Independência de novo conselho da Petrobras em xeque

União indicou oito nomes para AGO da estatal em 13 de abril, os quais se declararam neutros; especialistas questionam essa isenção

A nova eleição para o conselho de administração da Petrobras, marcada para 13 de abril, pode renovar até quatro das onze cadeiras do colegiado no momento em que cresce a pressão por mudanças na política de preços dos combustíveis da estatal. A União, controladora da empresa, propôs lista com oito nomes – majoritariamente autodeclarados “independentes” – para a votação. O caso ressuscita, entre especialistas, o debate sobre o real grau de independência de membros do conselho indicados pelo governo em empresas estatais ou de economia mista, categoria na qual se enquadra a petrolífera.

A Assembleia Geral Ordinária e Extraordinária (AGOE) de acionistas da estatal, que vai eleger o novo conselho, é antecedida por incertezas que cercam a administração da companhia. Desde o dia 10, depois de a petroleira anunciar aumento expressivo nos preços dos derivados, o presidente Jair Bolsonaro elevou o tom das críticas ao presidente da estatal, Joaquim Silva e Luna, e sinalizou que uma troca no comando não estava descartada. Os reajustes contrariaram Bolsonaro, que queria que a empresa segurasse os repasses.

A pressão para que o general renunciasse se acentuou, até que, no dia 17, Bolsonaro amenizou as declarações, ao negar que tenha ascendência sobre a petroleira e dizer que não pode mudar o presidente da companhia, mesmo se quisesse. Em 2021, o presidente da República interferiu na substituição de Roberto Castello Branco, então presidente da estatal, por Silva e Luna. Agora diante das pressões, o futuro de Silva e Luna na empresa permanece incerto. Também há dúvidas se podem ocorrer mudanças na lista de candidatos indicados pela União ao conselho.

O conselho da Petrobras é formado por até onze membros. A lista de indicações do governo inclui oito nomes e três deles são novidade: Rodolfo Landim (indicado para substituir o almirante Eduardo Bacellar como presidente do colegiado); Carlos Lessa Brandão e o almirante Luiz Henrique Caroli. Os outros cinco – Joaquim Silva e Luna, Márcio Weber, Murilo Marroquim, Ruy Schneider e Sonia Sulzbeck Villalobos – concorrem à reeleição.

Já o atual conselheiro Marcelo Mesquita foi indicado pelos minoritários para concorrer à reeleição na votação em separado do controlador, pelos preferencialistas. Os minoritários também sugeriram os nomes de Juca Abdalla e Marcelo Gasparino para concorrerem com as indicações da União por meio do voto múltiplo. O Valor apurou que investidores privados se articulam para apresentar pelo menos mais um candidato. O objetivo do grupo é ampliar – de três para quatro membros – o número de nomes vinculados aos minoritários no colegiado. Os empregados da companhia, reelegeram Rosangela Buzanelli.

Dos oito nomes apresentados pela União, chama a atenção o fato de apenas um indicado (Silva e Luna) ter se declarado conselheiro não independente. A inclusão de membros independentes visa a assegurar que o conselho não seja uma extensão do controlador, além de oferecer uma visão externa para a companhia e dar voz aos minoritários. O estatuto da Petrobras diz que o CA deve ser composto, no mínimo, por 40% de membros independentes. Na composição atual, esse percentual é de 63%.

Há, contudo, quem conteste o real grau de independência de candidatos que se declararam independentes. Segundo fontes próximas à estatal e advogados ouvidos pelo Valor, fica difícil sustentar que um almirante como Luiz Caroli não viole o inciso III do artigo 36 do decreto nº 8945, que regulamenta a lei das Estatais. Esse inciso diz que, de forma a não comprometer a independência, o conselheiro não deve ter mantido, nos últimos três anos, vínculo de qualquer natureza com a estatal ou com os seus controladores, no caso a União. Os nomes indicados ainda passarão por análise do Comitê de Pessoas, órgão consultivo, de assessoramento ao CA.

A declaração de Ruy Schneider como membro independente também levanta dúvidas, embora a sua indicação tenha passado pelo crivo da governança da petroleira em 2021. Uma fonte próxima ao CA da estatal cita que, tomando como base o decreto nº 8945, um conselheiro independente da Petrobras não deve ser empregado ou administrador de empresa que ofereça ou demande serviços ou produtos à estatal. Schneider é presidente do CA da Eletrobras. Procurado, Schneider não quis comentar.

“A Eletrobras, enquanto geradora de energia diretamente ou indiretamente adquire combustíveis para suas termelétricas da Petrobras. Existe potencial conflito se ficar demonstrado que as empresas têm relações comerciais relevantes”, disse o advogado Carlos Portugal, sócio do escritório PGLaw e professor da USP. Em nota, a Petrobras afirmou: “As verificações relativas ao cumprimento de requisitos legais e estatutários de elegibilidade e de integridade dos candidatos à composição do Conselho de Administração da Petrobras ainda estão em curso.”

O debate passa pela análise do próprio comportamento dos membros do colegiado. Segundo duas fontes próximas ao CA da Petrobras, os atuais conselheiros indicados pela União têm demonstrado fidelidade às diretrizes do plano estratégico nas deliberações, sem prejuízo aos interesses da companhia.

O especialista em governança Renato Chaves defende que os conselheiros independentes não deveriam estar na chapa do controlador. “Fica a impressão de que são todos amigos e nunca criarão problemas”, diz Chaves, ex-diretor de participações da Previ. Na visão dele, em geral esses membros votam em sintonia com o controlador, mesmo quando há conflito gritante.

A independência tem alguns critérios objetivos estabelecidos no decreto nº 8945/ 2016, que regulamentou a lei das Estatais. O conselheiro independente não deve ter subordinação ou ligação familiar com os controladores nem ter sido empregado nos últimos três anos. Fornecedores ou compradores também estão excluídos.

Para um advogado, ter afinidade com a pessoa não coloca o conselheiro em conflito. “Não se pode confundir a necessidade de ter membros independentes com uma perda de prerrogativa de indicação do controlador”, disse.

Leia a seguir