CVM se pronuncia sobre o caso do fundo imobiliário; gestor pede para investidores aguardarem
A autarquia reforçou o medo do mercado ao dizer que a decisão pode ser aplicada a outros FIIs
A CVM se pronunciou, por comunicado, sobre a polêmica envolvendo a distribuição de rendimentos pelo fundo imobiliário Maxi Renda, negociado sob o código MXRF11, que é gerido pela XP e administrado pelo BTG Pactual.
A autarquia reforçou o temor do mercado ao dizer que, embora a decisão seja referente ao caso específico do fundo MXRF11, “o entendimento ali manifestado pode se aplicar aos demais fundos de investimento imobiliário que tenham características similares ao do caso analisado”.
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A CVM deixou claro que sua decisão não impede que os fundos distribuam aos cotistas valores superiores ao lucro líquido contábil (apurado pelo regime de competência). Mas sim que está demandando que esse pagamento seja bifurcado entre dividendo (limitado ao valor do lucro) e o restante como amortização de capital.
Por fim, como já é de conhecimento público, a CVM reiterou que a recente decisão do colegiado está sujeita a pedido de reconsideração pelo gestor e administrador do Maxi Renda.
Perda de mais de 5%
As cotas do fundo imobiliário Maxi Renda, negociadas sob o código MXRF11, registram queda de mais de 1% na quinta-feira (27), ainda como reação à incerteza dos investidores sobre a distribuição de dividendos pelo fundo, que reúne cerca de 500 mil cotistas na B3. Considerando a semana como um todo, a perda no valor da cota do MXRF11 supera 5%.
A visão do gestor
Para o gestor do FII, porém, os investidores estão reagindo precipitadamente. “As pessoas ficaram nervosas e afobadas, na minha visão, tomando atitudes precipitadas”, disse que André Masetti, executivo responsável pelo fundo dentro da XP Asset, ao se referir à queda de 4% no valor da cota na quarta-feira (26), e ao alto volume de negociação, de mais de R$ 43 milhões. “Minha opinião é que as pessoas deveriam aguardar o desfecho da história antes de tomar uma atitude”, afirmou o executivo.
Masetti ressaltou que, embora sujeito ao processo regular de auditoria, o MXRF11 deve ter encerrado 2021 sem prejuízos acumulados, o que significa, na sua visão, que não terá que reter a distribuição de dividendos para compensar o que supostamente teria distribuído a mais, como alguns participantes de mercado estariam dizendo. “Em 2021 o fundo fechou levemente positivo e nos últimos meses teve um grande resultado, que compensou prejuízos acumulados desde então. No caso em que a decisão do colegiado seja mantida, que isso vire uma nova regra para a indústria, o Maxi Renda não precisaria fazer retenção de distribuição para compensar o prejuízo acumulado, porque ele não tem mais prejuízo acumulado”, argumentou. Para ele, neste momento, é como se o fundo tivesse começado de novo.
O gestor explica ainda que a gestora procura reverter o entendimento da CVM, e buscar os “direitos do fundo”, de uma forma “amigável” e “com todo o respeito”. “Nós vamos pedir, com calma, a reconsideração por parte para o colegiado. A CVM não é um bicho-papão, não quer o mal dos investidores; pelo contrário, quando a CVM entender o impacto da decisão, na minha visão, não vai deixar que isso aconteça”, disse, ao citar que a decisão do colegiado não foi unânime. O diretor Alexandre Rangel votou pela manutenção da distribuição dos dividendos da maneira como os fundos fazem hoje, e manifestou preocupação com o impacto que a decisão poderia ter na indústria.
Entenda o caso
A questão toda gira em torno de um conflito entre o que diz a lei que regulamenta os fundos imobiliários no Brasil, de número 8.668, de 1993, e a as normas contábeis de maneira mais ampla.
Pela regra geral da contabilidade, uma entidade só pode distribuir como dividendo no máximo o que ela apurar como lucro líquido do exercício, ou o que tiver tido de lucro em anos anteriores e ainda não tiver distribuído. Qualquer valor pago acima disso aos acionistas ou cotistas deve ser tratado como redução de capital ou amortização de cotas.
Já a lei dos FIIs prevê que eles distribuam aos cotistas no mínimo 95% dos “lucros auferidos, apurados segundo o regime de caixa, com base em balanço ou balancete semestral encerrado em 30 de junho e 31 de dezembro de cada ano”.
Ocorre que não existe o conceito “lucro segundo regime de caixa”. Então a CVM e a indústria de fundos tiveram que interpretar o que é isso. Em 2014, a área técnica da autarquia divulgou um ofício procurando esclarecer como fazer a conta, que partiria do lucro contábil, apurado sob o regime de competência, e sofreria ajustes a partir de ganhos e perdas não realizados, para então chegar ao tal “lucro em regime de caixa”.
No cálculo do lucro contábil por competência, além dos fluxos de pagamento de aluguéis ou juros de CRIs, entra também a atualização do valor dos ativos imobiliários que o fundo tem na carteira. E essa atualização pode ser positiva ou negativa. Ninguém tem dúvida de que, quando ela é positiva, essa alta não deve ser considerada para entrar no mínimo de 95% que o fundo deve distribuir, já que poderia causar um descasamento de caixa para o fundo.
O questionamento agora é o que faze quando ela é negativa. O fundo recebeu o caixa. E ele pode distribuir aos cotistas. Mas será que deve fazer isso como “dividendo” (mesmo sem ter lucro), ou, será que, se decidir distribuir o dinheiro, deveria dar outro nome ao pagamento, e chamá-lo de devolução de capital.
Mais do que uma discussão semântica e contábil, isso preocupa a indústria por causa do tratamento tributário. Os dividendos pagos pelos FIIs são isentos de Imposto de Renda. Mas o ganho de capital não, estão sujeitos a 20% de IR sobre a diferença entre o valor de custo e realização da cota.
“Essa é uma discussão que começa com o Maxi Renda, mas se espelha em outros fundos da indústria. Está todo mundo começando a fazer a lição de casa para ver o que tem na carteira que pode gerar mesmo problema”, comenta Masetti.
Com reportagem do Valor Investe