com spreads tendo se reduzido, eles são interessantes.  

Nas ações 

O mercado de renda variável gostou do tom do discurso de Powell e da percepção de que seguimos com um cenário de cortes de juros acontecendo em 2024. Com isso, tivemos mais um dia em que o S&P 500 atingiu máxima histórica. Até aqui, em 2024, o índice já teve 19 dias de máximas históricas alcançadas este ano. 

A questão é que a alta acumulada desde o final de outubro chama atenção. Colocando isso em perspectiva, o S&P 500 adicionou US$ 10 trilhões em capitalização de mercado desde a mínima de 27 de outubro. De lá para cá, o índice subiu 28% em menos de 100 dias de negociação. Ainda em contexto, o S&P 500 adicionou cerca de 4 vezes o valor de mercado da Apple (AAPL) em apenas 5 meses . 

E após essas altas, vejo dois problemas…

1) Euforia?  

O mercado parece adotar uma postura excessivamente otimista. Isso, de acordo com alguns indicadores, aponta para uma certa euforia, algo sempre perigoso quando se trata de investimento em ações. Houve um influxo de recursos para a bolsa e uma maior exposição por parte dos gestores ativos à renda variável.  

O receio aqui é que parte desse fluxo seja derivado de um sentimento de FOMO, o “fear of missing out” – o medo de perder possíveis altas no mercado. E digo isso também porque, ao compararmos com a percepção da economia, parece haver um descolamento entre o sentimento do mercado e o sentimento econômico. Não necessariamente eles têm que andar juntos, mas tendem a convergir. 

2) Encareceu… 

O segundo ponto que preocupa é que, apesar de ter havido certa expansão de lucros, parte não desprezível das recentes altas se refere às expectativas com o futuro. Enquanto o futuro não acontece, a verdade é que a avaliação da bolsa americana (considerando aqui o S&P 500) tornou-se cara após a alta de cerca de 10% em 2024. 

O atual patamar do múltiplo Preço/Lucro estimado do S&P 500, de cerca de 21 vezes, está bem acima da média de 16,6 dos últimos 30 anos, ou ainda mais de 1 desvio (19,9x) acima dessa média. Quando olhamos para o setor de tecnologia, ele negocia a múltiplos ainda maiores. 

E, obviamente, as altas observadas no setor de tecnologia neste ano fazem com que muitos acreditem que esse seja um posicionamento ‘crowdeado’, em outras palavras, que talvez esse seja um posicionamento já muito difundido pelo mercado e que talvez haja menos espaço para novas altas. 

A Inteligência Financeira é um canal jornalístico e este conteúdo não deve ser interpretado como uma recomendação de compra ou venda de investimentos. Antes de investir, verifique seu perfil de investidor, seus objetivos e mantenha-se sempre bem informado.

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