- Home
- Mercado financeiro
- Economia
- Colapso bancário nos EUA: analistas falam sobre o impacto da crise do Silicon Valley Bank nos investimentos
Colapso bancário nos EUA: analistas falam sobre o impacto da crise do Silicon Valley Bank nos investimentos
Desde a última quinta-feira, o mundo dos investimentos teve que lidar com mais um componente importante para avaliar riscos e oportunidade. A crise dos bancos, causada pela insolvência do Silicon Valley Bank (SVB), o banco das startups, colocou muitas dúvidas na cabeça de investidores de todos os tamanhos.
Analistas se debruçaram sobre o tema para entender o impacto dela nos ativos internacionais, e também locais. Confira o que disseram os especialistas até agora sobre o alcance da crise dos bancos americanos para os ativos locais e globais, incluindo ações e juros no Brasil.
O que diz o mercado?
Para o Itaú BBA, “a forte resposta do Fed deve acalmar os mercados e pôr fim a qualquer potencial crise de confiança no sistema bancário dos EUA”, diz analistas do banco. Analistas começam a reduzir suas expectativas de juros para os EUA com a possibilidade de o Fed pausar o aperto monetário para conter a crise.
Na noite de domingo, o Itaú BBA avalia de forma positiva os anúncios do Fed, que disse garantir a todos os depositantes acesso a todo o dinheiro a partir desta segunda e o financiamento adicional disponível para instituições depositárias elegíveis.
Para o banco, as medidas devem “acalmar os mercados e acabar com qualquer potencial crise de confiança no sistema bancário dos EUA”, diz a instituição em relatório.
Ainda assim, a “recomendação é desalavancar e reduzir riscos” relacionados ao mercado de ações nos Estados Unidos.
Para os investidores que ainda pretendem manter posições nos EUA, o banco avalia todas as gigantes de tecnologia como possibilidades melhores que as pequenas do setor. “Mas nossa preferência imediata é para Apple e Microsoft, pois elas têm os balanços e rentabilidade/estabilidade mais fortes”, diz o banco.
Mercado esperava mais de reguladores, diz Allianz
O principal conselheiro econômico da multinacional de produtos financeiros Allianz, Mohamed El-Erian, afirmou no Twitter nesta segunda que a reação do mercado ao colapso do SVB e às medidas tomadas pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano) e outros reguladores “sugere que investidores e traders esperavam que mais estruturas de capital dos bancos fossem protegidas”.
O conselheiro da Allianz lembrou ainda que “apenas os depositantes do SVB estão sendo protegidos pelas intervenções políticas dos EUA e do Reino Unido”. El-Erian acrescentou que “os acionistas do SVB e detentores de títulos não garantidos enfrentam grandes perdas”.
O especialista sugeriu ainda que o Fed pode estar vivendo um problema de desconfiança entre os agentes econômicos. El-Erian apontou que a alta volatilidade “também pode ilustrar o problema de credibilidade do Fed”.
Entenda o que aconteceu com o SVB
“A situação foi um descasamento alto entre ativos e passivos do banco, os passivos são os depósitos que os clientes fazem, e os ativos, tudo aquilo que o banco tem para poder honrar suas dívidas”, diz Heitor Martins, especialista em renda variável na Nexgen Capital.
O SVB é um banco voltado para startups, em especial, para venture capital, que são dívidas com empresas que estão começado. “As garantias que o banco tinha eram ações ou equity dessas startups”, diz Martins, ressaltando que as garantias não eram sólidas o suficiente, o que causou o colapso.
“Quando começa um ciclo de alta de juros muito forte, esses títulos passaram a ter depreciação alta, e a partir daí, num banco com uma concentração grande desse tipo de ativos, os clientes passaram a precisar dos recursos, o banco ficou em uma situação difícil para honrar os depósitos e por isso quebrou”, explica o especialista.
“Com o passar do tempo, e os resultados desses investimentos mostrando-se frustrantes, parte dos acionistas começaram a questionar a gestão e a sustentabilidade dos negócios. Para complicar, alguns bancos, como parece ter sido o caso do SVB, alocaram tais recursos em títulos de elevada maturidade, que normalmente possuem baixa liquidez”, diz a Órama em relatório.
Perigos
Análise da Órama é a de que algumas situações em particular devem ser olhadas de perto para antecipar um possível alastramento da crise. “A despeito de ser uma instituição regional, não se pode desconsiderar que cerca de 30% dos depósitos bancários nos EUA sejam realizados em bancos menores. Ou seja, há perigo de ‘transbordamento’ para bancos maiores, que deveria ser evitado pelas autoridades”, diz a Órama.
“O custo de captação dos bancos pequenos/médios irá certamente aumentar de forma significativa, reduzindo suas rentabilidades, com reais consequências sobre seus acionistas e o mercado acionário”, acrescenta o relatório.
‘Maior colapso desde 2008’
O colapso da Silicon Valley Bank, banco do Vale do Silício, “é o maior desde a crise financeira de 2008”, diz Luiz Felipe Bazzo, CEO do Transferbank. “Mas, é público que desde a Crise Financeira Global, os bancos foram obrigados a manter seus índices de cobertura de liquidez acima de 100%, detendo ativos de alta qualidade suficientes para atender às saídas de depósitos”, o que reduz os impactos da quebra.
“Isso significa que eles detêm quantidades significativas de títulos do Tesouro dos EUA. Os bancos estão autorizados a manter esses títulos em contas ‘Disponíveis para venda’ e ‘Mantidos até o vencimento’ e não são obrigados a reconhecer perdas de marcação a mercado imediatamente se os títulos perderem valor”, explica Bazzo.
2008, de novo?
Com a intervenção do FED e comprometimento da FIDC, Bazzo diz não acreditar que a crise faça com que os investidores se sintam menos seguros se tiverem algum tipo de exposição a ativos ou detiverem seu próprio dinheiro em bancos com perfis de risco semelhantes. “A liquidação pelo FDIC deve colocar um ponto final nas incertezas sobre esse banco em particular”, avalia.
“Não estamos em 2008, nesse caso não há bolha de crédito alimentando a economia. No entanto, o fraco poder de negociação salarial tornou os consumidores, principalmente os de baixa renda, mais dependentes do crédito. Em outras palavras, a situação de juros mais elevados pode já ser sentida por entre os consumidores, enquanto a incerteza em torno das condições de empréstimo pode levar à especulações generalizadas”, completa o CEO.
Para os analistas da Órama, ainda é cedo para dizer o que ocorrerá com os mercados no curto prazo e se há chance de uma crise sistêmica, como a de 2008, “o que seria péssimo para a economia americana, com respingos sobre a economia global”, diz o relatório.
“Nesse momento, nossa primeira impressão é que não há similaridade entre o que está ocorrendo com o SVB e o banco Lehman Brothers, considerado um dos drivers para a crise financeira de 2008″, acrescenta o texto.
Brasil
Para o Brasil o impacto deve ser reduzido, avalia Martins, da Nexgen. “Embora, certamente, algumas empresas tivessem aplicações no SVB, não é nada que possa trazer impacto grande”, avalia.
Ele também crê que o impacto sobre juros no Brasil deve ser reduzido. O efeito mais direto deve ser entre os investidores por um aumento da aversão a risco, que já estava em voga por conta dos juros altos.
Para analistas do Itaú BBA, as empresas de tecnologia brasileiras na bolsa mais indicadas para atravessar essa crise são as de “grande porte e balanços sólidos. Nossos nomes preferidos são Totvs e Intelbras”, diz o banco.
Crise já estava instalada
Bazzo, do Transferbank, diz que o sistema financeiro não está ameaçado, portanto há baixas chances de haver demissões nas companhias afetadas.
“Vale ressaltar nesse caso que empresas nacionais já sofrem com a dificuldade de acesso ao crédito, sem dinheiro, essas empresas podem ter seus negócios paralisados, mesmo com a expectativa de receber até 90% do dinheiro em algumas semanas”, diz o executivo.
Na prática, o juro alto faz com que as empresas muito endividadas repensassem seus modelos de negócio porque fica mais difícil girar o capital e reforçar o caixa. “Como é o caso da Americanas aqui no Brasil, que entrou em recuperação judicial pelo alto endividamento e alavancagem”, acrescenta Bazzo.
“O efeito cascata já está acontecendo em diversas companhias, que passarão agora a ter seus balanços mais investigados por investidores”, arremata.
Leia a seguir