Como funcionam os fundos multimercado que compram apenas fundo imobiliário

As gestoras criaram esses produtos para aproveitar os descontos dos fundos imobiliários com a alta da Selic, mas eles são bastante diferentes dos fundos imobiliários clássicos

- Ilustração: Marcelo Andreguetti
- Ilustração: Marcelo Andreguetti

Nos últimos meses, um tipo diferente de fundo de investimento começou a aparecer mais nas prateleiras: fundos multimercados que compram apenas fundos imobiliários. As gestoras criaram esses produtos para aproveitar os descontos dos fundos imobiliários com a alta da Selic. Atualmente, eles estão com patrimônio líquido de R$ 181 bilhões e com valor de mercado de R$ 141 bilhões, o que aponta que o desconto médio dos preços das cotas é de 22%.

Os fundos multimercados que compram apenas fundos imobiliários são bastante diferentes dos fundos imobiliários clássicos. Devido à regulação, esses produtos estão acessíveis apenas a investidores profissionais e qualificados, com a partir de R$ 1 milhão em aplicações financeiras. Eles só podem estar disponíveis ao público em geral se a carteira deles estiver diversificada em mais classes de ativos, o que não é o objetivo dos gestores, nesse caso.

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Além disso, esses fundos não distribuem dividendos mensais aos investidores, um dos atrativos dos fundos imobiliários, obrigados a distribuir no mínimo 95% dos rendimentos semestrais, isentos de Imposto de Renda. Os gestores reinvestem os dividendos em cotas de fundos imobiliários, com o objetivo de proporcionar ganho de capital, ou seja, de ganho com a valorização do preço das cotas, acima do Ifix, indicador de referência de fundos imobiliários.

A cobrança de Imposto de Renda e a liquidez também são diferentes. Esses produtos são tributados por meio do come-cotas, que acontece de seis em seis meses, em maio e novembro, ou quando os investidores resgatam o dinheiro, e não na hora da compra e venda da cota, como nos fundos imobiliários. E boa parte deles só deixa os investidores sacarem o recurso alguns meses após a aplicação.

Apesar desses fundos contarem com diversas desvantagens para os investidores pequenos, o assunto é importante porque dá pista de que os grandes investidores estão dando valor aos fundos imobiliários, na análise de Marcos Baroni, analista-chefe de fundos imobiliários na casa de análises Suno Research.

“O cardápio de fundos imobiliários aumentou e alguns já têm valor de mercado maior do que companhias da bolsa”, afirma. “Esse movimento de fundos multimercados comprando apenas esses produtos é um sinal de que investidores institucionais começaram a enxergar valor neles”, diz.

Ele avalia que o número de produtos assim deve continuar aumentando enquanto os preços das cotas dos fundos imobiliários seguirem com descontos, gerando oportunidades de compra.

“O mercado ainda está negociando com desconto e os investidores institucionais adoram isso, apesar disso não poder acontecer. É como se os melhores apartamentos do seu bairro estivessem sendo vendidos a preços abaixo do que eles valem”, afirma.

Um dos fundos multimercados que compram apenas fundos imobiliários criados no último ano para aproveitar esses descontos foi o Caixa FIC Imobiliário Multigestor Multimercado, do banco Caixa.

Gabriel Dutra Cardozo Vieira de Goes, diretor presidente da CAIXA DTVM, conta que a gestora de recursos da instituição financeira aproveitou a pandemia, a “tempestade perfeita para os fundos imobiliários”, para lançar um fundo multimercado que comprasse cotas que sofreram bastante, com a expectativa de que elas se valorizassem com a baixa da Selic no futuro.

“O preço das cotas dos fundos imobiliários se desvalorizou com a alta da Selic. Muitas pessoas físicas acabaram vendendo as suas, o que os gestores viram como oportunidade de compra barata”, afirma.

Atualmente, a maior fatia da carteira do fundo é composta por fundos de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), boa parte deles atrelados à inflação. O produto também está com parcelas em fundos de logística, shopping e lajes corporativas, além de fundos de fundos imobiliários (FOFs).

A gestora de recursos Rio Bravo também lançou um fundo multimercado que compra apenas fundos imobiliários no último ano, o Rio Bravo Valor Imobiliário FIC FIM. Giuliano Bandoni, gestor de fundos imobiliários da casa, afirma que é um caminho natural que cada vez mais gestoras criem essa modalidade de produto, até aquelas cujo foco não são fundos imobiliários.

“Devemos começar a ver gestoras de ações explorando essa estratégia”, diz. “Os gestores entenderam que as cotas dos fundos imobiliários estão baratas e que agora é um momento interessante de comprar com o objetivo de acumular ganho de capital.”

Ele destaca uma vantagem dos fundos multimercados em relação aos fundos de fundos imobiliários (FOFs). Geralmente, explica, os fundos imobiliários com descontos maiores distribuem dividendos menores. Assim, ressalta, os gestores dos multimercados conseguem aproveitar os descontos maiores e alterar a carteira dos fundos de forma mais ágil, já que não necessitam se preocupar com a distribuição de dividendos aos cotistas.

Outro fundo multimercado que compra apenas fundos imobiliários nascido no último ano foi o Real Investor Imobiliário FIC FIM CP, da gestora de recursos Real Investor. Anderson Lueders, sócio e cogestor da casa afirma que os fundos imobiliários continuam com desconto e destaca que essa modalidade de produto não é para todo mundo.

“Esse tipo de fundo é para os investidores que estão na fase de acumulação de patrimônio, não desejam dividendos mensais e querem se poupar do trabalho de reinvestir os rendimentos”, afirma. “Usamos a nossa capacidade de gestão para identificar a hora certa de comprar e vender os ativos e reinvestir os dividendos”, diz.

Ele conta que conversa com os gestores de maneira recorrente e que lê mais de 100 relatórios ao mês para tomar as decisões, o que é muito difícil para uma pessoa física conseguir fazer.

Alternativa para investidores não qualificados

Agora que os fundos imobiliários ainda estão baratos, os fundos multimercados que compram apenas esses produtos são uma boa alternativa para diversificar a carteira, na análise de Baroni, da Suno Research. “Analisando a fotografia atual, esses fundos fazem sentido para aproveitar os descontos. Eles vão continuar fazendo sentido no longo prazo? Eu não sei”, afirma.

Investidores que não são qualificados, ou seja, que não possuem a partir de R$ 1 milhão em aplicações financeiras, têm outras opções parecidas acessíveis dentro da classe dos fundos imobiliários: os FOFs e os hedge funds FIIs, fundos imobiliários que funcionam como os fundos multimercados, comprando diferentes ativos, mas esses ativos são do mercado imobiliário. Ambos distribuem dividendos mensais, diferente dos multimercados.

Os hedge funds FIIs compram ações, CRIs, Fundos de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDCs), Fundos de Investimentos em Participações (FIPs) e outros fundos imobiliários, por exemplo. Seu objetivo é diversificar os investimentos e explorar os melhores conforme o cenário. Assim, eles conseguem andar bem, mesmo quando determinados ativos estão em desvantagem. Ainda há poucos fundos assim no Brasil, mas eles também estão aumentando.

Na avaliação de Baroni, é mais correto comparar fundos multimercados que compram fundos imobiliários aos hedge funds FIIs do que aos FOFs.

“A história mostra que os FOFs têm dificuldade de se manter acima dos principais indicadores em momentos difíceis. Já os hedge funds FIIs têm cabeça mais aberta e menos presa a comprar e vender apenas fundos imobiliários. Estamos otimistas com eles, apesar deles não terem histórico ainda”, afirma. “Tendo a crer que os hedge funds FIIs são os fundos multimercados da pessoa física e o futuro da indústria”, diz.

Por Júlia Lewgoy, do Valor Investe

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